Cultura & Lazer Titulo Wim Wenders
São Paulo está no novo filme do alemão
23/10/2008 | 07:15
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Ele circulou tranqüilamente pelas ruas, ainda que seus longos e revoltosos cabelos grisalhos despertassem alguma curiosidade. Apenas nas salas de cinema, onde é idolatrado pelos fãs, é que o cineasta alemão Wim Wenders assumiu sua condição de estrela, atraindo flashes e aplausos. Durante dois dias, ele esteve em São Paulo, ministrando cursos, participando de debate, anunciando filmes, tudo a convite da 32ª Mostra de Cinema de São Paulo. Cidade que Wenders já conhecia e que lhe inspirou momentos de Palermo Shooting, seu mais recente filme, em exibição no festival. Aos 63 anos, Wenders fala com sotaque europeu e possui um humor ácido que compete e é derrotado por uma profunda bondade. Isso porque ele ainda se rende ao cinema, arte que continua a surpreendê-lo, mesmo com uma carreira de 41 anos e 36 filmes. Foi o que o motivou a aceitar o convite de Leon Cakoff, organizador da Mostra, que lhe deu carta branca para montar uma programação de filmes com os quais tenha afinidades eletivas. Wenders escolheu 14 longas, entre clássicos (Truffaut, Ozu, Godard) e novos realizadores (Birgit Möller, Robinson Savary). Um deles, O Homem de Lugar Nenhum, da belga Patrice Toye, deixou-o profundamente incomodado. Wenders falou à reportagem na tarde de anteontem, ainda na Capital.

Por que Palermo Shooting é dedicado a Ingmar Bergman e Michelangelo Antonioni, cineastas que morreram no ano passado?

WIM WENDERS - Eu escrevia o roteiro quando soube das duas mortes e minha história trata exatamente de temas que eram caros a esses cineastas: a convivência com a morte e a fotografia como expressão da verdade. Praticamente apenas Bergman e Antonioni se aventuraram nesse assunto de forma tão profunda; portanto, com a morte de ambos e por tratar da mesma inquietação, decidi oferecer o filme a eles.

O personagem principal do filme, aliás, é um fotógrafo que, além de ser perseguido por um ser que representa a morte, utiliza os mais modernos recursos tecnológicos para exercitar seu trabalho, chegando a manipular as próprias fotos.

WENDERS - Sim, minha intenção era fazer um filme sobre fotografia e as questões que hoje envolvem esses profissionais, especialmente a verdade. Acredito que, hoje em dia, a fotografia é a arte que mais se confronta com a verdade, uma vez que uma imagem pode tanto ser totalmente modificada e, assim criar uma nova realidade, como simplesmente apagada, o que significa você eliminar o passado com apenas um clique.

Finn, o fotógrafo interpretado por Campino, líder da banda de rock Toten Rosen, planeja fazer uma exposição no Masp (Museu de Arte de São Paulo - Assis Chateaubriand). Em que sentido São Paulo tanto o atrai?

WENDERS - Quando imaginei a cena, pensei em São Paulo porque fiquei impressionado aqui com os enormes cartazes e outdoors que dominavam a cidade, criando um novo conceito de selva - muito diferente da selva com que o Brasil é identificado no estrangeiro. Assim, no filme, a propaganda da exposição fotográfica de Finn aconteceria nesses outdoors ao longo da cidade e o trabalho dele ocuparia um andar inteiro do Masp, museu que me fascina muito. Se algum dia eu conseguir expor meu material fotográfico, gostaria que fosse ali. Arquitetura e pintura são outras artes, além da fotografia, que têm presença importante no filme. Sou muito interessado em arquitetura. Quando Finn termina seu trabalho em seu estúdio, ele admira a paisagem pela janela. Decidi filmar na Zollverein School, que fica em Essen e é um maravilhoso projeto da arquiteta japonesa (Kazuyo) Sejima - aliás, uma das raras mulheres a terem o trabalho mundialmente reconhecido na arquitetura. Lá, as janelas não têm o recorte tradicional e se espalham pelas longas paredes, criando a impressão de que são fotos distribuídas pelo espaço e não apenas janelas. O efeito é muito cinematográfico.

A segunda metade do filme, que se passa em Palermo, a presença da morte é muito forte e constante. Finn, aliás, busca incessantemente encontrar o homem que a representa, vivido pelo ator Dennis Hopper. Como você lida com a morte?

WENDERS - No começo, Finn trata a figura da morte com um certo desprezo, até com ironia. Aos poucos, passa a levá-la mais a sério. Mas o que realmente me interessa é mostrar que ele não tem medo da morte. Conversei com diversas pessoas que estiveram muito próximas de morrer e todas comentaram que, em nenhum momento, ficaram temerosas. Assim, a imagem da morte, acredito, deveria ser aceita da mesma forma como tratamos a vida.

Você anunciou em Veneza que não mais presidirá júris de grandes festivais. Por quê?

WENDERS - É muito trabalhoso e ajuda a criar inimizades. Não tenho mais idade para isso.




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