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Mãe, o que é inclusão?
Por Carlos Ferrari
29/09/2014 | 07:00
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Uma amiga me disse esses dias: “Caramba nossos filhos entram em determinado momento da infância em um ritmo frenético de vocalização de perguntas. É lindo ver o anseio deles na busca para saber tudo sobre tudo.” Continuando, alguns momentos depois ela ainda falou: “uma pena que eles acabam, muitas vezes, não nos perguntando sobre coisas fundamentais para toda a história de vida que apenas estão começando a vivenciar... Já pensou a criançada perguntando, por exemplo, o que é inclusão?”

Tal situação seria de fato uma experiência para lá de interessante para qualquer pai e mãe experimentar. Contudo, alguns dias depois desse bate-papo que tivemos, relembrando nossa conversa, fiquei pensando: caso a bela pergunta viesse, será que saberíamos responder à altura?

É claro que não estou falando da possibilidade de simplesmente declamar um conceito ou entoar de maneira empolgada um simpático discurso. A questão é: será que a maioria dos pais poderia, a partir de sua conduta diária, exemplificar com situações práticas o verdadeiro significado de inclusão?

Se buscarmos no cerne da definição teórica, o conceito proposto nos remete a um processo com via dupla, ou seja, a inclusão se dá na medida em que sociedade e indivíduos constroem juntos condições para tanto. Exemplificando, melhor que responder “bem filho, inclusão é, dentre outras coisas, quando as empresas criam oportunidades para públicos com dificuldades históricas para conseguir emprego” seria dizer “inclusão é como a gente faz lá no meu trabalho, ajustando tudo o que usamos e fazemos para que cada vez mais pessoas com necessidades e condições diferentes possam vir a ter oportunidade de trabalhar conosco.”

A prática diária, com certeza, pode vir a ser bem mais explicativa do que a defesa sem compromisso de qualquer que seja a ideia. Não tenho dúvidas de que, muito em breve, nossos pequenos estarão nos questionando não apenas sobre inclusão, mas também sobre outros temas como cidadania, solidariedade, ética e moral.

Também estou convicto de que não podemos, nem tão pouco devemos, deixar a cargo da escola a responsabilidade de apresentar a eles as respostas e as possibilidades decorrentes de assuntos como esses. É claro que a educação cumpre uma parte deste papel, porém, é da família o grande poder de convencimento e aproximação da garotada, junto a ideários tão nobres e paradoxalmente tão vilipendiados historicamente.

Não há mais espaço para contradições estúpidas que, ao contrário do que tentam argumentar, não têm nada de inocentes. Ninguém pode negar que qualquer criança fica com a cabeça em parafuso diante da postura de um pai que prega respeito ao próximo e, ao mesmo tempo, em uma festa tradicional de família, despeja piadas recheadas de gargalhadas sobre públicos historicamente discriminados, tais como negros, gays e mulheres.

O que dizer então daquele que repetidamente prega carinho aos mais velhos e, sem constrangimentos, ocupa a vaga de idosos em estacionamentos de shopping e supermercados?

Creio que muitas vezes existe a intenção de mudar, porém, o descuido com o piloto automático esquecido ligado há tempos faz com que homens e mulheres repitam velhas práticas condenadas por eles próprios. Assim, não tem outro jeito; precisa meter o pé no freio com coragem, assumir a direção da vida que verdadeiramente se almeja viver e, por consequência, proporcionar como caminho para futuras histórias daqueles que educamos e amamos.  

Carlos Ferrari é presidente da Avape (Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência), faz parte da diretoria executiva da ONCB (Organização Nacional de Cegos do Brasil) e é atual integrante do CNS (Conselho Nacional de Saúde).




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