Projeto idealizado por Celso Daniel foi
substituído pelo Brookfield Century Plaza
Anunciado em 1997 pelo então prefeito Celso Daniel (PT), o projeto Cidade Pirelli, em Santo André, jamais saiu do papel. Após inúmeras promessas e desculpas pelo não cumprimento do planejamento, o espaço no bairro Homero Thon foi transformado no Brookfield Century Plaza, complexo comercial e residencial bem mais acanhado do que a proposta original, assinada pelo arquiteto Edo Rocha.
A área que daria lugar ao megaempreendimento tem 215 mil m² e fica localizada entre a Avenida Giovanni Battista Pirelli e a linha férrea. O projeto original previa a construção de centro de convenções, casa de espetáculos, cinemas, restaurantes, hotel quatro estrelas, prédios comerciais, estacionamento subterrâneo e até uma rua 24 horas, que teria um quilômetro de extensão. Também eram esperadas empresas de call center e campus da UniABC (hoje Anhanguera). Na época, a estimativa era que fossem necessários R$ 200 milhões para executar as obras.
Após a morte de Celso Daniel, em 2002, o projeto foi sendo abandonado aos poucos. Mesmo assim, seu sucessor, o também petista João Avamileno, garante que, enquanto comandou o Paço Municipal (até 2008), a Prefeitura fez “tudo o que a Pirelli precisou”. Nesse período, Avamileno foi criticado por vereadores de oposição, que acusavam o Executivo de omitir informações sobre o andamento do empreendimento e reclamavam da lentidão por parte do poder público para viabilizar as ações planejadas.
O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico durante a gestão Celso Daniel (PT), Nelson Tadeu Pereira, avalia que a burocracia da própria Prefeitura para aprovar o plano e a lentidão do processo de desapropriação dos imóveis para a duplicação da Avenida Giovanni Battista Pirelli, essencial para o megaempreendimento, atrapalharam. “Demorou demais, o timing é importante para o investidor”.
Avamileno rebate. “Não houve demora da Prefeitura. Não foi isso que atrasou o projeto. Não me lembro de a Pirelli ter reclamado disso”, diz o ex-prefeito. O petista, que hoje é secretário de Direitos Humanos e Cultura de Paz em Santo André, diz não ter detalhes sobre os motivos que levaram a multinacional italiana a desistir da empreitada. “Isso ocorreu no governo Aidan (Ravin, hoje no PSB), depois que eu saí da Prefeitura. O objetivo da Pirelli era arrumar investidores e parceiros na iniciativa privada, mas acho que não conseguiu.”
MUDANÇA DE PLANOS - Em 2010, a fabricante de pneus colocou à venda cinco terrenos – entre eles o que daria lugar à Cidade Pirelli. Em 2012, a Brookfield Incorporações, que adquiriu a área na Avenida Giovanni Battista Pirelli, lançou oficialmente o Brookfield Century, complexo com 46,7 mil m² que conta com o Atrium Shopping, inaugurado no fim de 2013, e com cinco torres residenciais, prédio comercial e hotéis, ainda em construção.
O ex-prefeito reconhece que o Brookfield Century Plaza é bem mais acanhado do que o Cidade Pirelli, mas, ainda assim, enxerga pontos positivos no novo empreendimento. “Já que não pôde fazer o outro projeto, tem esse para ocupar o espaço que estava vazio. Não atende toda a necessidade, mas é melhor isso do que a Pirelli não fazer nada.”
O ex-vereador pelo PT Ricardo Alvarez (hoje no Psol) sempre fez críticas ao projeto original, que classifica como “megalomaníaco”. “Em algum outro lugar e em outra circunstância, essa parceria até poderia vingar, mas, naquela época e naquelas condições, achei que não tinha o menor sentido de acontecer.”
Para Alvarez, que é professor na Fundação Santo André, o projeto acabou estimulando a especulação imobiliária na região. O terreno foi ainda mais valorizado depois da duplicação da Avenida Giovanni Battista Pirelli, em 2001. Ele também critica a desapropriação de imóveis de cerca de 110 famílias e 40 comerciantes, além de questionar as contrapartidas impostas à empresa e a isenção do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). Na época, a companhia pagou cerca de R$ 2 milhões à Prefeitura, recurso que serviu para o alargamento da via e para a cobertura do calçadão da Rua Coronel Oliveira Lima, no Centro. “Na prática, eles (da Pirelli) não construíram o que se propuseram a fazer e foram beneficiados por uma série de leis. Não cumpriram a obrigação deles e isso gerou prejuízo social para os moradores cujas casas foram desapropriadas”, acrescenta.
A Pirelli foi procurada para comentar sobre a mudança no projeto, mas não se manifestou até o fechamento desta edição. O ex-prefeito Aidan Ravin também foi contatado pela equipe do Diário, mas afirmou que não poderia falar naquele instante. Em seguida, não atendeu mais as ligações.
OUTROS TEMPOS - Ex-diretor de recursos humanos da Pirelli, Sidnei Muneratti cita que a iniciativa foi idealizada na época em que a empresa vivia um de seus melhores momentos. “Foi sócia da Telecom Itália, dona da TIM, nos anos 2000, e um dos maiores grupos econômicos da Europa”, diz.
Questionado sobre o motivo de a empresa ter desistido de tocar o projeto, Muneratti diz que saiu da empresa em 2006, quando o plano ainda estava em andamento, mas cita que a fabricante de pneus mudou seu perfil no mundo todo nos últimos tempos. O fato é que a companhia italiana já vinha se desfazendo de grande número de ativos, inclusive a divisão de fios e cabos, atual Prysmian (adquirida em 2005 pelo grupo Goldman Sachs), até ter seu controle acionário vendido há duas semanas para a chinesa ChemChina (China National Chemical Corp).
Apesar disso, o ex-presidente da Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André) no fim da década de 1990 Saul Gelman considera que não foi um fracasso. Isso porque, segundo ele, a iniciativa gerou frutos, como a venda de parte do espaço para a Brookfield.
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