A apresentação especial aos dirigentes da APJ foi feita pelo presidente da APM, desembargador Carlos Renato de Azevedo Ferreira, e pelo diretor cultural e de eventos da entidade, juiz Marco Antonio Marques da Silva. Segundo Marques da Silva, a finalidade de popularizar o novo Código Civil, que entrou em vigor em janeiro deste ano, nasceu da necessidade de a população tomar conhecimento de seus direitos para poder exercer plenamente a cidadania. "O cidadão precisa entender de forma fácil como ele deve se defender, como estar na sociedade Comunicação é poder", cita o diretor da APM.
A relação entre o cidadão e as normas jurídicas não tem muita proximidade. Mas no caso do Código Civil, não é possível que ninguém saia de casa sem que a lei esteja norteando cada conduta. "O código é a constituição do dia-a-dia do cidadão, o que toca a nossa vida. É compra e venda, família, aluguel, condomínio, animais, casa, relação de bens, nome, herança e outros", definiu Marco Antonio.
Assim, a cartilha veio com o objetivo de eliminar esse complicador. "O vocabulário rebuscado afasta a população da Justiça e afasta o Direito da população. A linguagem direta e objetiva aproxima as pessoas para que elas possam entender o que diz a lei", argumentou.
Para o juiz, em boa medida a responsabilidade pelo distanciamento entre a Justiça e o cidadão está no excesso de formalismo dos operadores do Direito. "Grande parte das confusões e das discórdias quanto ao direito do cidadão se dá na questão da interpretação. O cidadão precisa entender as leis e as sentenças", avaliou.
O próprio integrante do Judiciário apontou para a necessidade de eliminação dos ruídos existentes na semântica jurídica. "O conteúdo se perde pela forma. O juiz tem que escrever na forma mais simples, porque a sentença é do povo, não é do Judiciário, nem do jurista", opinou Marques da Silva.
Constituição – A APM congrega todos os magistrados do Estado de São Paulo. Na avaliação do presidente da entidade, desembargador Carlos Renato de Azevedo Ferreira, a cartilha tem relação direta com o lema da entidade: "Se queres, pode". Ele comentou que "um dos pontos centrais da academia é a aproximação com o povo, além de discutir temas acadêmicos. O povo é o grande destinatário da norma jurídica". Ele reforça a importância do CCB. "O jurista Miguel Reale já dizia que o Código Civil é a constituição do indivíduo porque regula todas as suas atividades diárias. Como a interpretação do código não é acessível à população, a APM editou esta cartilha para levar o conteúdo da lei ao povo com linguagem informativa".
Para Ferreira, nem o fato de o Brasil ainda contar com 15,5 milhões de analfabetos ofusca o projeto de aproximação do cidadão às leis. "Dá as populações das cidades de São Paulo e Belo Horizonte juntas só de analfabetos no País. É impressionante. Mas nós acreditamos na velha história de que não adianta dar o peixe, é preciso ensinar a pessoa a pescar. Se dermos o instrumento para o povo ter acesso, mesmo que ele ainda não consiga ler, alguém do seu meio conseguirá", ponderou.
O código revogado no ano passado era de 1916. A gestação do novo CCB começou no Congresso Nacional, em 1962. Mas sua alteração só começou a ser efetivamente discutida no início dos anos 70. Desta forma, o magistrado considera natural que as leis surjam sem condições de acompanhar o ato e o fato social. "O código não incorpora a discussão sobre credo religioso, mas também não incorpora a concepção in vitro, a clonagem, os serviços da internet. Isso é normal. A lei nunca vai conseguir acompanhar a mobilidade social. Ela é mais rápida que o avanço das leis", lembrou.
O presidente sustentou que cabe ao Judiciário padronizar decisões. "Estabelecer regra para determinadas sentenças sobre um mesmo fato é um papel da jurisprudência. Muitos temas não serão transformados em norma na minha geração. Mas é a aplicação da lei que vai gerar a jurisprudência", completou.
Na outra ponta desta relação jurisdicional, Azevedo Ferreira defendeu a edição de súmulas para algumas matérias. "Sempre fui a favor da súmula vinculante para as causas do Poder Público. 95% das causas na Justiça Federal têm como protagonista o Poder Público, em geral para procrastinar (adiar)".
Ele completa o raciocínio se dizendo favorável à alteração do regime processual para que causas com o mesmo conteúdo possam ser julgadas de forma padronizada. "Os personagens de milhares de ações são diferentes, mas muitos conteúdos são idênticos. Essa alteração agilizaria, e muito, a Justiça."
Na outra ponta do sistema, porém, está a antiga fragilidade da estrutura física do Judiciário brasileiro. "A Alemanha tem 160 milhões de habitantes e 80 mil juízes. O Brasil tem 170 milhões de habitantes para 15 mil juízes. É impossível cumprir justiça na plenitude com essa situação material, física", criticou.
Por fim, o desembargador ressalta que o "Judiciário ainda é o último sustentáculo ao acesso do cidadão. Mas cabe a nós reduzir as distâncias".
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