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Os tropeços da modernidade
Rodolfo de Souza
03/08/2023 | 11:53
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Saudade do tempo em que arroz com feijão era iguaria indispensável na mesa das famílias em geral. Prato que, em épocas de vacas gordas, podia ainda ser realçado com uma carne vermelha ou frango ou peixe, embora, quase sempre, ovo e batata protagonizavam o almoço e o jantar das casas mais simples. De qualquer forma, o que não podia faltar era a salada, isso não! Uma diversidade de folhas verdes e tomate que mainha temperava com cebola ou alho, vinagre e o óleo de soja, já que azeite era luxo para poucos. Quanto às frutas, laranja e banana eram as mais apreciadas. O cardápio, enfim, era variado, sem que se gastasse muito para compô-lo. Nada de tão sofisticado, pois, fazia a alegria da gente que andava muito e dormia cedo, porque pulava cedo para encarar o batente. Afinal de contas, o pão de cada dia tinha que ser batalhado com o suor da cara.

Claro que até hoje as pessoas trabalham, antes de tudo, para sobreviver, fenômeno que se dá também por meio da alimentação. Isso é fato. Só que, com o passar do tempo o imediatismo se tornou uma tendência, algo inconcebível no passado, caso alguém de então viesse a sonhar com isso. Nesses tempos modernos, contudo, em que a tecnologia engendrou uma série de praticidades no cotidiano dessa gente, parece que a pressa em se resolver questões, antes pensadas com mais calma, tornou-a refém de um sentimento de que pode ficar na retaguarda nessa corrida desenfreada não se sabe exatamente atrás de quê. Processo que vem criando uma neurose capaz de levar a molecada a crises frequentes de ansiedade e depressão. Visão esta surgida a partir de comentários de especialistas no assunto, técnicos que entendem barbaridade do riscado e que alertam para o número assustador de jovens entregues às doenças cardiovasculares, privilégio dos mais velhos em tempos idos.

E para aplacar a sua ansiedade, caro leitor que me viu iniciar um texto com assunto aparentemente nada relacionado à questão cardíaca da juventude contemporânea, esclareço que os cientistas dão destaque ainda à alimentação atual que entrou na moda do frenesi imediatista da nova era. Trocando em miúdos, a indústria alimentícia criou comidas de fácil preparo e de apelo ultramoderno, as tais ultraprocessadas. São gororobas de aparência atraente e sabores apetitosos que enchem os olhos, mas que comprometem o bom funcionamento do corpo humano, segundo a opinião dos médicos a quem assisti.

Por isso, a boa e saudável comidinha de outrora perdeu terreno para aquela que entrou com força para a atraente moda da alimentação que pede fast food, comidas congeladas e demais besteiras que os competentes publicitários se esmeram em tornar delícias do mundo moderno. 

E ainda, somada à insanidade gastronômica e aos desvarios do imediatismo, a moda do desrespeito, da agressão barata, do preconceito ao diferente, da violência de uma forma geral, tem sido amplamente propagada nos últimos tempos, como sendo o lado justo e bom da vida. Engodo que se sustenta devido ao amparo promovido pela parca sabedoria popular que tem embarcado de cabeça nessa onda que, por carregar o medo em seu bojo, também remete às doenças silenciosas que vêm minando o organismo e o espírito das pessoas, dia a dia.

Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André. É professor e autor do blog cafeecronicas.com




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