No carrinho, concebido exclusivamente para comodidade e transporte de bebês, a criança seguia, alheia ao movimento ao seu redor. Também não lhe importava quem a conduzia. Somente seguia pelo caminho previamente traçado por papai e mamãe, que não podia ser outro senão os corredores de um shopping, destino aprazível para um fim de semana frio. Local onde luzes, cores e aconchego imperam como forma de atrair um sem fim de pessoas, presas fáceis dos bancos e seus, cada vez mais, atraentes cartões.
O veículo que transportava, com algum conforto, o rebento era o mesmo projetado há décadas, à exceção de algumas mudanças que não se configuram exatamente um avanço tecnológico dos mais notáveis. Afinal, tratava-se de um carrinho de bebê, tão somente.
O que me chamou a atenção, entretanto, foi um aparato que a tecnologia se esmerou em criar, aperfeiçoar e colocar em mãos cada vez mais jovens: um aparelho celular. Isso mesmo! Preso a um suporte fixado no carrinho, desses criados para segurar com firmeza esses telefones, havia um com sua tela brilhante repleta de cores. Este exibia animação qualquer para entretenimento do sujeito de olhar fixo nos movimentos, aparentemente hipnotizado também pelo som irritante que partia da máquina.
Meus olhos, que vagavam aqui e ali em busca de inspiração para deitar algumas palavras nesta atraente folha branca, se detiveram na imagem que instantaneamente conduziu meu pensamento à tecnologia e suas mazelas, utilizadas, sem escrúpulos, para seduzir o ser humano e torná-lo refém de suas próprias invenções. Logicamente que poucos se dão conta disso, sobretudo, os que apresentam a coisa para um bebê que ainda não completara um aninho de vida. Bem diferente das crianças, pouco mais velhas, que tenho visto com seus celulares em carrinhos de supermercados, por exemplo.
Vejo, pois, com alguma apreensão a realidade que ora se descortina, uma vez que é notória a dependência cada vez maior das telas, principalmente, dos celulares, objeto que é possível carregar, com facilidade, para toda parte. É assim que pessoas de diferentes idades se entregam de corpo e alma à magia da tela do aparelho que não tem descanso. Destaque para o fato de que quanto mais jovem, maior é o apego pelos produtos oferecidos pela rede que, caprichosamente, transformou o telefone celular em smartphone.
Tenho lido muito, diga-se de passagem, sobre os prejuízos que esse vício vem trazendo às pessoas, sobretudo, àquelas que mal deixaram os cueiros. Gente, desde cedo, privada de hábitos como a leitura, relações pessoais cara a cara, brincadeiras a céu aberto...
Com relação ao bebê, para quem fora apresentado o celular, só se espera dele uma dependência prematura da tecnologia que logo lhe apresentará as redes sociais, os vídeo-games e sabe-se lá o que mais, já que é possível esperar de tudo com a evolução dos aparatos tecnológicos, que se dá em ritmo exponencial.
E passar a vida mergulhado nesse agradável e fácil universo virtual é tentação que não poderia resultar noutra coisa, senão numa mente preguiçosa com extrema dificuldade no trato com o pensamento, uma vez que se habituara à conversa mole e aos conteúdos que privilegiam banalidades e ideias frívolas.
Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André.
É professor e autor do blog cafeecronicas.com
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