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Pacote socorrerá pólos industriais
Fábio Zambeli
Da Associação Paulista de Jornais
09/03/2008 | 07:09
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O governo federal prepara um pacote de medidas para incrementar a atividade produtiva em 25 segmentos e socorrer setores da indústria paulista fragilizados com a concorrência externa por meio da facilitação de crédito para modernização dos parques fabris. A informação é do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, em entrevista exclusiva concedida à APJ (Associação Paulista de Jornais).

O conjunto de ações oficiais pró-indústria está materializado no projeto da ‘política industrial’, encaminhado por Miguel Jorge ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que aguarda a votação do orçamento para ser anunciado e mensurado em termos de montante de recursos.

“O principal é você procurar modernizar e fazer com que estes pólos sejam mais produtivos e eficientes, com a facilitação de compra de equipamentos, financiamentos. É preciso modernizar esta indústria. Você não conseguirá competir no mercado internacional se não tiver produtividade e preço. Você não vai conseguir preço se não tiver produtividade”, diz o ministro.

Entre os segmentos contemplados pelo pacote estão o automotivo, o calçadista, o têxtil e o aeronáutico. Além de impulsionar as exportações e abrir novas linhas de financiamento, o ministério planeja aumentar o índice de nacionalização de peças e fornecedores.

Miguel Jorge, 62 anos, aposta ainda na superação de divergências ideológicas entre PT e PSDB para desenvolver uma estratégia conjunta de estímulo aos Arranjos Produtivos Locais e Parques Tecnológicos, envolvendo a União e o governo estadual. “Temos nos reunido com o secretário Goldman (Alberto, Desenvolvimento). É você fazer com que a parceria funcione dos dois lados. Se o Estado desenvolve, nós temos ferramentas para ajudar.”

Egresso da iniciativa privada, onde consolidou sua carreira como alto executivo do Banco Santander e da Volkswagen, o jornalista Miguel Jorge acredita que os resultados da economia ajudaram o empresariado a superar a desconfiança com o governo Lula.

O ministro, prestes a completar um ano no cargo, defende a condição do presidente petista de ‘caixeiro-viajante’, difundindo os produtos nacionais em novos mercados, especialmente o etanol. “Acho que é o papel de um presidente mesmo. Ele tenta vender, ela fala dos produtos. No caso do etanol, por exemplo, ele é um embaixador do produto no mundo todo.”

APJ – Quando se fala em 25 segmentos que seriam contemplados nesta nova política industrial, incluem-se aí quais setores especificamente?

MIGUEL JORGE – No caso de São Paulo, a indústria automobilística é um exemplo. Não só com relação às montadoras, também com as autopeças. Tem autopeças no Interior, em Araraquara, Campinas, Grande ABC. No caso da indústria automobilística, o salto tem de ser dado. O Brasil produziu este mês, pela primeira vez desde que a indústria está aqui, em 50 anos, três milhões de veículos com a produção anualizada, de janeiro a janeiro. A capacidade instalada está no máximo. Ela é de três milhões e meio. As fábricas de caminhões e ônibus, especialmente, estão trabalhando sábado, domingo, para atender o mercado. E, mesmo assim, especialmente os pesados têm espera de quatro, cinco ou até seis meses.

APJ – Em que sentido se daria este salto? O governo tem condições de interferir para aumentar esta capacidade?

JORGE – Nós queremos, com a política industrial, chegar em 2010 com a capacidade instalada de cinco milhões de veículos, que é o que consideramos um número importante para que você possa ser competitivo e possa enfrentar os países que estão entrando pesado na produção de automóveis, como a China, a Índia.

APJ – Como o senhor observa esta espécie de leilão da indústria automotiva por regiões de custo inferior de produção?

JORGE – Eu acho que é irreversível. Não é um processo novo. É um processo de desconcentração que começou com a Volks, com a fábrica de Resende, de caminhões e ônibus. Isso se deve a vários fatores, não apenas à questão salarial. Tinha a questão de logística, havia uma concentração muito grande em São Paulo. Já havia na época uma previsão de um mercado livre para o Mercosul. A GM, por exemplo, foi para Gravataí (RS) pensando na liberalização do comércio entre Brasil e Argentina. Além disso você tinha a questão salarial. A Fiat, em Belo Horizonte, já paga salários menores que os pagos em São Paulo. Os salários têm um peso razoável na formação de custo do produto. Se você tiver em região onde o salário é menor, você terá um custo menor e, portanto, ficará mais competitivo.

APJ – Entre os Estados, a disputa ocorre mais no aspecto fiscal...

