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Paraty, no Rio, terá
melhorias em 2014

Cidade conta com arquitetura colonial, gastronomia
típica caiçara e manifestações culturais diferenciadas

Miriam Gimenes
02/01/2014 | 09:00
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São quase 21h e um apagão toma conta da cidade. É antevéspera de Natal e as ruas ficam, em poucos minutos, desertas e silenciosas. O restaurante em que eu estava, o mais antigo da vila, detém uma bela imagem de Santa Rita, que ficou iluminada apenas pela luz das velas. Quase duas horas depois, a força volta e eu, já na rua principal, comemoro, em voz alta, não ter ocorrido um blecaute na noite da ceia. “Não fala isso, minha filha. Aqui, tudo pode acontecer”, diz um homem, sentado na soleira de uma porta. É essa atmosfera de mistério, história, beleza e brasilidade que faz de Paraty – a 330 quilômetros da Capital – uma das cidades mais encantadoras e visitadas em todo País.

A luz é um fenômeno recente – chegou em meados do século 20. Antes, as ruas eram iluminadas apenas por lampiões, acesos todos os dias após o pôr do sol, exceto nas noites de lua cheia. Nas casas, a iluminação era feita por velas ou lamparinas. Mas muita coisa mudou e, junto com as melhorias básicas, veio também a maior fonte de renda existente hoje por lá: o turismo. Paraty ficou por muito tempo esquecida, principalmente após a abolição da escravatura, em 1888, o que causou enorme êxodo e decadência comercial. O difícil acesso também contribuiu para a ruína, já que só era possível chegar lá de barco, vindo de Angra dos Reis, ou pela estrada de Cunha, em péssimo estado.

Na década de 1970, no entanto, com a abertura da Rio-Santos (BR-101), deu-se início ao desenvolvimento turístico e imobiliário da cidade. Só que o isolamento teve uma vantagem: preservou-se muito da estrutura arquitetônica urbana, no estilo colonial, e os costumes dos paratienses.

Ainda é possível ver por lá manifestações populares, como as tradicionais bandinhas que passam pelas ruas de pedra do centro histórico – com calçamento pé de moleque – e procissões em homenagem aos negros que viveram por lá. São de emocionar.

E não é só isso: a baía de Paraty é composta por 300 praias paradisíacas e 65 ilhas. Algumas podem ser visitadas durante passeio de barco.

O comércio também é farto, com produtos artesanais diferenciados – feitos, inclusive, pelos índios que ainda habitam a região –, gastronomia tradicional caiçara e moradores dispostos a prosear bastante, principalmente para lembrar da história local.

Todos os anos, em julho, a vila sedia a famosa Flip (Festa Literária Internacional de Parati), que reúne literários, intelectuais e apaixonados por livros. Em 2014, por conta da Copa, o evento será realizado um pouquinho mais tarde, entre os dias 30 de julho a 3 de agosto.

Se quiser entrar no clima de antigamente, faça o passeio de charrete, que custa R$ 20, em média, e permite conhecer a história das igrejas – Santa Rita e a matriz de Nossa Senhora dos Remédios –; saber por que as telhas que recobrem as casas são irregulares, por terem sido moldadas nas coxas dos escravos; conhecer a casa do príncipe Dom João Orleans e Bragança, trineto de Dom Pedro; e descobrir o significado dos símbolos que adornam várias construções – herança do tempo em que a cidade foi urbanizada por maçons. Uma viagem no tempo a céu aberto. Não à toa, a cidade foi tombada como Patrimônio Histórico Nacional.

Em dias de sorte, também pode-se presenciar a invasão das águas nas ruas de pedra, que acontece quando a maré enche e faz com que a imagem das casas fique refletida na água. O que antes era a única forma de limpar as ruas – já que, por falta de saneamento, os moradores dispensavam ali mesmo os dejetos líquidos – hoje é um deleite para quem quer presenciar in loco o motivo pelo qual a cidade é chamada de Veneza Brasileira. Quem já teve oportunidade de conhecer a cidade italiana sabe que a tupiniquim tem muito mais a oferecer. Vale conferir.

LENDAS

A noiva de Santa Rita – Conta-se que morreu poucas horas antes de ir para o altar, na Igreja de Santa Rita. Dois dias depois, o noivo acordou desesperado, pedindo para abrirem o caixão – enterrado na própria igreja – dizendo que a escutou lhe chamando. Todos acharam que ele estava louco e não abriram o túmulo. Tempos depois, quando retiraram o caixão, o corpo estava virado, mostrando que ela foi enterrada viva e morreu de sede. Várias pessoas disseram já ter visto seu fantasma bebendo água do chafariz na frente da igreja.

