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‘Vivemos a maior queda de homicídios dos últimos 25 anos’
Gabriel Gadelha
Especial para o Diário
30/09/2024 | 07:51
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FOTO: André Henriques/DGABC

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Coronel Cássio Araújo de Freitas é o atual comandante-geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo, com trajetória que começou em 1989. Natural de Mauá e com passagens por várias cidades do Estado, incluindo a Baixada Santista e a Região Metropolitana de São Paulo, ele assumiu o comando da corporação em fevereiro do ano passado com o foco no combate ao crime organizado e na valorização dos policiais. Sob sua liderança, houve um reforço no treinamento dos agentes para lidar com as decisões imediatas exigidas na rotina da profissão. Freitas destaca ainda a adoção da tecnologia no dia a dia da corporação.

RAIO X

Nome: Cássio Araújo de Freitas
Estado civil: Casado
Idade: 54 anos
Local de nascimento: Mauá
Formação: Bacharelado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, Administração e Educação Física
Profissão: Policial militar
Hobby: Corrida
Local predileto: Paranapiacaba, em Santo André
Livro que recomenda: Bíblia
Personalidade que marcou sua vida: Clint Eastwood (ator e cineasta norte-americano)
Time do coração: Palmeiras

Como iniciou sua trajetória dentro da Polícia Militar?

Eu tinha um tio que era policial. Ele foi a pessoa que me falou sobre a polícia, então eu já conhecia sobre a instituição. Passei no concurso para oficial da polícia em 1986, mas queria ir para aeronáutica. Depois, quando amadureci, achei que o melhor caminho era a Polícia Militar de São Paulo, e ingressei oficialmente em 1989. Eu sou apaixonado pela PM, pelo o que ela realiza para a sociedade. Entendemos o nosso trabalho, e isso está alinhado com o que eu gosto e aprendi. Sou nascido em Mauá, tive minha infância também em Santo André.Quando me formei aspirante fui para o 10° Batalhão (Santo André) e tive um período muito bom da minha vida. Na época, o Batalhão era grande, servia quase metade da região: Santo André, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. Tive a oportunidade de trabalhar com grandes amigos lá, e amadureci muito. Depois do Grande ABC, fui morar em outros lugares de São Paulo, morei muitos anos em Sorocaba, e então fui trabalhar na Capital, e estou até hoje.

Como recebeu o convite para ser o novo comandante-geral da PM do Estado de São Paulo? 

Primeiramente, foi uma honra. Eu vinha fazendo um trabalho que estava gostando muito. Comandei por três anos a Baixada Santista, e depois vim para a Região Metropolitana de São Paulo. Para a polícia, a Região Metropolitana é a Grande São Paulo, exceto a Capital. Existe um comando que faz só essa região do Estado, e eu estava nesse comando quando fui convidado. É óbvio, ficamos muito orgulhosos, mas ao mesmo tempo, é muita responsabilidade. Nós estamos diante de uma polícia que é uma das maiores do mundo. Na América Latina, não tem nenhuma maior. São 80 mil policiais, e deveríamos ser até mais. Não é nenhum desejo de gigantismo, o nosso desejo é ter gente para atender à demanda. O formato da legislação brasileira, da Lei de Execução Penal, o desenho da Justiça brasileira faz com que você precise de muitos policiais na rua para evitar o crime. Nós somos 80 mil homens e damos conta do recado, não tenho nenhuma dúvida sobre isso, os indicadores estão aí para provar.

Quais foram os principais desafios que o senhor observou desde que tomou posse?

Separo em dois eixos. Um deles para dentro da instituição, da valorização do nosso profissional de polícia. Eu acredito que não só a instituição em si, mas acho importante que o governo estadual e a própria sociedade também valorizem o trabalho do policial E não existe corporativismo nisso. O policial enfrenta a criminalidade, às vezes, em situação desfavorável. O segundo eixo, para fora, é enfrentar sem medo tudo que ameaça a ordem e a legalidade de São Paulo. Tenho um foco latente com relação à criminalidade organizada, que é a máquina por trás do crime de rua. Alguns anos atrás, fizemos uma sequência de operações e identificamos um pequeno crescimento nos índices de roubo de carro na região do Grande ABC. Então, montei uma sequência de operações por lá. Com isso, essas ações reduziram em torno de 26% o número de roubos, um percentual alto. Menos pessoas no (Grande) ABC tiveram seus carros roubados e a vida em risco por causa de criminosos.

Desde que assumiu essa nova função, quais foram as principais mudanças realizadas no seu comando? 

