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Grampos telefônicos incriminam governador do Piauí
Do Diário do Grande ABC
09/10/1999 | 14:25
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Os grampos telefônicos que a Polícia Federal instalou no Piauí para investigar o crime organizado acabaram esbarrando em conversas sobre a liberaçao de recursos do governo local que citam personagens bem próximos do governador do estado, Francisco Moraes, o Mao Santa. A escuta que revelou o esquema comandado por policiais militares que corrompia e ameaçava prefeitos e emitia notas fiscais frias também expôs diálogos comprometedores. O principal deles está na fita de número 220.

A gravaçao que está sendo investigada pela Superintendência da Polícia Federal no Piauí foi feita no dia 2 de julho deste ano no telefone (86) 232-2908 do escritório do coronel da PM reformado José Viriato Correia Lima, acusado de comandar as açoes criminosas de policiais naquele estado. Na fita que está sob a guarda da PF, os grampeados colocam sob suspeita a advogada Cassandra Moraes, filha do governador Mao Santa. Mencionam também um "esquema" na Secretaria de Fazenda que o vice-governador Osmar de Almeida Júnior teria para liberar recursos.

Obras - De um lado da linha, Francisco Domingos, braço-direito do coronel Correia Lima. Do outro, um empresário de quem a PF só conhece o primeiro nome, Valdeci. Esse empresário, segundo a conversa gravada, teria dinheiro para receber por obras feitas para o governo estadual. Segundo relatório do agente federal que transcreveu a fita, Valdeci diz que nao recebeu por obras que fez.

"Valdeci pergunta a Domingos porque ele nao se juntou a Cassandra. Domingos diz que falou com ela, porém, ela queria ficar com a metade", diz o relatório da PF, narrando a conversa. Valdeci fala ao braço-direito do coronel Lima do vice-governador. "O vice-governador tem um esquema, através da Secretaria da Fazenda, que é por onde sairá o pagamento", diz Domingos, na fita. Domingos explica que o escritório do coronel Correia Lima cobra 30% de comissao. Valdeci tenta um desconto. Paga até 20% e afirma que vai negociar com o coronel. "Para pagar 30% é melhor desistir do débito", argumenta.

Prisao - A divulgaçao dos grampos da PF obrigou o governador Mao Santa a deflagrar na semana passada investigaçoes contra os policiais denunciados. O coronel Odival Falcao, chefe do gabinete militar do governador - flagrado encomendando notas fiscais para apresentar ao tribunal de contas - foi o primeiro a pedir o afastamento do cargo na noite da última quinta-feira.

Na sexta-feira, foi a vez do irmao dele, o coronel Valdílio Falcao, comandante da PM do estado deixar o posto. Valdílio é acusado pela Polícia Federal de se omitir na investigaçao dos crimes por receber favores de Correia Lima. Mao Santa também determinou a prisao disciplinar do coronel reformado Correia Lima e de outros três PMs ligados a ele. A Secretaria de Segurança instaurou processo administrativo contra policiais civis citados como participantes de açoes criminosas.

Ameaça - Essas medidas nao foram suficientes para tranqüilizar as autoridades envolvidas nas investigaçoes. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Piauí (OAB-PI), Nelson Neri, saiu do estado com a família. O advogado está ameaçado de morte. Ele teme que, mesmo detido num quartel da PM, o coronel reformado possa continuar comandando açoes criminosas, incluindo contatos com assassinos de aluguel.

"O que veio à tona foi muito maior do que eu imaginava que teria", comentou o deputado Welinton Dias (PT-PI), um dos primeiros a denunciar a açao do crime organizado no Piauí e que também está jurado de morte. "Desde 1995 trabalhava com essa tese do crime organizado, mas jamais pensei que envolveria tantas autoridades. O pior é que as investigaçoes estao só começando", afirmou o deputado.

Golpe - Flagrado em conversas em que prometia mandar matar seus inimigos e encomendava o espancamento de quem o criticava, o coronel Correia Lima também revelou nas conversas gravadas querer ampliar as 'atividades comerciais``. Seu escritório fornecia notas fiscais frias para prefeituras desviarem recursos federais, vendia armas ilegais e fazia cobranças sob ameaça. Um dos golpes era aplicado com a simulaçao de serviços de dedetizaçao em prefeituras. Partiu do contato de Correia Lima em Sao Paulo - um empresário dono de um estacionamento identificado apenas pelo nome de Rubens - a sugestao de diversificaçao dos negócios. Numa conversa, Rubens fala que poderiam instalar máquinas de caça níquel no Piauí. Correia Lima gosta da idéia e diz que nao haverá problema com a polícia. "Quem manda aqui somos nós", diz o coronel reformado.

Senador - Outro golpe preparado pelo escritório de Correia Lima usaria o nome do senador Alberto Silva (PMDB-PI). Rubens diz ter contato com representantes de uma empresa chinesa que queria se instalar no Brasil. Sugere o contato com o senador com quem Correia Lima tinha contato. Pelos serviços de intermediaçao da liberaçao de financiamento no Banco do Nordeste, o escritório cobraria comissao. Na conversa gravada, o coronel diz que falaria com o senador. Alberto Silva confirma que foi procurado pelo coronel que indicou um empresário paulista que teria o contato com os chineses.

O senador chegou a conversar com o estrangeiro que representaria o grupo chinês. "Pedi que me apresentassem um projeto, mas eles sumiram", contou o senador. Ele se diz surpreso com as denúncias contra Correia Lima. "Para mim foi uma surpresa total. Ele falava com todo mundo. Conhece todo mundo no Piauí, mas nunca deu demonstraçoes de riqueza", comentou Alberto Silva.




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