Número cresce ano a ano, e estrutura busca acompanhar demanda para garantir educação inclusiva a estudantes
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O Grande ABC teve, ao menos, 7.957 alunos autistas matriculados na rede pública em 2024. Nas escolas municipais foram 6.091. São Bernardo recebeu 2.648, seguida por Santo André (1.700), São Caetano (826), Mauá (500), Ribeirão Pires (362) e Rio Grande (55). Já as escolas estaduais nas sete cidades somam mais 1.866.
Estima-se que mais de 8.000 crianças e adolescentes diagnosticados com TEA (Transtorno do Espectro Autistas) frequentaram a escola regular da rede pública da região, pois os dados não incluem Diadema, que informou apenas o número total de alunos com alguma deficiência – 1.870. Ainda assim, verifica-se um crescimento de cerca de 40% em relação a 2022, quando a rede pública das sete cidades tinha 5.378 estudantes com laudo de TEA.
Os números são reflexo do aumento da busca pela inclusão. A Lei Berenice Piana nº 12.764/2012 determinou que é crime negar a matrícula de crianças com TEA em qualquer escola. O objetivo é inseri-las na sociedade e estimular seu desenvolvimento e independência. É o que aconteceu com Heloísa, 8 anos, diagnosticada com TEA. Ela chegou aos 4 anos na Emeief Luiz Gonzaga, em Santo André, ainda com pouca verbalização e necessidade de bastante apoio.
Aline Faria, Paei (Professora Educadora de Educação Inclusiva) na escola de Heloísa, conta que, no início, não conseguiam nem oferecer alimento para a aluna. “Foi um desafio para todos nós. Ela precisava de suporte o tempo todo. Hoje, é totalmente autônoma e acompanha a turma regular, sem necessitar de plano individualizado”.
Alunos autistas são avaliados caso a caso em suas necessidades e geralmente possuem um Paee (Plano de Atendimento Educacional Especializado). Alunos com algum tipo de deficiência, além das aulas regulares, podem ter atendimento no contraturno, realizados nas chamadas salas de recursos. Nesse espaço, recebem acompanhamento individual ou em pequenos grupos para auxiliar no processo de aprendizagem.
A educação inclusiva permite grandes avanços em crianças e adolescentes com TEA. Entretanto, é necessário um conjunto de suportes que nem todos podem ter. A mãe de Heloísa, Jaqueline Pengue Fernandes, 41, consegue dar um tratamento completo, além do que a escola pode oferecer. “Ela faz terapia toda semana, mas pelo convênio particular. Conheço outros pais que dependem da rede pública e os filhos só conseguem 30 minutos quinzenais de terapia. É muito pouco”, avalia a mãe atípica, que lidera um movimento social de mães de crianças atípicas de Santo André no Comdef (Conselho da Pessoa com Deficiência).
A diretora da Emeief Luiz Gonzaga, Terezinha Babichaka Squiavoni, ressalta a importância de todo esse suporte na saúde e a participação da família para que as crianças atinjam bons resultados. “A escola não consegue fazer tudo sozinha e aqui também não temos toda rede de apoio que precisamos. Necessitamos de mais profissionais. Existem salas em que de 28 alunos, três são diagnosticados com TEA”, afirma.
Terezinha revela que, além de empenho, usa criatividade para driblar as limitações, pois apesar de a estrutura ter evoluído, o número de autistas nas escolas tem crescido e fica difícil dar conta de toda a demanda.
Muitos pessoas com espectro possuem sensibilidade sensorial, e a escola costuma ser um lugar barulhento. A consequência disso é que os alunos podem, de repente, no meio de uma aula, entrar em crise. Terezinha então teve a ideia de criar um espaço para acolhê-los adequadamente. “Foi em 2021, quando estávamos retornando no pós-pandemia e eu estava preocupada com a defasagem na socialização que essas crianças teriam”, explica.
Ela realocou recursos para viabilizar a construção de sala sensorial com estrutura para acalmar as crianças. Lá, acompanhadas por profissional especializada, elas podem deitar em rede que simula a posição fetal, envolvendo-as como num abraço, ou brincar em atividades como escalada e a piscina de bolinhas iluminadas.
Vereador em São Bernardo, Julinho Fuzari (Cidadania) concorda que ainda há muito a evoluir. “A sociedade ainda está em um ritmo lento, mas já demos o pontapé inicial”, diz. Autor de diversos projetos de lei em favor da causa, ele ressalta a importância dessa estrutura e do acolhimento na rede regular de ensino para o desenvolvimento dos alunos com TEA. “O tratamento pode desenvolver autonomia da criança no futuro. Ela pode evoluir de um nível 2 de suporte para 1. Caso contrário, ela irá regredir e vai depender do Estado”, ressalta.
Uma longa jornada de resiliência teve Patrícia Boscatto, 48 anos, mãe de Isadora, 16, que concluiu, em 2024, o ensino fundamental na Emef Oscar Niemeyer, em São Caetano. Ela tem múltiplos diagnósticos – nasceu com Síndrome de Down e, aos 9, foi diagnosticada com TEA. Também tem TDAH, TOD e fissura lábio palatina, que contribuiu para seu atraso na fala. “A Isadora é uma criança com hiperatividade, e como demorou para desenvolver a fala, a forma que encontrou para se expressar foi tocando as pessoas. Só que de forma agressiva. Então, ela puxava cabelo dos colegas, dava tapa”, conta.
Isso gerou resistência nos pais de outros alunos, que insistiam que ela deveria colocar a filha em escola especial. Patrícia lutou pelo direito da filha de estar em colégio regular, aprendendo a conviver em sociedade mesmo com todas as suas limitações. E encontrou na rede pública o acolhimento que não teve em instituições particulares.
“Fomos condicionando ela a ficar sentada. Ela ficava sentada no chão na escola, hoje senta na cadeira. Os professores também foram entendendo como ela agia. Ainda está em fase de alfabetização por causa dessa dificuldade, mas evoluiu muito. Já consegue ir ao shopping. Antes precisava tapar os ouvidos”, diz a mãe.
A professora de Isadora, Patricia David, que é Formadora da Educação Especial – Cecape, explica recursos usados para facilitar a aprendizagem de alunos com múltiplas excepcionalidades. “Se o estudante tem dificuldade de se comunicar, utilizamos um App que faz sua voz, ou prancha de comunicação. Se tem dificuldade para aprender, avaliamos se o uso de imagens vai ajudar, se ele precisa de uma rotina. Se não consegue usar caderno com linhas, mudamos as aulas para o computador”, exemplificou.
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