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E a história não acaba aqui
Rodolfo de Souza
19/05/2016 | 07:00
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No capítulo que dispõe sobre o mau gosto do escritor em levar ao extremo a ideia de realizar profunda alteração na história que criara sobre o reino do Ó, ficou nítido o aborrecimento do artista que, pela disparatada atitude, veio a sofrer duro golpe da crítica literária que não poupou o verbo para depreciá-lo, ele e ao seu trabalho. Talvez não tivesse lá muito apreço por textos incoerentes.

Tudo por causa do rumo que tomou o conto de fadas mais inacreditável criado até então pelo artista que ficou mesmo desconcertado, parecendo não acreditar na trapalhada que fizera.

Foi, inclusive, acusado de ter cometido injustiça para com a gente cega que habita aquelas paragens. Apesar de que,verdade seja dita, talvez esteja melhor assim o povo, imerso na escuridão e fadado a crer piamente na verdade que o vigário não cansa de contar. Por isso, uma vez consumado o golpe contra a soberana, passou a acreditar que tudo ficará melhor.

Quanto ao autor, diante de tão ferrenha acusação, só lhe restou defender-se, alegando que fora vítima do inusitado domínio exercido por suas personagens; que na verdade fora manipulado por elas, desde o princípio; que definitivamente não fora seu o leviano desejo de escorraçar sua majestade.

“Como assim?” – indagaram em uníssono as pessoas habituadas ao trato com a literatura e, portanto, verdadeiras conhecedoras do riscado. Afirmaram, pois, desconhecer, neste vasto universo, obra em que alguma personagem tenha se rebelado contra seu o criador e tomado as rédeas da situação.

“Mas aqui neste reino é assim que funcionam as coisas.” – insistiu ele, para espanto do distinto público literato.

Disse-lhes ainda que, de acordo com seu modesto ponto de vista, toda a investigação que comprovou ser a família real digna de quase nenhuma confiança, da mesma forma, deveria ter sido ferramenta utilizada para destituir outros reis que outrora fizeram uso do cetro para também subtrair os recursos que os filhos da pátria amada juntaram com o suor do rosto.

Mas o poder conferido a cada personagem durante tanto tempo de história, tornou-os tão fortes que a pena do escritor passou, a partir de dado momento, a obedecer somente ao desejo da vil nobreza do lugar, desprezando sua inspiração. Era como se sua mão deixasse de obedecer ao seu comando para escrever aquilo que os poderosos opositores da rainha lhe ditavam.

Sentiu-se, por fim, o autor, uma marionete, sujeita aos caprichos de quem do poder se apoderara e que não permite agora qualquer mão intrusa que possa colocar em xeque o seu prestígio e o seu comando. Debaixo de sua bota deve ficar inclusive o escritor que se atreveu a criar a história que, pelo visto, não acaba aqui.

* Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André. É professor e autor do blog cafeecronicas.wordpress.com

E-mail para esta coluna: souza.rodolfo@hotmail.com. 




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