Último Censo do IBGE revela que 98% das perdas de visão ocorrem ao longo da vida; OMS diz que 80% dos casos poderiam ser evitados
A visual é a deficiência mais prevalente entre a população do Grande ABC. Juntas, as sete cidades somam 174.102 pessoas com algum tipo de deficiência – o equivalente a 6,3% dos habitantes. Desse total, 91.355 (3,4%) têm perda parcial ou total da visão, segundo dados do Censo 2022 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados há cerca de um mês. Pessoas com deficiência visual correspondem a 52% do total de PcDs (Pessoas com Deficiência) na região.
No Grande ABC, apenas 2% das pessoas com deficiência visual nasceram cegas. A maioria dos casos está relacionada a doenças que podem evoluir para a perda da visão – algumas irreversíveis, mas muitas evitáveis. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), até 80% dos casos de cegueira no mundo poderiam ser prevenidos com diagnóstico precoce e tratamento adequado.
De acordo com a médica oftalmologista Joyce Farat, o glaucoma é uma das doenças que mais causam perdas de visão irreversíveis, seguido da degeneração macular relacionada à idade e da retinopatia diabética. “A catarata, operando, conseguimos reverter. As demais doenças, se controladas, a perda de visão pode ser evitada. Por isso a prevenção é muito importante. O tratamento de glaucoma, por exemplo, é totalmente custeado pela farmácia de alto custo, que fornece o colírio gratuitamente. Os casos de degeneração macular relacionada à idade, que muitas vezes precisam de aplicação de injeção dentro do olho, também é fornecido pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Então a disponibilidade de tratamento faz com que possamos reduzir muito os quadros de pessoas com cegueira ou baixa visão”, explica.
DESAFIOS
A perda de visão traz uma série de desafios, inclusive nas tarefas mais simples do dia a dia, comprometendo a qualidade de vida. Ainda assim, é possível se adaptar à nova realidade, e a tecnologia pode ser uma grande aliada nesse processo. Morador de São Bernardo, Charles Pedrosa Evangelista, 36 anos, nasceu com uma doença degenerativa incurável chamada distrofia de cones, que provocou a perda gradual de sua visão.
“Descobri aos 18 anos, mas em vez de me abater, decidi fazer faculdade de administração de empresas. Fui atrás de vagas que aceitassem pessoas com deficiência, e de todo conhecimento que poderia ter sobre acessibilidade, algo que se tornou fundamental na minha rotina, nos estudos e no trabalho. Cheguei a trabalhar em seguradoras, corretoras e bancos”, diz.
A realidade vivida pelo administrador de empresas não reflete a de grande parte das pessoas com deficiência. Segundo dados do Censo 2022, o índice de analfabetismo entre pessoas com deficiência é, em média, sete vezes maior do que entre aquelas sem limitações. Além disso, o percentual de PcDs com curso superior equivale à metade do registrado na população sem deficiência. Em cidades como Santo André e São Bernardo, a proporção é de aproximadamente 15% entre PcDs, contra 30% entre pessoas sem deficiência. Em São Caetano, os índices são de 20% e 50%, respectivamente; em Diadema e Mauá, 7% e 17%; em Ribeirão Pires, 9% e 21%; e, em Rio Grande da Serra, 3% e 11%.
TECNOLOGIA
Há dois anos, Charles Evangelista conheceu sua atual esposa, Elaine Cristina de Oliveira, 43 anos, que perdeu a visão em 2019 em decorrência do lúpus. Atualmente aposentada por sua condição, Elaine divide com Charles o perfil @acessibilidadepro nas redes sociais – Instagram, TikTok e YouTube – onde o casal compartilha dicas de como pessoas com deficiência visual podem levar uma vida independente por meio da acessibilidade, com possibilidades reais de estudar e ingressar no mercado de trabalho.
“Para me locomover com independência, uso a bengala, e para acessar o mundo digital, conto com tecnologias assistidas no computador e no celular. Essa paixão por acessibilidade me fez querer compartilhar tudo que aprendo. Por isso dou dicas e troco ideias sobre o tema nas redes sociais. Mostro minha história e como transformei obstáculos em oportunidades. Descobri como enxergar o mundo de muitas formas, sempre buscando ser o mais independente possível”, afirma Evangelista.
A tecnologia na palma da mão também os guia no mundo físico. Charles e Elaine mantêm uma vida social ativa e conseguem circular pelas ruas de São Bernardo, onde moram e de outras cidades, durante viagens, com a ajuda de aplicativos de localização que fornecem, por áudio, orientações espaciais e o trajeto a seguir. O uso de carros por aplicativo também facilita a locomoção do casal.
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