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Setor metalúrgico corta 25 por dia

Em cinco anos, foram extintos 46,6 mil empregos, passando de 143,6 mil para 97 mi

Flavia Kurotori
especial para o Diário
21/04/2018 | 07:02
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Claudinei Plaza/DGABC


Em cinco anos, o Grande ABC viu a demissão de 46,6 mil metalúrgicos – equivalente a 25 dispensas por dia – passando de 143,6 mil trabalhadores em 2013 para 97 mil neste ano, segundo dados dos sindicatos da região. Não à toa, a luta pelo emprego é um dos principais pleitos nos dias de hoje, quando se comemora o dia do profissional. “Perdemos muitos postos na crise e, ainda que a economia tenha registrado leve melhora, é preciso alavancar muito para falarmos em retomada”, destaca Aroaldo Oliveira da Silva, secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, que abrange São Bernardo, Diadema, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra.

Para se ter ideia, a base da entidade era de 103,6 mil profissionais cinco anos atrás, chegando a 70 mil hoje, conforme levantamento dos sindicatos feito a pedido do Diário. Em Santo André e Mauá, havia 23 mil profissionais celetistas, número que recuou a 15 mil e, em São Caetano, o volume caiu de 17 mil para 12 mil. “Temos a incerteza do emprego nas empresas. A situação ainda não está confortável porque faltam sinais de crescimento”, lamenta Aparecido Inácio da Silva, o Cidão, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano.

As firmas do setor na região dependem, principalmente, das seis automobilísticas – Volkswagen, Mercedes-Benz, Ford, Toyota e Scania, em São Bernardo, e GM (General Motors) em São Caetano – e, para cada demissão em uma delas, em torno de quatro postos são afetados na cadeia metalúrgica. Assim, a baixa no período é justificada e poderia ser até maior, dado que entre 2015 e 2017, 9.716 trabalhadores foram demitidos das montadoras.

Outro alvo de críticas do setor é a reforma trabalhista, em vigor desde novembro. “Ela não tem um ponto que ajuda o trabalhador. Mesmo que os acordos coletivos tenham algumas salvaguardas garantindo que qualquer mudança nos contratos baseada na reforma seja discutida com o sindicato, os trabalhadores ainda ficam inseguros”, avalia Silva. “Foi uma retirada dos direitos do trabalhador e temos o foco de derrubá-la”, completa Osmar César Fernandes, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá.

A desobrigatoriedade do imposto sindical foi uma das imposições da alteração da CLT. Na avaliação de Fernandes, é preciso aumentar o número de associados para suprir esta quantia. “Também é necessário discutir com os trabalhadores qual a melhor forma de retribuir as negociações do sindicato, pois a entidade negocia por toda a classe e não apenas pelos sindicalizados.”

MODERNIZAÇÃO
Desde a década de 1980, época marcada pelas lutas dos sindicatos por mais direitos, muita coisa mudou para os metalúrgicos, “desde a reestruturação fabril à reorganização da produção com a automação dos processos”, salienta Silva. “Conforme as empresas foram passando pelo processo de automação, o quadro de trabalhadores foi reduzindo, além de muitas indústrias terem saído da região”, completa Fernandes.

Atualmente, a chamada quarta revolução industrial ou indústria 4.0, que propõe o investimento em tecnologia da informação e automação dos processos produtivos, é sinônimo de incertezas e temor para os trabalhadores. “Em alguns países, como a Alemanha e Japão, o governo conversa com sindicatos e empresas para analisar os impactos dessas transformações, como quais funções podem desaparecer em contraponto com quais podem surgir. Porém, no Brasil, sofremos com a inércia do governo, que não está aberto para dialogar sobre o assunto”, critica Silva.

Os sindicalistas acreditam que este novo modelo pode aumentar o desemprego. “Ele (o governo) precisa enxergar que a indústria 4.0 vai além, e outros fatores, como qualificação profissional, são importantes”, defende Silva. “Nesta corrida, terão menos empregos e sairá na frente quem for mais qualificado”, acrescenta Fernandes.

‘Antes de ser metalúrgico eu já queria ser metalúrgico’

Metalúrgico há 22 anos, o morador de São Bernardo Kleber Ferreira Nunes, 40 anos, garante que nunca pensou em mudar de setor. “Antes de ser metalúrgico eu já queria ser metalúrgico. Sempre estudei e fiz cursos no Senai com esse objetivo.”

Há 13 anos como operador de máquinas na Mercedes-Benz – onde entrou por indicação de um conhecido –, ele destaca que a principal mudança no período foi a organização das fábricas, que modernizaram suas linhas de produção. Nunes avalia que um dos fatores que fazem a profissão prazerosa é a união da categoria. “Nos últimos anos, contra o PL (Projeto de Lei) que permitiria que pessoas jurídicas atuassem nas fábricas, a mobilização foi muito importante, além da reforma trabalhista, que é muito ruim para os trabalhadores. Onde tem união, o impacto é bem menor, mas, Brasil afora, onde não tem organização, os trabalhadores vão sentir muito.”

Mesmo na crise, quando colegas e a mulher – que também trabalhava na mesma empresa – foram demitidos, Nunes não desistiu da profissão. “Hoje está bem mais tranquilo, principalmente por conta do acordo de investimento (de R$ 2,4 bilhões entre 2018 e 2022, anunciados em outubro do ano passado), que nos dá segurança por mais alguns anos”, avalia.

Incerteza do Rota 2030 gera medo na área

O Rota 2030, programa do governo federal que prevê incentivos fiscais para o desenvolvimento da indústria automobilística, ainda está sem definição, deixando o setor ‘órfão’ de estímulos para novos investimentos – o Inovar-Auto, que vigorou até dezembro de 2017, favorecerá a injeção de R$ 8 bilhões das montadoras até 2022.

Com isso, trabalhadores temem que as empresas do ramo deixem de investir no País e que isso, consequentemente, prejudique a criação de empregos. “Há um temor acerca do Rota 2030 por causa da incerteza da sua aprovação e, além disso, mesmo que seja implementado, não possui as mesmas bases do projeto inicial”, alega Aroaldo Oliveira da Silva, secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

Conforme informações de bastidores, a proposta que vem sendo estudada é a de incentivos de R$ 1,5 bilhão para aportes em P&D (Pesquisa & Desenvolvimento), que poderá ser abatido de qualquer imposto federal por até três anos. Após o período, as montadoras seriam incluídas na Lei do Bem, criada em 2005, e o desconto seria restringido ao IR (Imposto de Renda) e à CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido).

Conforme publicado pelo Diário, a expectativa é que reunião entre montadoras e representantes do Planalto seja realizada na terça-feira, dia 24. No início do mês, o presidente Michel Temer (PMDB) indicou que o programa deve ser aprovado na primeira quinzena de maio.  




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