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Cacciola nega ter informantes no BC
Do Diário do Grande ABC
13/05/1999 | 12:58
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Já dura mais de duas horas o depoimento do dono do banco Marka, Salvatore Cacciola, na CPI que apura irregularidades no sistema financeiro.

O banqueiro chegou por volta das 9h50 na Casa e nao quis dar entrevistas (a sessao começou às 10h40). Apresentava tranqüilidade. Ele assinou o termo de compromisso da CPI e fez, durante a primeira meia hora, suas consideraçoes iniciais. Ele disse que, desde que se envolveu nesse caso, nunca recusou prestar qualquer depoimento. Falou também que está disposto a esclarecer todas as dúvidas dos senadores, mas que antes nao poderia deixar de expressar sua indignaçao. "Estou indignado com a leviandade das acusaçoes da imprensa e do Ministério Público do Rio de Janeiro", afirmou.

Logo em seu relato inicial houve um princípio de tumulto promovido pelo senador Roberto Requiao. Ele afirmou que Cacciola nao poderia ler suas consideraçoes inicias como estava fazendo e sim falar de "livre e expontânea vontade". O presidente interino da CPI, José Roberto Arruda, acatou a sugestao de Requiao e pediu para que Cacciola "parasse de ler o relato". O dono do banco Marka afirmou entao que seguiria a recomendaçao, mas que no início leria apenas alguns trechos e que 90% de sua exposiçao inicial seria de improviso.

Cacciola fez um breve histórico do Marka e informou que foi fundador do banco em 1972 e, segundo ele, um ano depois o Banco Marka se tornou dealer do BC na sua especialidade que era tesouraria e open-market. Ele disse que, dos 32 anos em que está no mercado financeiro, 28 foram na direçao do Banco Marka. Cacciola afirmou que o banco deixou de ser dealer, mas continuou atuando nas áreas de open-market e tesouraria. Segundo Cacciola, até o fim das operaçoes do banco, o Marka tinha 1.300 clientes pessoas físicas e 50 clientes pessoas jurídicas. O banco sempre teve bom conceito entre os parceiros do mercado e seus clientes, segundo Cacciola, e era respeitado no mercado financeiro em sua especialidade que era o mercado aberto. Ele disse que o banco nos últimos anos passou por todas as crises, desde o confisco do entao presidente Fernando Collor, às crises do México, Asia e Rússia, conseguindo superá-las com bom resultado.

Ele explicou que em janeiro praticamente nao havia vencimentos de títulos da dívida externa brasileira, o que diminuía sensivelmente as pressoes sobre o câmbio elevou o Marka a acreditar que nao haveria desvalorizaçao. Segundo Cacciola, a liquidez do câmbio era a base do plano real, a política foi "mais do que defendida na campanha eleitoral do presidente Fernando Henrique Cardoso" e esteve em cheque em setembro em razao da crise da Rússia quando teve oportunidade de ser testada e checada. Ele ressaltou ainda que o Marka sempre esteve vendido no mercado futuro de câmbio desde o segundo semestre de 94.

Cacciola disse que, depois da crise da Rússia, o governo brasileiro se articulou e a equipe econômica negociou com o FMI. As negociaçoes, segundo Cacciola, só se tornaram públicas em novembro de 98 e culminaram com a assinatura de um memorando de intençoes do dia 8 de dezembro. Esse memorando se tornou público no dia 10 de dezembro e todos tiveram acesso, inclusive ele. Ele lembra que, no memorando, o governo brasileiro assume o compromisso de manter a política cambial, citando o parágrafo 8º no qual o governo informa que a rigidez nas políticas monetária e cambial irao resultar em uma taxa de inflaçao de 2% em 99. Citou também o parágrafo 30, no qual o governo afirma estar inteiramente comprometido em manter a política cambial adotada até entao. Ele informa ainda que as projeçoes do memorando mês a mês mostravam que a desvalorizaçao em 99 seria inferior à de 98.

