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Só cirurgia não garante perda de peso
Bruna Gonçalves
Do Diário do Grande ABC
29/05/2011 | 07:25
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O número de cirurgias bariátricas no Brasil aumentou 275%, passou de 13.000 para 60.000 entre 2003 e 2010. Ainda assim, a perda de peso não é garantida, já que nem todos conseguem mudar os hábitos de vida, como alimentação saudável e a prática de exercícios. Na região, já foram realizados pela rede pública cerca de 1.273 procedimentos e ao menos 72 pessoas estão agendadas para a cirurgia.

A operação é indicada para obesos com IMC (Índice de Massa Corpórea) - que é calculado pela divisão do peso pela altura elevado ao quadrado - superior a 40 ou quando for acima de 35, mas com uma doença associada ao peso. É preciso ter entre 18 e 65 anos. No País, quase metade da população está acima do peso e cerca de 3,7 milhões com obesidade mórbida.

O procedimento mais realizado é grampeamento de parte do estômago e desvio intestinal inicial, que promove aumento de hormônios que dão saciedade e diminuem a fome. Na região, pela rede pública, fazem a cirurgia os hospitais Estaduais Mário Covas, em Santo André, e Serraria, em Diadema, o de Ensino Anchieta, em São Bernardo e o Maria Braido, em São Caetano.

Para os especialistas, a cirurgia é o primeiro passo para deixar a obesidade, porém a mudança no comportamento depois do procedimento é fundamental para o sucesso. "Cerca de 10% a 15% dos pacientes recuperam de 5% a 10% do peso emagrecido, mas é raro recuperar todo o peso que perdeu. É preciso abandonar velhos hábitos e adotar forma de vida saudável para o bom resultado, além do acompanhamento médico", afirma o presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, Ricardo Cohen.

Professor de cirurgia do aparelho digestivo da Faculdade de Medicina do ABC, Luiz Gonzaga Calvacante reforça a importância do acompanhamento. "A obesidade se torna cada vez mais comum por diversos fatores, como hábitos de vida e genética. A cirurgia traz a mudança física, mas o lado emocional precisa de apoio."

As irmãs de Santo André Valdete, 62 anos, e Valquíria Gonçalves, 60, são exemplos de que não basta a cirurgia. Elas pesavam 115 e 198 quilos, respectivamente, e sofriam preconceito e dificuldades de se locomover até que, em 2000, passaram pelo procedimento. Valdete emagreceu 62 quilos, mas recuperou 25, já a irmã chegou aos 104 e atualmente está com 118. "O nosso mal é que, como fazemos doces e salgados, acabamos beliscando, além de não seguir dieta. Mas queremos mudar", explica Valdete.

A pensionista de Santo André Darci Romanich, 66, sente-se melhor com alguns quilos recuperados após a cirurgia. "Dos 106 cheguei aos 62, mas me senti velha. Agora, com 75, estou melhor e nada como poder renovar o guarda-roupa e autoestima."

A psicóloga Karen Calmona explica que "para que tudo dê certo, é preciso ter disciplina e alguns cuidados para que a pessoa aceite engordar alguns quilos e não substitua a compulsão alimentar por outras, como pelas compras."

O motorista de São Caetano Antonio Ramos Lombardi, 42, realizou cirurgia há cinco meses. "Não tem nada como uma camiseta te servir e entrar dentro do carro sem sofrimento", afirma Lombardi, que pesava 178 quilos e está com 120.

 

Exemplos de determinação e força de vontade 

As histórias da dona de casa e estudante de Santo André Renata Zoppello, 43 anos, e da assistente de tesouraria de São Bernardo Ivonete Romaniche, 58, são as mesmas e mostram como a determinação e força de vontade mudaram suas vidas. Ambas têm históricos de obesidade nas famílias, chegaram a pesar mais de 100 quilos, realizaram a cirurgia bariátrica e atualmente mantêm o peso com as mudanças de hábito de vida.

Renata começou a engordar na adolescência, mas foram nas duas gravidez que ganhou peso e não conseguiu mais eliminá-lo, chegando aos 110 quilos. Após realizar dietas, tomar medicamentos e assistir a reportagem sobre a cirurgia, passou pelo procedimento em 2004 e perdeu 46 quilos.

"O procedimento muda o seu estômago, mas para mudar os hábitos faço acompanhamento com endocrinologista, nutricionista e psicoterapia", releva a dona de casa, que fez duas cirurgias.

O segredo de Ivonete para manter o peso após a cirurgia é comer a cada três horas e controlar seu peso em anotações semanais. Além, é claro, da força de vontade. "Não me lembro de ter me visto magra."

Foi aos 56 anos que a assistente de tesouraria chegou aos 108 quilos e percebeu as dificuldades que isso estava trazendo para o dia a dia. Ela então procurou médicos e fez a cirurgia em 2008.

"Em um ano cheguei aos 66 quilos. Este ano devo passar por cirurgia plástica, mas o segredo é não comer nada em exagero e procurar ingerir alimentos saudáveis. Mas nada impede de vez em quando comer um chocolate."

 

Com 360 quilos, aposentada não sai de casa 

É na rua Rio de Janeiro, no bairro Jardim Oratório, em Mauá, que a aposentada Maria Neuza Silva de Souza, 66, vê o dia passar pela janela do quarto. Há três anos, ela não consegue mais andar devido ao seu peso de cerca de 360 quilos.

Mãe de 12 filhos, sua vida começou a mudar após uma laqueadura há 20 anos, quando começou a engordar. A situação se agravou após perder um filho. Para tentar esquecer, se mudou para o Litoral, onde o marido morreu há 10 anos.

"Quando meu filho morreu estava com 150 quilos. Com a morte do meu marido, entrei em depressão e a situação só piorou. Por conta do peso precisei fazer oito cirurgias para melhorar a circulação de sangue nas pernas. Até 2006, costurava e caminhava com dificuldade até que, há três anos, não consegui mais. O meu sonho é poder me tratar, ficar num spa para emagrecer e fazer a cirurgia", explica.

Maria Neuza conta com a ajuda do filho, o ajudante de cozinha Noel Silva de Souza, 40, que vai à casa da mãe quatro vezes ao dia. "Vou às 9h para trocá-la, fazer curativos e dar café da manhã e almoço. Volto às 14h, às 18h e às 21h. Por isso precisei largar o emprego", afirma o filho. Outra filha vai três vezes na semana ajudá-la.

Para sobreviver, o auxílio de vizinhos e da igreja são bem-vindos. A aposentada usa cerca de 180 absorventes e fraldas por mês e utiliza pomada para assaduras que se formam entre as pernas. Da última vez que procurou, o filho não conseguiu pegar o remédio na UBS (Unidade Básica de Saúde). Além disso, segue dieta rica em legumes, verduras e frutas.

"Metade da aposentadoria vai para o aluguel. Com o restante preciso comprar tudo isso e ainda ajudar meu filho, que está desempregado. Faço chinelos decorados e panos de prato para ajudar na renda, mas sempre falta algo."

A Prefeitura de Mauá informou que os profissionais de Saúde fazem o acompanhamento da aposentada. Nesta semana, uma equipe do Centro de Referência em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente apresentará o planejamento dietético para a família para que possa continuar o tratamento e ter condições clínicas de realizar a cirurgia bariátrica.




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