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Automação puxa competitividade chinesa
Wagner Oliveira
Do Diário do Grande ABC
08/07/2011 | 07:30
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Celso Luiz/DGABC


A competitividade chinesa na indústria automobilística é, em maior parte, fruto das avançadas tecnologias em automação do que da oferta da mão de obra farta e barata disponível no país oriental, cuja população é estimada em 1,3 bilhão.

"É falsa a ideia segundo a qual a China consegue produzir só porque tem trabalhador com menor custo em relação a outros países", afirmou o consultor Francisco Satkunas, integrante do conselho da Sociedade dos Engenheiros da Mobilidade.

"Por conta da vertiginosa expansão daquele gigantesco mercado, as principais montadoras do mundo, principalmente europeias e norte-americanas, injetaram expressivos volumes de recursos para dotar rapidamente as fábricas chinesas com as mais modernas tecnologias em prática na indústria", afirmou Satkunas.

Em relação ao Brasil, segundo o engenheiro, a automação chinesa avança mais rapidamente. "Em relação à China, o balanceamento entre automação e mão de obra no Brasil é maior porque porque nossa escala de produção é menor", explica.

No primeiro semestre deste ano, o mercado chinês de automóveis disparou em relação ao resto do mundo. Na primeira posição do ranking global, a China comercializou 7.914 milhões de unidades, seguida dos Estados Unidos, com 5.261 milhões, e Japão, 1.566 milhão.

Da quarta posição no ano passado, o Brasil fechou o primeiro semestre na sexta colocação, com a venda de 1.433 milhão. A Alemanha recuperou o quarto lugar, com 1.468 milhão, seguida agora da Índia, com 1.441 milhão.

Faz parte do estudo de competitividade da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotivos a reivindicação de política de incentivos industriais para a modernização tecnológica, inclusive com forte renovação dos processos produtivos.

"A cadeia da indústria automobilística precisa fomentar a pesquisa e inovação tecnológica para não sermos apenas coadjuvantes", afirmou o presidente da Anfavea, Cledorvino Belini. "O problema é que, por conta dos altos custos incidentes, o setor está sufocado e sem condições para investir e competir em pé de igualdade com fabricantes externos."

De acordo com relatório encomendado pela Anfavea, o custo para se produzir um carro é até 60% maior no Brasil em relação à China.

Para cada US$ 100 empregados pela cadeia automobilística lá, aqui seriam necessários US$ 160. Já na Índia o custo é de US$ 105 e no México, mais próximo da realidade brasileira, é de US$ 120.

A mão de obra também influi. No País, o custo por hora é de 5,3 euro contra 1,3 euro na China e 1,2 euro na Índia. "Além de vária despesas, como o da Previdência, ainda existe a terceira folha, que embute, por exemplo, treinamento e formação do trabalhador", enfatiza Belini.

Outro fator que dificulta o investimento tecnológico no Brasil é o custo do capital para todos os integrantes da cadeia automotiva, que incluem desde os produtores de carvão usado pela siderurgia até os variados fornecedores de autopeças e componentes.

Enquanto os juros bancários podem chegar a até 45% no País, na China é de 2% ao ano para empresas. Nos Estados Unidos, o custo do dinheiro é de 3%, na Índia 3,2%, e na Coreia do Sul, 6%.

"O Brasil tem de fazer esforço para melhorar sua competitividade", afirmou o presidente da Ford, Marcos de Oliveira. "Se o País não repensar sua política industrial agora, corre sério risco de desindustrialização."

O presidente da Ford defende ampla discussão envolvendo todas as esferas de governo e o setor para a tomada de decisões que melhorem a competitividade da indústria nacional. Com isso, o executivo acredita que o preço do carro brasileiro, atualmente considerado um dos mais altos do mundo, caia nos próximos anos.

 

Trabalho muda em fábricas americanas 

Com a crise que fechou quase uma centena de fábricas nos Estados Unidos desde 2008, a mão de obra na indústria automobilística norte-americana vem passando por ampla reciclagem. O objetivo das montadoras é modernizar e tirar maior produção das fábricas que sobreviveram ao colapso, responsável pela queda do mercado de 18 milhões para 12 milhões de unidades por ano nos Estados Unidos.

"Atualmente, a complexidade da tecnologia embarcada nos automóveis é tamanha que exige novos processos na linha de produção. Nos últimos três anos, a evolução foi tanta que, para cada quatro trabalhadores dispensados na época da crise, três não conseguem se recolocar por estarem desatualizados", afirmou o consultor Francisco Satkunas, que acompanha a indústria automobilística mundial. Por isso, sindicatos que representam trabalhadores norte-americanos começaram a incentivar reciclagem para profissionais com dificuldades de recolocação.

Para o consultor, os sindicatos brasileiros também deveriam seguir o exemplo e incentivar a reciclagem do funcionário local, que terá de se modernizar r para acompanhar a evolução dos carros. "As montadoras já começam a desenvolver aqui carros globais, que vão exigir mais da mão de obra, dos atuais e futuros empregados da indústria automobilística", prevê.

Satkunas considera importante especialização da mão de obra, com a multifuncionalidade . "Vai ser preciso operar máquinas cada vez mais complexas, fazer relatórios em planilhas avançadas, entre outras coisas."

Na indústria moderna, a mão de obra adestrada - aquela que apenas repete as mesmas funções ao longo do dia - vai perdendo espaço para a que executa várias tarefas. Para isso, o metalúrgico tem de estar preparado para realizar pelo menos dez capacidades. Em vez de só apertar o parafuso da roda, é preciso também saber montar a suspensão, por exemplo.

A ideia é que, com maior conhecimento do processo produtivo, haja o melhor aproveitamento da automação, que aumenta o controle da qualidade e deixa os carros bem mais confiáveis.

Segundo o especialista, a repetição do trabalho ao longo do dia pode induzir o funcionário ao erro. "As estatísticas vêm provando que, com a alternância de tarefas, o metalúrgico erra menos."

 

Abertura de mercado no Brasil coincide com a chinesa

A abertura do mercado chinês para a indústria automobilística ocorreu quase ao mesmo tempo que no Brasil. Quando o então presidente Fernando Collor de Mello determinou a abertura para novas marcas no início dos anos 1990, a China também incentivou a industrialização no setor de veículos.

A principal diferença é que lá todas as montadoras têm que se associar a uma marca chinesa local, com a qual compartilham tecnologia. Com isso, os chineses aprenderam e ganharam processos produtivos, preparando a sua própria indústria para a internacionalização.

A automação nas fábricas brasileiras teve incremento com a nova unidade da Ford, em Camaçari, na Bahia. A Volkswagen também deu passo importante, quando decidiu desenvolver sua moderna fábrica de caminhões e ônibus em Resende (RJ), na qual compartilha a unidade numa espécie de condomínio com os fornecedores de peças e componentes, que participam da montagem.

A construção da fábrica da General Motors em Gravataí (RS) também resultou em maior automação dos processos. Com capacidade inicial para 100 mil unidades por ano, o estabelecimento mais que triplicou a capacidade.

Na China, a forte automação e a força do mercado permitem a produção de até 400 mil unidades de um único modelo. Com isso, é alcançada escala necessária para se reduzir o preço do veículo.




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