JORGE – Este processo todo da disputa entre os Estados ocorreu no âmbito da guerra fiscal, que agora a gente pretende mexer com a proposta de Reforma Tributária, que foi para o Congresso na semana passada. As novas empresas sempre procurarão vantagens competitivas para se instalar. Acho difícil, por exemplo, que uma indústria, a não ser que tenha especificidades muito fortes, se instale em área de alta concentração industrial. Porque há dificuldade logística, de qualificação de mão-de-obra. A tendência, que é salutar, é ter uma desconcentração industrial no País.

APJ – Até que ponto a ascensão do presidente Lula ao governo contribuiu para o distensionamento das relações entre a classe patronal e os trabalhadores, representados por seus sindicatos?

JORGE – Eu diria que contribuiu, mas não pela origem sindicalista do presidente Lula. O distensionamento ocorreu muito mais pelo processo de desenvolvimento econômico. Nós estamos no 23º trimestre consecutivo de crescimento da economia. As negociações entre os setores empresariais e os sindicatos estão se dando num clima totalmente diferente. Porque como as empresas estão ganhando, fica mais fácil negociar e dar aumento real para os trabalhadores. Em todos os setores da economia as negociações sindicais estão levando a ganhos acima da inflação para os trabalhadores.

APJ – Inclusive no setor automotivo?

JORGE – No caso da indústria automobilística, por exemplo, o último acordo foi considerado um dos melhores. Porque a indústria automobilística está batendo recorde em cima de recorde. Ela está tendo lucro. Se está tendo lucro, ela pode dar reajuste real. A massa salarial industrial teve um crescimento muito grande. Não há muita razão para que você tenha a tensão. Então este distensionamento tem muito mais relação com o crescimento do que com a origem sindical do presidente.

APJ – O texto da Reforma Tributária, que o senhor reconhece não ser a ideal, mas a possível, conseguirá desonerar a produção?

JORGE – O presidente na semana passada se reuniu com mais de 100 representantes do empresariado em âmbito nacional. Fiquei impressionado porque houve uma unanimidade, uma aceitação muito grande da proposta. Embora, com algumas ressalvas, em que diziam que é preciso avançar mais, que seria uma proposta tímida, todos foram a favor desta reforma. Não houve nenhum empresário que tenha dito que a reforma não é boa. Todos foram unânimes em dizer que deveria ser aprovada o mais rápido possível.

APJ – Ela desonera a folha de forma satisfatória?

JORGE – Com relação à folha, ela desonera, tira vários custos embutidos na folha. Isso certamente ajudará na geração de empregos, que é uma das propostas da reforma.

APJ – E as reformas trabalhista e sindical, que também são clamores do setor produtivo, ainda estão na pauta para este governo?

JORGE – Elas virão. O primeiro passo, realmente, é a reforma tributária que está sendo encaminhada. Mas as reformas política, sindical, trabalhista, elas todas deverão vir. O que nós não podemos é fazer uma reforma ampla, geral e irrestrita. Porque os interesses são muitos. No caso das outras reformas também. Nós não podemos mandar ao Congresso quatro reformas de uma só vez porque no fim nenhuma delas passaria. Vamos com calma, aos poucos. O fato de a reforma tributária, que há um consenso nacional em relação à necessidade dela. É mais ou menos como em qualquer tipo de negociação. Você começa a negociar com os pontos mais fáceis. Comecemos pelos pontos em que todos concordam e depois vamos avançando para os pontos mais difíceis.

APJ - Os fundamentos da macroeconomia parecem dificultar a balança comercial. O senhor concorda?

JORGE – O câmbio tem favorecido as importações de máquinas e bens de capital para o Brasil.

APJ – O senhor considera que os números das vendas externas não são preocupantes?

JORGE – Nós deveríamos esperar um pouco mais para ver como se comportam as exportações brasileiras. As análises mostram que por enquanto não há motivo de preocupação e que as exportações continuarão em um ritmo bastante bom. E que nós exportemos US$ 180 bilhões este ano. A Secretaria de Comércio Exterior continua muito confortável em relação a esta meta.

APJ – Mesmo com o real se valorizando?

JORGE – Mesmo com o real se valorizando. Aliás, esta previsão foi feita com o real valorizado.

APJ – O senhor tem se manifestado a favor da privatização de setores que considera ‘não-estratégicos’. Com relação aos bancos, por exemplo, a reação no próprio governo não é unânime...

JORGE – Privatização não significa você vender todos os ativos, 100% de um Banco do Brasil, por exemplo. Eu sou sócio da Petrobras e comprei as ações com meu fundo de garantia. A Petrobras continua sob controle do Estado e tem um grande número de acionistas minoritários. Acho, por exemplo, que se os trabalhadores pudessem usar seu FGTS para comprar ações do Banco do Brasil, da Caixa, seria importante não só para os trabalhadores, mas para os bancos, que receberiam uma alavancagem financeira.




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