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Toshiko Akiyoshi rege sua orquestra em Sao Paulo
Do Diário do Grande ABC
01/12/1999 | 16:16
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A última visita de Toshiko Akiyoshi a Sao Paulo foi em 1988. A pianista, compositora, arranjadora e bandleader vinha acompanhada de seu trio (ela ao piano, Dennis Irwin ao baixo e Eddie Marshall na percussao). Ficou um pouco decepcionada porque o Clube 150 do Maksoud Plaza estava vazio. Era feriado e poucas pessoas ocupavam as mesas do clube de jazz, transformado em bingo em 1994. Desta vez, Toshiko espera ter melhor sorte. Vem com sua orquestra completa para tocar na segunda-feira, às 21 horas, na Sala Sao Paulo, nosso templo da música erudita. Quem ouve bem merece estar lá.

Várias vezes premiada pela revista "Down Beat" como melhor compositora de jazz, ela recebeu o Golden Award das maos do imperador do Japao e foi indicada 14 vezes para o Grammy. Esses prêmios significam pouco na trajetória de Toshiko, que considera um prêmio maior ter sido casada com uma lenda do bebop o revolucionário saxofonista Charlie Mariano. Ela volta ao Brasil com outro grande músico e marido, o saxofonista e flautista de origem polonesa Lew Tabackin. Eles desembarcam sábado em Sao Paulo, acompanhados por outros 15 músicos, inclusive o percussionista brasileiro Walter Anastácio, o Waltinho.

Quatro estaçoes - Toshiko formou sua orquestra há 16 anos. Gostaria de ter apresentado seus músicos ao público brasileiro há 11 anos, mas, na época, ninguém se arriscou a trazer a orquestra. "O investimento era alto, mas agora temos duas apresentaçoes no Chile e, dividindo os custos da viagem, fica mais fácil", justifica, numa conversa telefônica de Nova York.

Toshiko e Lew Tabackin vao lançar dois discos no domingo às 15h30, na loja Planeta Music do Shopping Paulista. O de Tabackin chama-se "Live in the Vartan Jazz". O de Toshiko é um CD lançado no Japao há três anos, "Toshiko Akiyoshi With Brazilian Friends". A dupla vai autografar os CDs e dar uma amostra grátis do que sabe fazer em jazz, mas, obviamente, nada comparável à noite de gala, o concerto de segunda-feira, às 21 horas, na Sala Sao Paulo.

Entre outras composiçoes programadas para o concerto destaca-se a peça "Morita Village", encomendada pelo governo local dessa pequena regiao japonesa marcada pela degradaçao ecológica. A peça nao é um libelo político, garante Toshiko. "É uma suíte pacifista sobre as quatro estaçoes do ano, sobre a transformaçao provocada pela passagem do tempo", define, transferindo à obra musical o peso de uma parábola.

Mesmo recusando o rótulo de trabalho político, Toshiko está sintonizada com a causa ambiental. "Minamata" (1977), composiçao sua que ganhou vários prêmios, é um retrato musical da baía de mesmo nome, que durante 40 anos respondeu pela morte de milhares de japoneses consumidores de peixe contaminado por mercúrio, jogado no mar por indústrias químicas, entre as quais a Chisso Corporation, interditada pelo governo japonês em 1968.

Toshiko Akiyoshi era amiga do maior compositor contemporâneo japonês, Toru Takemitsu (1930-1996). A influência de suas peças, particularmente "November Steps", é reconhecida por ela. Dele a compositora herdou a organizaçao sonora quase mística, intutitiva, do músico erudito japonês, que escreveu para Akira Kurosawa a trilha sonora de seu filme "Ran".

Sem allegro - Como Takemitsu, também a bandleader, radicada nos Estados Unidos há mais de 40 anos, jamais escreveu um allegro, porque isso ficou impossível depois de Hiroshima. Em seus arranjos ela alterna, sim, longas pausas com metais vigorosos (trompetes, saxofones e trombones, que compoem três quartos da orquestra).

Ela observa que sempre reserva um lugar para novas cadências de seus solistas. "A improvisaçao é muito importante, porque o solista sempre indica para o compositor e arranjador caminhos alternativos", diz, revelando que muitas da 90 peças que compôs foram sugeridas pela audiçao de Mariano, Lew Tabackin e de seus músicos da orquestra, metade dos quais está com ela desde a criaçao do grupo. O pianista Bud Powell, reconhece, foi sua maior influência, mas o estilo que deixou marcas indeléveis foi mesmo a bossa nova. "Tanto que Brazilian Friends é uma tentativa de prestar homenagem a Tom Jobim e a todos os amigos que me ajudaram a descobrir a música brasileira".

"Bem, para falar a verdade, conheci música brasileira mesmo antes da bossa nova, porque já tocava Tico-Tico no Fubá em 1956." Ela gravou pela segunda vez a música de Zequinha de Abreu no disco que está lançando agora em Sao Paulo. É um desafio, define. "Se você nao tem swing, entao é melhor desistir, como dizia Duke Ellington." Lew Tabackin, ela garante tem de sobra, até mais do que o primeiro marido, Charlie Mariano. Ela nao recusa comparaçoes. Diz que Mariano era mais melódico e que o jazz, para ele, era "apenas um hobby".

Herança musical - Com Mariano ela teve uma filha, Michiro Mariano, ex-atriz do cinema que hoje atende pelo nome de Monday Michiro, já gravou seis discos e é uma pop star no Japao. É dela o belo solo vocal de "Minamata". Como a filha, o cinema já namorou a compositora, mas sua resposta foi nao. "Recebi, a exemplo de Takemitsu, ofertas para compor trilhas sonoras, mas nao eram projetos muito interessantes", lembra. "Além disso, é uma grande responsabilidade escrever para o cinema depois das experiências de Takemitsu, porque ele provocou uma revoluçao na área", observa a compositora. Os ingressos para o concerto da orquestra de Toshiko Akiyoshi e Lew Tabackin na Sala Sao Paulo vao custar entre R$ 10, 00 e R$ 60,00.




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