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Problemas com peruas de lotaçao vao continuar em SP
Do Diário do Grande ABC
05/02/2000 | 16:11
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Sao Paulo é pequena para suas 14 mil, 15 mil ou 18 mil peruas e vans - as estimativas sao desencontradas -, que transportam pelo menos 300 mil passageiros todos os dias. Isso é consenso, de especialistas e Prefeitura aos próprios perueiros. E vai estar longe de resolver o problema a curto prazo o resultado da licitaçao para a escolha dos 4.042 perueiros que serao autorizados a trabalhar (o caderno de edital começa a ser entregue gratuitamente na sexta-feira). Pelo contrário, pode ser o início de uma nova onda de protestos e de repressao.

O grande desafio é convencer quem ficar de fora a procurar uma nova atividade. "Quem nao vencer a licitaçao vai continuar como agora, na clandestinidade, e vamos acirrar a fiscalizaçao", promete o secretário municipal dos Transportes, Getúlio Hanashiro, que estima o número de veículos em 15 mil. As multas hoje já sao de R$ 3.192,30.

Segundo o Sindlotaçao, uma das entidades que representam os perueiros, esse tipo de transporte gera cerca de 42 mil empregos diretos e movimenta pelo menos R$ 8 milhoes mensais.

"Catorze mil perueiros, como a capital tem agora, dificilmente caberiam, até porque nao queremos guerrear pelo passageiro", afirma o presidente do Sindlotaçao, Célio dos Santos. "Acho que vai causar polêmica na própria categoria, mas o ideal sao 8 mil veículos legalizados, um número que pleiteamos desde 1999", diz Santos.

Segundo ele, seriam criados 32 mil empregos diretos, contando o dono e um motorista auxiliar para se revezarem na direçao - hoje muitos trabalham mais de dez horas para nao ter ajudante - e dois cobradores. "Mas seria um transporte organizado, após discussao séria e ampla", explica. "Um sistema que, como o dos perueiros legalizados de hoje, pagasse seguro, impostos e taxas e tivesse vistoria." Para ele, todo o sistema de transporte deve ser reestruturado.

Inseguro - "Nao adianta dizer que há espaço para perueiros; nao dá para conviver", garante o diretor-técnico do sindicato das empresas de ônibus (Transurb), Marcelo Marques. "É um veículo inseguro, os donos nao têm compromisso de horário e itinerário."

Segundo o Transurb, hoje a cidade tem 10.300 ônibus contra 18.000 lotaçoes. "Essas peruas até entram nas faixas que seriam exclusivas dos ônibus e pioram o fluxo, com a velocidade média estando agora em 12,5 quilômetros por hora, quando era de 18,95 km/h em 1995."

Para ele, os próprios candidatos vao desistir quando o sistema de peruas e vans for regularizado. "Nao vao querer trabalhar à noite, no entrepico, quando cai o número de passageiros, pagar seguro ou salários de mercado." Ele cita o exemplo do acidente de sexta-feira, que deixou três mortos e oito feridos. "Quem vai pagar por eles?"

Mas os passageiros ainda aprovam os lotaçoes. "As pessoas estao indo para as peruas - correndo riscos de acidentes, de ser pegos em blitz e de perder o dinheiro - porque esse tipo de transporte oferece a vantagem de ser mais rápido, ágil e confortável do que os ônibus", diz o professor do Departamento de Engenharia de Transporte da Escola Politécnica (Poli), da USP, Cláudio Barbieri Cunha.

Recuperaçao - Segundo o professor, os coletivos só terao chance de recuperar o público perdido - houve uma reduçao de 6,5 milhoes de passageiros diários para 3,5 milhoes de 1994 a 1999 - quando ganharem velocidade e oferecerem melhor qualidade.

Para o especialista, o sistema de ônibus está envelhecendo e ficando obsoleto e ineficiente. "Nao acompanha a dinâmica da cidade, com suas linhas fixas, de itinerários enormes, enquanto as peruas atendem os deslocamentos dos passageiros conforme a necessidade."

Mas Cunha nao aposta nas peruas e vans como esquema ideal para a cidade. "O trânsito ficaria caótico como em algumas cidades da América Latina que optaram por esse tipo de transporte", alerta. "Elas podem fazer a ligaçao mais próxima, entre bairros e terminais, dependendo da demanda da linha." Mas para ele, teria de haver uma tarifa integrada entre os sistemas de transporte, que pode ser ônibus ou metrô, a partir dos terminais.

Inaceitável - Para o diretor-executivo da Associaçao Nacional dos Transportes Públicos (ANTP), Aílton Brasiliense Pires, nao é aceitável o transporte por peruas, "a nao ser por um ano, no período de transiçao, como opçao complementar". "Elas nao têm janelas ou portas de emergência, os bancos nao sao ancorados e o sistema de freios nao dá conta dessa carga e das várias viagens diárias", afirma. "Transporte é um direito essencial e está sendo tratado como loja de café."

Segundo ele, o Conselho Estadual de Trânsito (Contran), só admite dois tipos de transporte coletivo de passageiros sobre rodas: ônibus e microônibus. "Para aumento da mobilidade, que fez os ônibus perderem os passageiros, os microônibus podem funcionar bem e oferecer o mínimo de conforto." É o sistema que Porto Alegre adotou com sucesso há 20 anos. Hoje sao 403 micros, que transportam 64 mil pessoas por dia, a uma tarifa quase duas vezes maior que a normal. Mas eles oferecem até celular. E os ônibus? "Têm de ser bem diferentes de hoje: decentes."




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