Política Titulo Representatividade
Voto feminino completa 91 anos, mas número de mulheres eleitas ainda é baixo no Grande ABC

Dos 142 vereadores das sete cidades, apenas oito são mulheres; região tem apenas uma prefeita

Artur Rodrigues
Beatriz Mirelle
Do Diário do Grande ABC
26/02/2023 | 08:23
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Tereza Delta foi a primeira prefeita no Grande ABC; ela foi nomeada chefe do Executivo em São Bernardo pelo governador Adhemar de Barros em abril de 1947 (Foto: Acervo Histórico/São Bernardo)


Falar sobre representatividade feminina na política é um tema sensível há muito tempo. Para se ter uma ideia, a conquista do direito ao voto por parte das mulheres brasileiras aconteceu há apenas 91 anos, data recém completada no último dia 24. Em um contexto no qual homens são a maioria dos candidatos eleitos, observar a pluralidade nas cadeiras ainda é algo difícil. Essa disparidade não é diferente no Grande ABC. Na região, 53,2% do eleitorado é feminino (equivalente a 1.112.844 eleitoras). Mesmo assim, entre os 142 vereadores eleitos nas sete cidades, apenas oito são mulheres (5,6%). O número de vereadoras não passa de dois nomes por cidade, sendo que em municípios como Mauá e Rio Grande da Serra a representatividade feminina nas Câmaras é nula.

Santo André elegeu 21 vereadores. A única mulher entre eles é Ana Veterinária (União Brasil). São Bernardo, a cidade com o maior número de vereadores (28), possui somente Ana do Carmo (PT) e Ana Nice (PT) como lideranças femininas. “Estamos como a minoria da minoria. Torço e batalho muito para que essa representatividade seja maior nas próximas eleições”, afirma Ana do Carmo. São Caetano, com 19 cadeiras, tem Bruna Biondi, do mandato Mulheres por + Direitos (Psol), e Thai Spinello (Novo) na Câmara.

Em Diadema, a vice-prefeita Patty Ferreira (PT) está à frente do Executivo, enquanto o prefeito José de Filippi Júnior (PT) segue afastado para tratamento de saúde. Como vereadora, Lilian Cabrera (PT) é a única mulher entre os 21 eleitos na cidade. “Estar como vice-prefeita e, em determinados períodos, prefeita em exercício, é um orgulho. Traz uma responsabilidade a mais para quebrar esse ciclo machista na nossa política”, diz Patty Ferreira. Já Amanda Nabeshima (PTB) e Márcia Coletiva de Mulheres (PT) estão entre os 17 vereadores em Ribeirão Pires.

A prefeita de Rio Grande da Serra Penha Fumagalli (PTB), a vice-prefeita de Diadema Patty Ferreira (PT), e a deputada estadual eleita Ana Carolina Serra (Cidadania) são algumas das representantes da região em escalões mais altos na política (Fotos: Divulgação)

SUFRÁGIO
A possibilidade das mulheres escolherem os próprios representantes veio com o Decreto nº 21.076, do então presidente Getúlio Vargas, em 1932. A passos lentos e decisivos para a democracia, essas mudanças impactam diretamente na implementação de políticas públicas que as contemplem. “Se não fosse essa conquista, possivelmente estaríamos em uma situação muito complicada em relação ao debate para garantir dignidade às mulheres na saúde, no emprego, entre outras áreas”, pondera a vereadora Ana Nice.

O movimento sufragista no Brasil se tornou evidente entre os séculos 19 e 20. O Partido Republicano Feminino, em 1910, impulsionou a visibilidade dessa corrente. A Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, criada por Bertha Lutz em 1922, também auxiliou o sufrágio. “Foi uma forma de pressão social. Essa pauta estava efervescente no final do século 19 e desembocou no direito conquistado em 1932”, explica Luciana Panke, pesquisadora em comunicação política e gênero da UFPR (Universidade Federal do Paraná).

“As cotas nos partidos e a divisão de fundos foram vitórias possíveis porque, antes de nós, tantas outras mulheres lutaram pela conquista de direitos. A representação nas casas legislativas é escassa e nós ainda nos deparamos com o machismo nesses espaços, mas seguimos na luta”, declara a vereadora Bruna Biondi.

DEPUTADAS
O número de deputadas federais aumentou de 77 em 2018 para 91 em 2022 (18,2%). Agora, a bancada feminina representa 17,7% das 513 cadeiras na Câmara. Em São Paulo, dos 94 deputados estaduais, 25 são mulheres. Entre elas, o Grande ABC é contemplado pelos mandatos de Ana Carolina Serra (Cidadania), Carla Morando (PSDB) e Ediane Maria (Psol).

“Nós trazemos uma nova perspectiva na defesa e proteção das pessoas. Quando caminhava durante a campanha, notava que as meninas se viam em mim, mas eu também me vejo nelas. Essa representatividade é fundamental para entendermos o nosso poder”, comenta Ana Carolina Serra.

TEREZA, IRINÉIA E MARIA: REGIÃO TEVE APENAS TRÊS PREFEITAS
Tereza Delta foi a primeira prefeita no Grande ABC. Ela foi nomeada para o cargo em São Bernardo pelo então governador Adhemar de Barros em 1947, após afastar Wallace Simonse. Ela ficou no cargo até o final daquele ano, quando ocorreram eleições para prefeito e vereadores. Tereza foi presidente da Câmara da cidade entre 1948 e 1951 e, em seguida, foi deputada estadual entre 1951 a 1955.
Ao longo de todas as legislaturas, só duas mulheres foram eleitas como prefeitas no Grande ABC. A primeira delas foi Irinéia José Midoli, que fez história em 1972 em Rio Grande da Serra e cumpriu mandato de quatro anos.

A região foi eleger novamente uma mulher como chefe do Executivo apenas 24 anos depois, em 1996, quando Maria Inês Soares Freire foi eleita prefeita de Ribeirão Pires. Ela se reelegeu em 2000, exercendo mandato de oito anos.

Para Luciana Panke, pesquisadora em comunicação política e gênero da UFPR, o baixo índice de mulheres eleitas tem relação com os paradigmas que persistem mesmo após a conquista em 1932. Segundo ela, é necessário uma mudança cultural para que haja uma naturalização de mulheres na vida pública. "Uma mulher eleita vira notícia e isso já não deveria mais acontecer", disse. "O sufrágio é um direito mínimo. É a base, o início de todo o processo de mudança cultural para que mulheres estejam em cargos de poder. Mas só isso não é o suficiente", continuou.

Ela acredita que um passo importante para essa naturalização é a ocupação de mulheres em cargos administrativos dentro dos governos, como ministras e secretárias. "Fazer um gabinete que seja com paridade ajuda muito. Porque assim, as pessoas começam a ver as mulheres efetivamente no poder e isso se naturaliza", afirma Luciana.

Penha Fumagalli (PTB), que assumiu a prefeitura de Rio Grande da Serra após o mandato de Claudinho da Geladeira (PSDB) ser cassado em 2022, afirma que uma das primeiras medidas foi montar uma equipe de secretariado com 40% de mulheres à frente das pastas. “É muito importante que estejamos cada vez mais em cargos eletivos, carregando a bandeira da inclusão da mulher nos espaços públicos".




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