O tesouro de Trindade - Diizem que a vila, que pertence a Paraty, tem um tesouro roubado do império inca por espanhóis. Por conta disso, apareceram diversos caçadores de tesouros na segunda metade do século passado por lá, que acabaram destruindo muitos sítios arqueológicos locais. Acredita-se que a fortuna está enterrada perto do Cachadaço.

Praga do padre - Um pároco que defendia a República chegou à cidade no século 19. Os conservadores locais o expulsaram a socos e pontapés. Antes de ir embora, ele rogou uma praga: aqueles que tinham excedido nas hostilidades ficariam com a perna direita inchada e deformada como ficou a sua e, para a cidade, haveria um grande atraso durante um século inteiro. De 1870 a 1950, Paraty viveu grande recessão e dizem que, ainda hoje, uma família inteira tem a perna direita deformada.

FOLIA DE REIS
Paraty começa o calendário cultural com o pé direito. No dia 6 a cidade realiza a tradicional Noite de Reis, de origem portuguesa, com o encontro de folias. Um grupo de músicos visita as casas, sempre durante a noite, narrando o nascimento de Jesus e fazendo cantos de louvor.
É fácil identificá-los: usam trajes especiais; portam um estandarte; levam viola, violão, cavaquinho, pandeiro, caixa surda e um triângulo; e têm um mestre, um contra-mestre e um tripe (adolescente ou mulher que canta em falsete). Em contrapartida, os moradores oferecem doces, rabanada, vinho ou alguns trocados.
Já a programação de verão da cidade será feita em dois locais: na rua do Paço Municipal e na praça da Igreja Matriz.
Diversos blocos tradicionais de Paraty se apresentarão. O primeiro é o Ciranda Caiçara, no dia 4, seguido pelo Bloco Tribo do Samba (dia 11), o Ciranda 7 Unidos (18) e o Maria Martha (25), todos às 20h.
Na praça da Matriz, a programação começa no dia 3, às 22h, com o Grupo Velha Guarda. Nos dias seguintes haverá show de Paulo Meyer e Banda (4), Luiz Perequê (5), Júnior & Diego (10), Dejane Borba (11), Cláudio Boca (12), Moreira Júnior (17), Banda Chama Maré (18), Luis Casquídeo e Banda (19), Bebeto & Banda (24), Ciranda Elétrica (25), Arrastão do Jabaquara (26), Nepher (31), Trio Bangarapira (1º de fevereiro) e Banda Villa Velha (2 de fevereiro).

ESCUNA
A igreja de Santa Rita de Cássia, que estampa a capa deste caderno, é o cartão-postal de Paraty. De perto é possível apreciar os detalhes barrocos do prédio, que agora comporta o Museu de Arte Sacra da cidade. Só que, apreciado sob outro ponto de vista, do alto-mar, o prédio até parece um quadro. É possível desfrutar deste cenário fazendo um passeio de barco pelos melhores pontos de Paraty. São inúmeras as opções de embarcação, que saem diariamente do cais da vila, às 11h, com o preço médio de R$ 30.

Nas escunas há sempre música ao vivo e o cantor é o guia do passeio. É ele quem comenta sobre as ilhas avistadas e explica cada uma das quatro paradas feitas durante o percurso. Os turistas podem ver, por exemplo, a ilha de propriedade do navegador Amyr Klink, conhecida como Bexiga, por ter abrigado vítimas de um surto de varíola que acometeu Paraty no século passado.

O barco passa também pela ilha dos Cachorros, onde na década de 1940, por determinação de um antigo prefeito, foram deixados à míngua todos os cães que perambulavam pela cidade.

Durante as paradas, os turistas têm cerca de 40 minutos para desfrutar do destino. As escunas costumam ancorar na Praia Vermelha, na da Lula e na chamada Lagoa Azul, parecida com a homônima de Angra dos Reis. Pode-se chegar até a areia a nado ou de bote, disponibilizado pela embarcação, que também oferece boias em formato de macarrão para quem não sabe nadar.

As escunas são uma boa opção porque oferecem estrutura para os turistas, inclusive para quem tem bebês, que podem dormir tranquilamente no seu interior. Já os barcos particulares são vantajosos para quem quer escolher o destino a seguir e não gosta de esperar muito tempo em cada lugar.

CACHAÇA
Mesmo quem não é amante de aguardente tem de experimentar, nem que seja uma só vez, a cachaça feita em Paraty. A tradição remete ao século 18, quando o município abrigava quase 200 engenhos – hoje há apenas cinco.
Não à toa, as lojas que vendem a bebida são constantemente procuradas, assim como as fazendas que a produzem. Uma delas é a Murycana, localizada ao pé da Serra da Bocaina.

Além de poder tomar um gole de pinga e comprá-la, a propriedade mantém um museu com peças antigas no casarão, um restaurante com capacidade para 300 pessoas, rancho com produtos típicos da fazenda, queda d’água e um minizoológico. Crianças também adoram esse passeio.

