A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu nesta segunda-feira, 1º, que o ex-presidente Donald Trump tem direito a receber imunidade parcial no processo em que ele responde na Justiça americana por tentar obstruir a última eleição. A decisão anunciada em pleno auge da campanha deste ano expandiu de maneira vasta os poderes de um presidente americano.
Vista como uma vitória para Trump, o entendimento da Suprema Corte determina que ex-presidentes dos EUA têm imunidade em atos oficiais, mas não em ações pessoais do período em que ocuparam a Casa Branca. Isso deve atrasar os julgamentos de Trump no momento em que ele tenta voltar à presidência.
Na prática, significa que a juíza federal de Washington Tanya Chutkan, responsável pelo caso de Trump, terá de realizar audiências sobre as queixas apresentadas pelo procurador especial Jack Smith ao denunciar o republicano pela tentativa de reverter a derrota para Joe Biden na eleição de 2020.
As audiências devem comparar atos oficiais de Trump enquanto presidente, portanto passíveis de imunidade, e aqueles que dizem respeito à sua conduta pessoal.
O tribunal de Washington levará tempo não só para realizar as audiências como também para prepará-las, o que torna improvável que Trump volte a ser condenado antes das eleições. Em maio, ele se tornou o primeiro ex-presidente dos EUA a ser condenado criminalmente depois de ser considerado culpado por falsificar registros financeiros.
Em caso de vitória nas eleições presidenciais de novembro, Trump poderia ordenar ao Departamento de Justiça que derrube as acusações federais contra ele ou até mesmo conceder perdão a si mesmo.
"Trump não vai ser julgado até as eleições", avalia o cientista político Carlos Gustavo Poggio, professor no Berea College do Kentucky.
"Vai se tornando cada vez mas difícil sustentar as acusações que são feitas contra ele, porque o que a Suprema Corte tem feito é estreitar a interpretação desses crimes, muitos deles inéditos", acrescentou. O professor se referia à decisão anterior do tribunal, que limitou o escopo da lei usada contra centenas de réus pela invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021, incluindo o próprio Donald Trump.
Cédulas
Em outro julgamento que teve resultado favorável ao líder republicano, a Suprema Corte decidiu de forma unânime que os Estados não podem desqualificar candidatos para eleição nacional. Com isso, reverteu a decisão do Colorado, que havia considerado Trump inelegível pelo ataque ao Capitólio com base no dispositivo criado após a Guerra Civil para impedir que pessoas envolvidas em "insurreição" ocupassem cargos públicos. O Estado vetou seu nome nas cédulas.
Trump postou em sua rede social logo após a decisão ser divulgada ontem: "Grande vitória para nossa Constituição e democracia. Orgulhoso de ser americano!"
Rapidamente, a campanha de Trump à reeleição passou a enviar e-mails para angariar fundos. "Atos oficiais não podem ser processados ilegalmente - grande vitória para a democracia e nossa Constituição!", dizia um deles, em letras maiúsculas.
Acusações
A decisão de ontem remonta ao julgamento do caso contra ele por acusações de conspiração para tentar subverter o resultado da eleição de 2020.
Ao entrar com o recurso, Trump argumentou que tinha direito à imunidade absoluta das acusações, baseando-se em uma ampla interpretação da separação dos poderes e um precedente da Suprema Corte, de 1982, que reconheceu tal imunidade em casos civis para ações tomadas por presidentes dentro do "perímetro externo" de suas responsabilidades oficiais. Tribunais inferiores haviam rejeitado a alegação.
'Rei acima da lei'
Na sentença, de 119 páginas, a Suprema Corte destacou o ineditismo do julgamento. "É o primeiro processo criminal de um ex-presidente por ações tomadas durante a sua presidência na história da nação", afirma o documento, ao justificar que era necessário avaliar o escopo do poder presidencial para determinar se o caso pode avançar.
"Um ex-presidente tem direito à imunidade absoluta contra processos criminais por ações dentro de sua 'autoridade constitucional'", concluiu a sentença para, em seguida, ponderar que "não há imunidade para atos não oficiais".
O resultado favorável a Trump na Suprema Corte por seis votos a três refletiu a divisão do tribunal, que tem maioria de seis juízes conservadores, sendo três deles indicados pelo próprio Trump, e três liberais.
O voto contrário afirma que a maioria conservadora transformou a figura do presidente em "rei acima da lei". A juíza Sonia Sotomayor, da ala liberal, expressou a divergência em um discurso com tons dramáticos. "Como nossa Constituição não protege um ex-presidente de responder por atos criminosos e de traição, eu discordo", disse, enfática. "Irônico, não é? O homem encarregado de fazer cumprir as leis agora pode simplesmente violá-las", acrescentou a juíza que, em alguns momentos, balançou a cabeça ao criticar as conclusões da maioria como "totalmente indefensáveis".
Diante da clara divisão dentro da Suprema Corte, Poggio pondera que, embora seja considerada uma vitória momentânea para Trump, a decisão pode ter um impacto político favorável a Joe Biden à medida em que chama atenção para a composição do tribunal.
"Já são seis juízes conservadores. Se Trump for eleito e puder indicar mais juízes, o equilíbrio da Suprema Corte fica muito complicado. Isso traz o tema à tona para eleição", afirma Poggio. (COM AGÊNCIAS INTERNACIIONAIS; COLABORARAM JÉSSICA PETROVNA E CAROLINA MARINS)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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