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Brasileiros terão de se preparar para o juro baixo
22/03/2009 | 08:00
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O Brasil terá, talvez já no fim de abril, uma taxa básica de juros abaixo de 10% pela primeira vez na história - ao menos desde que o formato atual para medi-la foi criado, em março de 1999. Mais do que uma questão aritmética, esse novo cenário trará mudanças importantes para uma economia que se acostumou a ter um juro básico estruturalmente alto.

Os primeiros sinais de que o modelo anterior precisa ser alterado não demoraram a aparecer. O alerta soou inicialmente na caderneta de poupança. Analistas avisaram que a fórmula que prevê a correção pela TR (Taxa Referencial) mais 6% fixos ao ano é insustentável com a taxa básica de juros (Selic) abaixo de 10%. Segundo eles, provocaria uma migração maciça de investidores de fundos, CDBs e outras modalidades de aplicações rumo à caderneta de poupança.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu que algo deverá ser feito, mas ressaltou que a solução ainda não foi encontrada. Para o gerente executivo de política econômica da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Flávio Castelo Branco. "A economia brasileira vai precisar se adequar para conviver com uma taxa de juros internacional".

Outra consequência imediata foi a queixa de governadores sobre o indexador que corrige as dívidas dos Estados com a União. Eles argumentam que, com um taxa básica abaixo desse nível, subsidiarão o governo federal se os contratos não forem alterados. Há, ainda, outros efeitos, muitos dos quais só serão ‘percebidos' ao longo do tempo. Nesta matéria, são abordados cinco deles: investimentos pessoais, dívidas dos Estados, fundos de pensão, dívidas de empresas e dívida da União. Hoje a Selic está em 11,25%, menor nível desde que foi criada.

Os investidores da BM&F (Bolsa de Mercadorias e Futuro) já fazem apostas na queda dos juros. E se tudo correr como os analistas esperam, a taxa encerrará o ano em 9,75%. Há, porém, grandes chances de que esse nível seja alcançado já na próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) do BC (Banco Central), em 28 e 29 de abril.

Hoje, a maioria dos analistas projeta um corte de 1 ponto porcentual, para 10,25%. Parte deles, porém, não descarta nova redução de 1,5 ponto (como na última reunião do Copom).

Redução da taxa vai influenciar a poupança

A adaptação à uma economia de juros na casa de um dígito será sentida, primeiro, nas cadernetas de poupança. Mas a gestão da dívida pública e das empresas também devem sofrer adaptações.

Poupança - Há exatos dois anos, a Selic rumava para o menor nível da história, o que provocou amplo debate sobre a correção da poupança. O mesmo ocorre hoje. Segundo analistas, a necessidade de mudança das regras se explica pelo fato de a poupança se tornar quase imbatível ante outras modalidades de aplicação em uma realidade com Selic abaixo de 10% ao ano. Isso porque, o investimento mais popular entre os brasileiros tem um rendimento fixo de 6% ao ano, além da TR (Taxa Referencial). É algo entre 7% e 8% líquidos, pois poupança não paga imposto.

Isso tem implicações não apenas sobre bancos e gestores de recursos, mas também para o próprio governo. O patrimônio dos fundos de renda fixa e DI (os maiores no País) é composto, fundamentalmente, por títulos públicos. Ou seja, se o governo não mudar a correção da poupança, pode provocar uma saída em massa de recursos dos fundos, reduzindo a demanda por seus rendimentos.

Dívida pública - Um dos prováveis efeitos da queda da taxa básica de juros (Selic) para menos de um dígito se dará sobre a composição da dívida pública mobiliária brasileira. Hoje, a maior parte dos títulos emitidos pelo governo é atrelada à própria Selic. Assim, quando o juro sobe, a remuneração dos investidores que detêm esses papéis aumenta. O oposto também é verdadeiro. Essa situação é fruto da instabilidade econômica nas últimas décadas. As Letras Financeiras do Tesouro foram criadas no fim de 1987 (portanto, quando o Brasil ainda lutava para combater a inflação elevada), com objetivo de garantir ao investidor uma proteção contra as oscilações de preços e ao governo ‘clientes' para rolar sua dívida.

Na definição de Felipe Salto, analista da Tendências Consultoria, trata-se de mais uma ‘peculiaridade' brasileira. Os analistas não sabem de algo semelhante em outros países. Por isso, Márcio Holland, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas), avalia que a manutenção dos juros mais baixos no longo prazo pode implicar o fim de mais essa jabuticaba.

Empresas - Endividadas ou com problemas para conseguir capital de giro a um custo razoável, as empresas são parte interessada quando o assunto é a taxa básica de juros. Dados de janeiro do BC mostram que o setor privado deve pouco mais de meio trilhão de reais. Desse total, R$ 122,3 bilhões são dívidas da indústria.

Falar hoje de uma Selic de menos de 10% não quer dizer que no dia seguinte os financiamentos custarão menos, como salienta o gerente executivo de política econômica da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Flávio Castelo Branco. Para ele, um dos pontos de partida para que isso aconteça será a redução do spread bancário (diferença entre a taxa de captação do recurso e a cobrada do cliente).

O economista acredita que a queda da Selic só deve trazer vantagens ao setor privado. "O impacto será positivo para as empresas. O custo de rolagem das dívidas e de captação para capital de giro tende a cair", avalia o executivo da CNI.




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