Internacional Titulo
Destino dos EUA está indefinido
José Antonio Pedriali
Especial para o Diário
04/11/2000 | 19:58
Compartilhar notícia


O democrata Al Gore versus o republicano George W. Bush: o destino dos Estados Unidos - e conseqüentemente do mundo, para contrariedade de muitos - estará nas maos de um deles a partir do ano que vem, sem que, às vésperas das eleiçoes de terça-feira, seja possível prever com segurança sobre qual dos dois recairá a escolha dos norte-americanos. Ralph Nader e Pat Buchanan também estao no páreo, mas sem a mais remota chance de vencê-lo.

A escolha do sucessor do presidente Bill Clinton, se prevalecer a lógica, recairia certamente sobre Gore, o vice-presidente, pois nos últimos oito anos de governo democrata os EUA experimentaram um dos períodos mais prósperos e tranqüilos em matéria de política externa de todos os tempos.

A hegemonia mundial norte-americana tornou-se inquestionável após o desmantelamento da Uniao Soviética e os indicadores macroeconômicos do país nao param de crescer. A inflaçao do ano passado, de 1,9%, foi a menor desde 1965 e a taxa de 6,4% de desempregados é a mais baixa dos últimos 30 anos.

A decisao, no entanto, é mais complexa e envolve questoes domésticas como o direito ao aborto e à posse irrestrita de armas, o poder de o Estado intervir ou nao em assuntos econômicos, seguridade e assistência social e política externa.

E quando se fala em política externa, mesmo em tempos de paz - quando prevalecem os interesses econômicos sobre os estratégicos -, os norte-americanos se dividem sobre a participaçao ou nao de seus soldados em conflitos fora de suas fronteiras.

As posiçoes de Gore e Bush sobre esses temas sao claras e às vezes muito próximas umas das outras, e o equilíbrio entre as duas candidaturas às vésperas da eleiçao revela o quanto a sociedade norte-americana está dividida frente a essas questoes.

Bush, filho do ex-presidente George Bush e em seu segundo mandato como governador do Texas, iniciou a corrida eleitoral na frente de seu adversário, foi superado por ele no início do mês passado, recompôs-se após três cruciais debates na tevê e fez com que Gore lançasse mao de todos os recursos possíveis para convencer o eleitor de que votar no republicano seria um "salto no escuro" que poderia pôr a pique o fabuloso transatlântico em que se transformou a economia norte-americana.

Uma campanha de difamaçao foi lançada contra Bush - que a revidou sem pestanejar - na última semana, na qual nao faltaram referências à morte, por falta de assistência médica, de um paciente no Texas e o apelo, sobretudo às mulheres, para que nao permitam o recuo em matéria de direito ao aborto.

Esta é uma possibilidade caso Bush ganhe, porque dois ou três membros da Suprema Corte, tribunal de máxima instância ao qual compete a decisao sobre temas constitucionais, deverao ser substituídos no mandato do próximo presidente - e é ele quem escolhe os juízes, que só deixam seus cargos quando morrem ou se aposentam voluntariamente.

Se a economia dos EUA está de vento em popa, por que a relutância dos eleitores em apoiarem francamente Al Gore? Os dois candidatos têm graves defeitos, mas é sobre Gore que recai a maior cobrança por um bom desempenho eleitoral, que ele nao tem conseguido demonstrar.

Gore foi forjado para assumir a Casa Branca, missao que lhe foi atribuída pelo pai, o senador Albert Gore, e desde a infância se prepara para ocupar o Salao Oval, escritório do presidente dos EUA. Como vice-presidente, ele se notabilizou pela fidelidade a Clinton no momento mais tenso da atual administraçao democrata - o escândalo Monica Lewinsky - e por ter assumido mais funçoes do que nenhum outro vice-presidente da história.

O que está faltando a Gore é empatia com o eleitor. O escritor Joe Klein resumiu para o The New Yorker as principais falhas de Gore: "sua personalidade, a propensao ao exagero, suas mudanças de estilo, sua pomposidade e sua arrogância". "Os óbvios pontos fortes do vice-presidente - experiência, moderaçao e inteligência - se perderam no processo", disse Klein.

A situaçao de Gore é tao dramática que, na reta final da campanha, ele apelou para o "voto útil", pedindo aos eleitores de Ralph Nader, do Partido Verde e com 5% das intençoes de voto, que deixassem de votar em seu candidato para votar nele e, assim, impedir a vitória de Bush. "Nao gosto do argumento de que votar em Nader é votar em Bush, mas creio que é verdade", disse.

Na realidade, Nader - que se notabilizou pela defesa dos direitos do consumidor - poderá se converter no fiel da balança desta eleiçao, pois seus votos, ou os que forem transferidos dele para Bush ou Gore, serao decisivos na definiçao do próximo presidente. Nos Estados de Oregon e Washington, onde Gore está enfraquecido, os republicanos estao pedindo aos eleitores de Nader que nao mudem seu voto, pois, argumentam, sao os democratas que representam a maior ameaça ao meio ambiente.

Para ajudar seu colega de governo, Clinton arregaçou as mangas. Ele estava de braços cruzados deste o início da corrida eleitoral - nao por vontade própria, mas a pedido insistente de Gore, que queria desvincular sua imagem da do presidente, abalado pelo escândalo Lewinsky. Clinton fez sua estréia como cabo eleitoral terça-feira à noite em uma igreja do Harlem, em Nova Iork, e perguntou, sem meios tons: "Querem os eleitores abandonar a atual política econômica? O povo norte-americano deveria pensar duas vezes antes de deixar o Congresso e a Casa Branca em maos do Partido Republicano".

A ida ao Harlem foi meticulosamente escolhida e revela a missao reservada ao presidente: a de reforçar a campanha de Gore junto à comunidade afro-asiática, pois aquele bairro é habitado majoritariamente por negros. Outra tarefa à qual Clinton vem se dedicando desde meados da semana passada é pedir votos para Gore na Califórnia, tradicional reduto democrata ameaçado pelo crescimento da candidatura de Bush.

"Nao posso ser neutro nesta batalha", sentenciou Clinton.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;