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Caixa traz quatro filmes de cineasta alemão Rainer Werner Fassbinder
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
03/07/2006 | 07:58
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É filme importante que não acaba mais na história do cinema e que precisa ser disponibilizado para o home video brasileiro. De grão em grão, o DVD vai repondo clássicos e títulos fundamentais no mercado e procurando também aqueles que seu antecessor, o VHS, ignorou. E neste mês uns bons e importantes grãos são extraídos da saca.

Já dá água nos olhos o lançamento da Coleção Fassbinder (Versátil, preço estimado de R$ 139), caixa com quatro filmes dessa máquina de fazer arte chamada Rainer Werner Fassbinder, cineasta alemão que assinou 43 produções audiovisuais num intervalo de 17 anos. Filmou muito porque tinha muito a dizer.

Exceto por O Desespero de Veronika Voss (1982), os outros filmes do box já haviam sido lançados em vídeo: Martha (1974), Lola (1981) e Lili Marlene (1981). Não dá para tachar de tetralogia a coleção, mas em todos os quatro filmes há um discurso local traduzido em universal. Existe neles a presença do nazismo como um câncer impossível de ser extirpado do “desenvolvimento” social e político da Alemanha. Para que fique evidente a anuência ou negligência da burguesia e da classe operária quando exposta ao nacional-socialismo, o diretor elege artifícios como o enlevo extremo, no limiar da hipnose, ou o sadomasoquismo. Ferramentas que conduzem à irracionalização, à ignorância, à alienação. Seu cinema, que nunca se deixa acomodar e sempre busca o desconcerto narrativo ou estético, busca no íntimo o universal.

Por outros caminhos, mas com um contrato ideológico parecido, vão os filmes de John Ford. Dois deles, que não usufruem da fama de um Rastros de Ódio, também debutam no DVD dentro dos próximos dias, ambos pela Fox Classics: Paixão dos Fortes (1946, a R$ 35) e Sangue de Herói (1948, a R$ 35), até então inéditos no home video. Ford é dos pouquíssimos que fazem jus ao título de mestre. Fez do faroeste um confiável aparelho de raios-x da alma humana. Processos profundos de interiorização de seus personagens podiam ser traduzidos em três, duas, até mesmo uma tomada.

O cineasta entendia o herói como instrumento da harmonia, não como sujeito dela. Por isso a palavra sacrifício cai tão bem entre seus protagonistas, seja ele o Wyatt Earp encarnado por Henry Fonda em Paixão dos Fortes, sua reconstituição do duelo no OK Corrall, tão lendário e famoso quanto repisado pelo cinema ao longo dos anos; seja ele o capitão Kirby York interpretado por John Wayne e que precisa negociar o conflito entre índios e soldados da cavalaria em Sangue de Herói.

Para completar o rol do nunca-te-vi-em-VHS-mas-sempre-te-amei, está previsto o lançamento de Fahrenheit 451 (1966; Universal, a R$ 36,90), obra de ficção científica de François Truffaut derivada do livro de Ray Bradbury. Embora pareçam inconjugáveis na mesma sentença o nome do cineasta francês e o gênero em questão, Truffaut se sai como pode ao retratar uma sociedade futurista submetida a um totalitarismo que procura se firmar por meio da extinção da literatura. Livro bom é livro queimado na leitura dos governantes desse universo e os bombeiros são a instituição designada para atear fogo nos volumes proibidos. Esse cenário de paradoxos se desnuda quando o protagonista (Oskar Werner) se apaixona por uma leitora clandestina. A estrutura política, convicção e ganha-pão do herói, torna-se inconveniente quando apresentada como estorvo pessoal. Vale pelo risco de Truffaut no gênero, vale pela sua tentativa de mostrar a afeição como despertador social.



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