Além do memorando, Cacciola citou também no depoimento relatórios da empresa de consultoria Tendências, do ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega e do cientista político Sérgio Abranches, ressalvando que nao está transferindo nenhuma responsabilidade a essa consultoria, pois a decisao de apostar na manutençao da política cambial foi dele. Ele citou vários trechos da consultoria Tendências de dezembro de 98, que considerava o acordo com o FMI "uma ducha de água fria nos profetas que previam uma desvalorizaçao cambial até fevereiro de 99". Cacciola também mencionou análises assinadas pelo próprio Maílson da Nóbrega, afirmando que o memorando com o FMI descartava de vez a desvalorizaçao no curto prazo. Cacciola disse também que tinha informaçoes, mas trocou a palavra por dados, com a seguinte expressao: "informaçao nao, pelo amor de Deus, essa palavra nao existe". Esses dados mencionados por Cacciola indicariam que janeiro seria o mês que o país tinha a menor quantidade de compromissos externos e, portanto, a pressao sobre as reservas seria zero. E além disso, o Congresso tinha uma pauta intensa em janeiro com muitas propostas para a provar.

O banqueiro negou ter pago um funcionário do Banco Central (BC) para receber informaçoes confidencias, como divulgou a revista Veja e falou que nunca conversou com nenhum banqueiro estrangeiro, como também publicou a revista. Ele chegou a chamar o repórter da Veja de "mentiroso".

Quanto ao bilhete que escreveu para o ex-presidente do BC Francico Lopes, o banqueiro afirmou que sentiu resistência do ex-diretor de Fiscalizaçao do Banco Claudio Mauch em vender dólar mais barato a eles. "Por isso, eu escrevi o bilhete Francisco Lopes que na época era o presidente do BC", afirmou dizendo que chegou a pensar que Mauch havia pedido demissao devido ao "seu negócio". "Mas ele (Mauch) negou isso aqui na CPI". No bilhete, Cacciola afirmava ainda a Lopes que "esqueceria tudo" se obtivesse dólares a R$ 1,25. Na interpretaçao do senador Pedro Simon (PMDB-RS), "esquecer tudo" seria uma chantagem de Cacciola à Lopes. Cacciola explicou que "esquecer tudo" significava esquecer toda a sua carreira de banqueiro, pois deixaria o mercado. O emrpsário explicou ainda porque pediu, no bilhete a Lopes, a cotaçao de R$ 1,25. Disse que esse valor era exatamente o necessário para pagar todas as dívidas e nao dar prejuízo a ninguém do mercado.

O presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhaes, acompanhou o início da sessao, que nao tem hora prevista para terminar, mas saiu por volta das 12h do plenário sem dar entrevistas.

A CPI pretende ouvir ainda nesta quinta, às 16h30, o depoimento do outro personagem central envolvido na investigaçao sobre a atuaçao do BC (Banco Central) durante a desvalorizaçao cambial: o dono do banco FonteCindam, Luiz Antônio Gonçalves.

Dia Triste - Cacciola disse em seu depoimento que o dia 13 de janeiro foi o dia mais triste de sua vida, quando o banco iniciou o dia com patrimônio negativo. Ele disse que nao havia outra escolha se nao informar o Banco Central e preferiu fazê-lo pessoalmente do que por telefone. Cacciola disse que o preço que pagou para que o Banco Central zerasse as posiçoes do Marka foi realizar uma assembléia transformando o banco em uma instituiçao nao-financeira.

Ele também assumiu o compromisso de liquidar todo o passivo do banco, o que segundo ele já foi feito. Ele disse ainda que todas as operaçoes inerentes ao sistema financeiro também foram encerradas, inclusive a conta reserva. Cacciola afirmou ainda que o banco se encontra hoje em uma situaçao singular. Segundo ele, o BC nao homologou em ata a decisao de transformar o Marka em uma instituiçao nao-financeira, mas ao mesmo tempo, o banco nao tem conta reserva e por isso nao tem conta em outros bancos. Ele disse que está em uma situaçao em que precisa ter a contabilidade em dia, prestar informaçoes ao BC, à Polícia Federal, ao Ministério Público e à CPI mas tem que pagar aluguel, telefone e luz e está com seus bens bloqueados. "Essa é a nossa real situaçao", reclamou Cacciola.




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