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Mostra traz a Sao Paulo a pintura de José Barbosa
Do Diário do Grande ABC
07/06/1999 | 16:57
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Para marcar seus 35 anos de carreira, José Barbosa expoe a partir de terça-feira um panorama bastante amplo de sua produçao na Galeria Jacques Ardies. Essa seleçao de pinturas e talhas realizadas na última década mostra como o artista pernambucano concilia uma inquestionável herança da cultura de sua terra natal com uma grande curiosidade criativa, que o leva a abordar diferentes temas e situaçoes e a retrabalhar incessantemente a mesma tela até chegar a um resultado que o agrade.

Um dos quadros da mostra, intitulado de Eu Acho É pouco, homenagem a um bloco carnavalesco de Olinda, tem duas datas. Ele começou a ser pintado em 1988 e só foi concluído este ano. "Eu nao tenho esse negócio de parar", diz Barbosa. É dessa investigaçao permanente que nasceu Vitória de Samotrácia, uma das telas mais interessantes da exposiçao e que realiza uma espécie de fusao dos vários universos pelos quais o artista transita.

O peixe gordo que flutua no intenso azul do céu ou do mar é um evidente tributo à arte popular nordestina, mas tem em suas entranhas uma paisagem marinha de Camboriú, cidade onde o artista vive desde o início da década, e um corpo de mulher alada em homenagem à imponente escultura Vitória de Samotrácia do museu do Louvre, em Paris, cidade onde Barbosa viveu alguns anos, quando se mudou para a Europa fugindo do clima opressivo que reinava no país durante o regime militar.

Inicialmente ele foi para Colônia, depois para Londres, até que achou Paris. Aliás, foi na capital da França que começou a pintar, já que até entao só fazia talhas. O trabalho em madeira continua sendo um dos pontos altos da sua produçao, como comprovam a enorme Porta da Criaçao ou a expressiva "Pietá", que esculpiu num pedaço de tília que estava prestes a ir para o forno numa padaria em Blumenau e que chamou a sua atençao por suas formas sugestivas.

Ele só estudou até a terceira série primária e começou a trabalhar com madeira ainda garoto, para ajudar o pai marceneiro. "Nunca estudei pintura, aprendi vendo", diz. Chegou a fundar com outros artistas do Recife e de Olinda o movimento "Arte Ribeira" - que tinha a participaçao de nomes como Joao Câmara e Vicente do Rego Monteiro -, mas que foi rapidamente abortado pelo golpe de 64.

Há em seu trabalho múltiplas influências desse olhar atento, desde um erotismo quase explícito, a uma forte ascendência da arte sacra, passando por um forte conteúdo surrealista. Sua obra também é influenciada pela grande tradiçao da pintura em seu Estado, que data do período da colonizaçao holandesa e da obra de mestres como Frans Post e Eckhout, com suas paisagens e naturezas-mortas encantadoras.

Apesar de a galeria na qual expoe ser especializada em arte naïf, Barbosa recusa categoricamente o título. Sua obra nasce da cultura popular, mas nao tem nada de ingênua. Aliás, essa designaçao vem perdendo cada vez mais a razao de ser. Se por naïf se entende aquele artista autodidata, que realiza um trabalho espontâneo e primitivo e nao se insere na tradiçao artística do momento em que vive, nota-se que há muita confusao na área. "Outro dia passei na frente de um centro de cultura e vi um cartaz: ensina-se arte naïf", ironiza José Barbosa.




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