OBRAS
A administração de Paraty quer atrair ainda mais visitantes. Principalmente aqueles que reclamam da impureza da água que sai pelas torneiras e do cheiro de esgoto latente nas ruas do centro histórico. A Prefeitura promete tratar a água e o esgoto de mais de 70% das casas por meio de uma PPP (Parceria Público Privada). O procedimento deve levar quatro anos.

Além disso, a cidade deverá comportar um Centro de Convenções no próximo ano, a ser construído no Bairro do Jabaquara.

A prefeitura ressalta que conseguiu limpar o nome no Cauc (Cadastro Único de Convênios), uma espécie de SPC dos órgãos públicos. A dívida impedia o recebimento de recursos e emendas parlamentares para a cidade, que em breve terá mais novidades.

PARATY-CUNHA
Outra obra que é aguardada há quase três décadas é a pavimentação da Estrada-Parque Paraty-Cunha. Além de conter belas paisagens, já que liga Rio a São Paulo pelo Parque Nacional da Serra da Bocaina, a via reduz o tempo de viagem entre os Estados. A obra, embargada durante 25 anos por questões ambientais, deve ser concluída no fim deste ano.

TRINDADE
A Vila de Trindade ficou conhecida na década de 1970 por conta do movimento hippie. Localizada a 25 quilômetros do centro de Paraty, o local, habitado por caiçaras, ainda que seja bastante visitado em alta temporada, se esforça para manter intacto o seu bem mais precioso: a natureza. Afinal, lá se vive quase que exclusivamente do turismo.
Se você está indo pela primeira vez a Trindade, informe-se logo no início da estrada, conhecida como Morro do Deus-me-livre, na sede da Associação Cairuçu. Lá há um posto de informações turísticas e, ao lado, um posto policial. O morro leva este nome engraçado porque antes era muito difícil atravessá-lo, mas agora a via está asfaltada.

Depois de rodar 16 quilômetros, o motorista vislumbra a primeira praia: Cepilho, com enormes pedras, geralmente frequentada por surfistas devido às ondas fortes.

Seguindo à direita, o turista atravessará um pequeno riacho e chegará à vila de fato, onde estão os comércios, pousadas e restaurantes locais. Aqui vale um adendo: Trindade tem o melhor PF (prato feito) das imediações e a um preço justo – cerca de R$ 17 por pessoa.

Um pouco mais à frente, pode-se escolher entre a Praia dos Ranchos, que tem restaurantes e guarda-sóis, ou a Praia do Meio, que é mais tranquila. Por ser área de preservação do Parque Nacional da Serra da Bocaina, ela está recebendo fiscalização – tanto que os quiosques locais estão fechados – contra o turismo predatório. Se quiser se proteger do sol, leve seus apetrechos.

Nela há uma trilha que dá na praia do Cachadaço, um pouco mais selvagem do que as outras. Se tiver fôlego, percorra toda a extensão de areia e pegue outro percurso, que dará nas piscinas naturais do Cachadaço.
Para quem não tem espírito aventureiro, há outra opção mais fácil de chegar lá: barqueiros cumprem o trajeto até as piscinas, partindo da Praia do Meio, ao custo de R$ 10 por pessoa.

CACHOEIRA
A Praia do Meio também comporta outra trilha, mas esta leva o visitante para a chamada Pedra que Engole. Para encará-la é preciso entrar entre as pedras, ultrapassar uma corrente de água e escorregar para debaixo de uma delas. Lá estão poços com águas cristalinas e pequenas cachoeiras. Esse passeio é indicado para quem está acostumado com trilhas do gênero.

SÃO GONÇALO
O encontro do rio com o mar dá boas-vindas a quem se aventura a passar um pouquinho de Trindade para conhecer a Praia de São Gonçalo. Aqueles que já tiveram a oportunidade de conhecer a Praia do Gunga, uma das mais famosas de Maceió (Alagoas), vão perceber que esta extensão de areia fluminense – a 32 quilômetros do centro de Paraty – é bem parecida com a alagoana.

A travessia do braço de rio até chegar à praia pode ser feita a pé, em dias de maré baixa, ou de canoa. De lá saem barcos que levam os turistas em direção à Ilha dos Pelados – a R$ 10 –, onde funciona um tradicional barzinho. A ilha tem quatro praias rasas e fontes de água mineral.

CURTIÇÃO
Mas quem preferir ficar por São Gonçalo mesmo não vai se arrepender. Além de boa infraestrutura – já que lá funciona o quiosque da Morena, com porções maravilhosas –, a água é tranquila e limpa, ideal para crianças. Também há um estacionamento privativo para deixar o carro próximo da praia, ao custo de R$ 10.
A praia São Gonçalinho fica um pouco mais para frente, mas também tem como característica as águas claras e muita calmaria. O acesso é feito por uma trilha que sai de São Gonçalo.




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