As escadarias da Igreja Matriz de Mauá serão invadidas por cores, movimento e poesia terça-feira. Com estes ingredientes, teatro de rua, dança e artes circenses contarão a história do nascimento de Jesus Cristo. O Auto de Natal da Aciam (Associação Comercial de Mauá) promete emocionar e trazer consciência a quem doar um quilo de alimentos não perecível para conseguir lugar na arquibancada montada em frente à Paróquia da Imaculada Conceição, na Praça Monsenhor Alexandre Venâncio Árminas.

Programada para começar às 20h, a obra recontará as passagens iniciais do Evangelho misturando críticas sociais com histórias bíblicas. Em um dos momentos culminantes da apresentação, uma Maria já envelhecida vem a público reclamar que a polícia matou seu filho. "É uma dor que só uma mãe pode entender", diz a Nossa Senhora representada pela atriz Lucy Trinndade, 55 anos.

A concepção artística da performance vem do ator e pedagogo Valter Carriel, 43, diretor da Cia. de Teatro do Lixo. Junto com Lucy, ele coordena grupo de 40 adolescentes - com a participação de alguns outros adultos - que encenarão passagens da história de Cristo.

Sem esquecer da tradição medieval dos autos, em que cada cena é narrada ou introduzida por um mestre de cerimônias, o nascimento de Cristo é contado com vocabulário popular. Mistura poemas do cearense Patativa do Assaré com a linguagem da rua.

O trabalho da companhia conscientiza a juventude para questões como preservação ambiental e cidadania. Todos os figurinos são feitos de material reciclado, e a crítica social está presente em cada passagem da apresentação. José, por exemplo, é representado por operário da construção civil, em vez de carpinteiro. E recita a letra da música Cidadão, que ficou famosa na voz do cantor Zé Geraldo. "Tá vendo aquele edifício moço? Ajudei a levantar", declama Ademar Adão Rodrigues, 60, outro ator sênior do grupo, apontando para os edifícios do entorno das escadarias da Igreja Matriz de Mauá.

Companhia se reúne duas vezes por semana

Quase todos os atores do Auto de Natal da Aciam são adolescentes que, duas vezes por semana, participam das oficinas artísticas gratuitas do diretor Valter Carriel, na sede da associação. Porém, a caçula do grupo performático, que se orgulha de participar da trupe há três anos, é Milena Vitória Cândido Leme, 7 anos.

"Vou entregar as flores para o coral", diz a menina, que participará ainda da passagens com os três reis magos.

Dezessete adolescentes se revezam na recitação de um poema que narra o nascimento de Jesus Cristo. A estudante Tatiane dos Santos Bezerra, 15, é uma delas. "Cada dia é uma novidade. A gente vai se descobrindo. Saio do serviço e vou direto para o teatro", conta a adolescente, que participa do grupo há quase dois anos.

Vestido de anjo, Lucas Gabriel da Silva Fernandes, 15, diz que a vontade de ser ator nasceu com as oficinas de Carriel. Ao ser questionado se quer seguir carreira, responde sorrindo, sem titubear: "Pretendo sim. Por que não?"

Apresentação mistura artes e culturas de todos os tempos

Assumindo a postura de evento multiartístico, o Auto de Natal da Aciam apresentará ao público cuspidores de fogo em meio à narrativa viva peculiar do teatro de rua. O Presépio da Terceira Idade também está programado para a apresentação, que contará com microfones e amplificação para que os espectadores não percam uma palavra sequer do atores.

A base da narrativa do espetáculo é fundamentada na tradicionalíssima Commedia Dell'Arte italiana, mas expressões usadas pelos jovens na rua e a movimentação do street dance dão o ar contemporâneo ao espetáculo.

E a fusão não para por aí: a bailarina Luana Leal, 25 anos, criou coreografia que mistura os quatro elementos com a história de Jesus Cristo. A terra é representada pela dança contemporânea. O fogo pela dança do ventre, o street dance e o jazz, com toques de pirofagia. Já a água vem expressa pelos balés clássico e neoclássico. E o ar, pela ginástica artística. "Eles têm uma disposição física incrível", diz.