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Quase 20 anos após anúncio, Cidade Pirelli não saiu do papel

Projeto idealizado por Celso Daniel foi
substituído pelo Brookfield Century Plaza

Por Fábio Munhoz
Leone Farias
Do Diário do Grande ABC
08/04/2015 | 07:01
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Oswaldo Ventura/Arquivo DGABC


Anunciado em 1997 pelo então prefeito Celso Daniel (PT), o projeto Cidade Pirelli, em Santo André, jamais saiu do papel. Após inúmeras promessas e desculpas pelo não cumprimento do planejamento, o espaço no bairro Homero Thon foi transformado no Brookfield Century Plaza, complexo comercial e residencial bem mais acanhado do que a proposta original, assinada pelo arquiteto Edo Rocha.

A área que daria lugar ao megaempreendimento tem 215 mil m² e fica localizada entre a Avenida Giovanni Battista Pirelli e a linha férrea. O projeto original previa a construção de centro de convenções, casa de espetáculos, cinemas, restaurantes, hotel quatro estrelas, prédios comerciais, estacionamento subterrâneo e até uma rua 24 horas, que teria um quilômetro de extensão. Também eram esperadas empresas de call center e campus da UniABC (hoje Anhanguera). Na época, a estimativa era que fossem necessários R$ 200 milhões para executar as obras.

Após a morte de Celso Daniel, em 2002, o projeto foi sendo abandonado aos poucos. Mesmo assim, seu sucessor, o também petista João Avamileno, garante que, enquanto comandou o Paço Municipal (até 2008), a Prefeitura fez “tudo o que a Pirelli precisou”. Nesse período, Avamileno foi criticado por vereadores de oposição, que acusavam o Executivo de omitir informações sobre o andamento do empreendimento e reclamavam da lentidão por parte do poder público para viabilizar as ações planejadas.

O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico durante a gestão Celso Daniel (PT), Nelson Tadeu Pereira, avalia que a burocracia da própria Prefeitura para aprovar o plano e a lentidão do processo de desapropriação dos imóveis para a duplicação da Avenida Giovanni Battista Pirelli, essencial para o megaempreendimento, atrapalharam. “Demorou demais, o timing é importante para o investidor”.

Avamileno rebate. “Não houve demora da Prefeitura. Não foi isso que atrasou o projeto. Não me lembro de a Pirelli ter reclamado disso”, diz o ex-prefeito. O petista, que hoje é secretário de Direitos Humanos e Cultura de Paz em Santo André, diz não ter detalhes sobre os motivos que levaram a multinacional italiana a desistir da empreitada. “Isso ocorreu no governo Aidan (Ravin, hoje no PSB), depois que eu saí da Prefeitura. O objetivo da Pirelli era arrumar investidores e parceiros na iniciativa privada, mas acho que não conseguiu.”

MUDANÇA DE PLANOS - Em 2010, a fabricante de pneus colocou à venda cinco terrenos – entre eles o que daria lugar à Cidade Pirelli. Em 2012, a Brookfield Incorporações, que adquiriu a área na Avenida Giovanni Battista Pirelli, lançou oficialmente o Brookfield Century, complexo com 46,7 mil m² que conta com o Atrium Shopping, inaugurado no fim de 2013, e com cinco torres residenciais, prédio comercial e hotéis, ainda em construção.

O ex-prefeito reconhece que o Brookfield Century Plaza é bem mais acanhado do que o Cidade Pirelli, mas, ainda assim, enxerga pontos positivos no novo empreendimento. “Já que não pôde fazer o outro projeto, tem esse para ocupar o espaço que estava vazio. Não atende toda a necessidade, mas é melhor isso do que a Pirelli não fazer nada.”

O ex-vereador pelo PT Ricardo Alvarez (hoje no Psol) sempre fez críticas ao projeto original, que classifica como “megalomaníaco”. “Em algum outro lugar e em outra circunstância, essa parceria até poderia vingar, mas, naquela época e naquelas condições, achei que não tinha o menor sentido de acontecer.”

Para Alvarez, que é professor na Fundação Santo André, o projeto acabou estimulando a especulação imobiliária na região. O terreno foi ainda mais valorizado depois da duplicação da Avenida Giovanni Battista Pirelli, em 2001. Ele também critica a desapropriação de imóveis de cerca de 110 famílias e 40 comerciantes, além de questionar as contrapartidas impostas à empresa e a isenção do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). Na época, a companhia pagou cerca de R$ 2 milhões à Prefeitura, recurso que serviu para o alargamento da via e para a cobertura do calçadão da Rua Coronel Oliveira Lima, no Centro. “Na prática, eles (da Pirelli) não construíram o que se propuseram a fazer e foram beneficiados por uma série de leis. Não cumpriram a obrigação deles e isso gerou prejuízo social para os moradores cujas casas foram desapropriadas”, acrescenta.

A Pirelli foi procurada para comentar sobre a mudança no projeto, mas não se manifestou até o fechamento desta edição. O ex-prefeito Aidan Ravin também foi contatado pela equipe do Diário, mas afirmou que não poderia falar naquele instante. Em seguida, não atendeu mais as ligações.

OUTROS TEMPOS - Ex-diretor de recursos humanos da Pirelli, Sidnei Muneratti cita que a iniciativa foi idealizada na época em que a empresa vivia um de seus melhores momentos. “Foi sócia da Telecom Itália, dona da TIM, nos anos 2000, e um dos maiores grupos econômicos da Europa”, diz.

Questionado sobre o motivo de a empresa ter desistido de tocar o projeto, Muneratti diz que saiu da empresa em 2006, quando o plano ainda estava em andamento, mas cita que a fabricante de pneus mudou seu perfil no mundo todo nos últimos tempos. O fato é que a companhia italiana já vinha se desfazendo de grande número de ativos, inclusive a divisão de fios e cabos, atual Prysmian (adquirida em 2005 pelo grupo Goldman Sachs), até ter seu controle acionário vendido há duas semanas para a chinesa ChemChina (China National Chemical Corp).

Apesar disso, o ex-presidente da Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André) no fim da década de 1990 Saul Gelman considera que não foi um fracasso. Isso porque, segundo ele, a iniciativa gerou frutos, como a venda de parte do espaço para a Brookfield.  




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