Posso pontuar que o combate ao crime organizado ficou mais técnico. Esse combate é sistêmico, envolve várias instituições, e a gente tem que saber explorar isso. Também está ligado a não permitir que o crime tenha áreas, que tenha territórios. Em alguns lugares onde isso acontece, a população é submetida a um estado de quase escravidão. O crime organizado quer vender o botijão de gás, vender passagem de mototáxi, quer ser o dono do mercadinho. Então, as pessoas que moram nesses locais se tornam reféns. Em São Paulo, não temos isso, mas é trabalho da PM paulista para que não aconteça. Nós tivemos uma mudança também no que diz respeito ao treinamento dos policiais. Aumentamos a carga. Existe uma grande diferença entre saber o que tem de ser feito e o que você consegue fazer. O policial militar é de todas as autoridades, no ambiente municipal, estadual e federal, responsabilizado por suas decisões. Além de ser responsabilizado pelas suas boas ou más, principalmente as más decisões, ele tem que tomá-las de forma imediata, não pode sentar e estudar o caso de modo detalhado. Isso muda tudo. Aumenta o risco do policial, o risco à integridade física e de ter problemas legais no futuro. Logo, precisamos dar sempre o treinamento de manutenção e respaldo para o policial que trabalha na rua. Eu preciso trabalhar para o meu soldado para que ele consiga cumprir as missões, que não são fáceis.

Atualmente, qual crime causa mais dor de cabeça para a Polícia Militar e quais esforços estão sendo feitos para o combate?

A Polícia Militar trabalha com uma gama de muitos delitos. Elencamos delitos que vão dar os indicadores criminais. Mas o crime mais importante é o homicídio. Atuamos fortemente nas áreas onde se tem mais homicídio, e roubo também. Porém, um ponto que podemos exaltar sobre isso é que vivemos a maior queda de homicídios dos últimos 25 anos e ela está abaixo de algumas cidades importantes dos Estados Unidos. Isso é fruto do trabalho da polícia, porque se você deixar à vontade, o criminoso vai cometer crime. Por isso trabalhamos 24 horas, nunca alguém irá ligar 190 e vai ouvir um recado falando: ‘Hoje é feriado, a polícia não está trabalhando’. Sabemos que temos que trabalhar.

Em relação ao embate de sensação de insegurança versus a queda nos números de crimes. Como mostrar para a população que o trabalho da polícia está gerando resultado?

Com informação de qualidade. São números. Os homicídios caíram, é fato. Cada ocorrência nossa tem local, data e hora, não é algo fictício. Estamos levando os números, estamos falando de comparativos. São dados que o cidadão pode encontrar nas redes sociais da Polícia Militar. As notícias ruins parecem que têm asas próprias, as boas, nem tanto. Mas isso faz parte do cenário e eu entendo e respeito. O cidadão, devagarzinho, vê os resultados nas ruas, eu sei que vê. Acredito que com o passar do tempo, as pessoas notem as prisões que estamos fazendo, os grandes números, os atendimentos e a agilidade. Tenho certeza que a percepção da população vai estar equilibrada com a realidade.

O governo investiu ao longo de 2023 cerca de R$ 640 milhões na compra de equipamentos para reforçar as polícias do Estado. Como este investimento auxilia a PM no combate à criminalidade?

O investimento é muito importante. Estamos em uma luta para não termos mais policiais trabalhando a pé, porque ele perde efetividade. Quando há investimento, compramos e entregamos mais viaturas, o policial tem mais ferramentas de trabalho. Falando de tempo-resposta, quanto menor o intervalo de reação, maior o impacto na segurança da cidade, porque o criminoso fica com medo de cometer crimes, as janelas de oportunidades para ele começam a se estreitar. Fizemos a compra de mais de 1.000 motos recentemente. A moto facilita muito a chegada rápida da polícia, o criminoso sabe disso, e irá evitar roubar ou outro tipo de violência.

Em agosto, o senhor assinou a homologação do contrato de 12 mil câmeras corporais da Polícia Militar. Como o senhor avalia e o que pensa sobre o uso destas câmeras?

Temos de desmontar dois mitos que não foram criados dentro da Polícia Militar. Primeiro, as câmeras foram uma ideia da própria instituição há mais de dez anos, e em nenhum momento a polícia quis acabar com as câmeras. Por outro lado, ela não é a protagonista da nossa estratégia, o protagonista é o profissional, que eu tenho que investir, treinar, motivar e criar condições para essa pessoa trabalhar. Nunca colocamos o protagonismo nas câmeras. Desde janeiro de 2023, mantivemos os contratos das 10.125 câmeras, mas esses contratos começaram a vencer, e precisei fazer novas licitações. A polícia faz uma licitação muito técnica, correta e transparente, e ficou menos da metade do preço que estava sendo pago. Então, ponto positivo para o recurso público, para a defesa do seu imposto. Aumentamos o número para 12 mil câmeras. Então, a Polícia Militar é a favor das câmeras. Faz parte de um sistema que é muito mais amplo e muito mais moderno, algo de países de primeiro mundo. Não é só a câmera do policial que importa. Somos a polícia do Brasil que mais utiliza drones, também temos câmeras que estão nos perímetros e as câmeras das viaturas voltadas para a rua. Estamos com uma licitação de mais de 3.000 viaturas para colocar câmeras com objetivo de fiscalização. Então, saio desse universo restrito da câmera corporal, que permanece, mas vou para algo mais profissional. A câmera é importante, mas não é a dona da festa, como alguns quiseram colocá-la. Está dentro de um sistema maior, que envolve essas infraestruturas e envolve inteligência artificial também.




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