Ex-presidente nacional do PT, o deputado federal Rui Falcão reconhece que o cenário está favorável para a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas esse prisma não pode fazer com que o partido entre em euforia e esqueça de se aproximar das bases sociais. O parlamentar disse que a legenda precisa entender que fazer política vai além da eleição. Falcão garante que agremiação está empenhada no impeachment do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), mas que a cassação não é movimento simples de executar. O petista também afirma que a sinalização do Psol de apoio nacional em troca de parceria na corrida ao Palácio dos Bandeirantes é inexequível.
A campanha de 2022 se apresenta como renascimento do PT?
Desde o surgimento, o PT enfrenta campanha atroz, procurando dizer que a gente dividia a oposição, isso ainda no surgimento do partido. Fomos crescendo, elegemos prefeitos, governadores e chegamos à Presidência da República. Mesmo depois do golpe de 2016 (impeachment de Dilma Rousseff, PT), um golpe continuado porque permanece até hoje em várias etapas, ainda em 2018 elegemos a maior bancada do Congresso. Com nível de ataque que sofremos, foi proeza eleger 54 deputados. Por isso, não vejo como renascimento. PT sempre continuou resistindo contra todos os ataques. Com inocência do Lula, que foi vítima de campanha, a Vaza Lato mostrou como os projetos foram manipulados, claro que há um crescimento da esperança. Até pelo que representaram nossos governos. Tem uma consciência muito grande no PT, na direção do PT e na militância de que essa popularidade em torno do Lula e do próprio PT não deve nos levar à euforia. A desprezar o trabalho de base, à reorganização dos territórios, a estar muito ligado nos problemas da população. As palavras de ordem hoje, juntamente com o Fora, Bolsonaro, são vacina no braço, comida no prato, emprego e democracia. São questões importantes nessa retomada do PT, inclusive para que no futuro, se a gente for bem-sucedido nas eleições, se até lá não conseguirmos afastar o Bolsonaro, para nunca mais se esquecer de duas coisas: que a política se faz no cotidiano e não apenas a cada dois anos e que a política tem de estar muito colada na população, no dia a dia, no sindicato, no bairro. Não existe democracia acabada.
Há crítica de parte da esquerda e da direita que o PT não mostra engajamento pelo impeachment de Bolsonaro por conveniência política, já que Bolsonaro seria o adversário ideal para Lula. Como o sr. recebe esse tipo de questionamento?
Falo a meu respeito primeiramente. Tenho feito discursos e tenho um pedido pendente no STF (Supremo Tribunal Federal), que pedi ao (Fernando) Haddad (ex-ministro e ex-prefeito da Capital) subscrever comigo, para que o Supremo mande o Arthur Lira (presidente da Câmara) pautar um impeachment que fiz há um ano. Pedido listando alguns crimes que Bolsonaro praticara naquele período. Não é razoável que o presidente da Câmara seja a única pessoa no País que não tem prazo. Não falo que ele tem de apoiar o impeachment, mas tem de pautá-lo. Com relação a mim não há dúvida de que não é só discurso, há prática. E estou fustigando o Bolsonaro. Ingressei com representação junto ao corregedor-geral do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) sobre campanha antecipada. Tinha feito das motociadas, fiz agora a dos 1.000 dias. Com relação ao PT, teve período inicial que no diretório nacional a maioria não queria o Fora, Bolsonaro. Depois de três meses conseguimos essa pauta e, daí para frente, o PT tem se engajado na campanha pelo impeachment. A situação do País e do Bolsonaro não nos permite fazer avaliação de conveniência eleitoral. Eu discordo disso porque o momento de tirar o Bolsonaro é a hora que ele está mais fraco. Fora desta avaliação eleitoral existe imperativo moral que não devemos deixar o povo esperar mais um ano diante dessa situação que está vivendo. Pessoal buscando osso na porta do açougue, disputando resto de carne no caminhão. Pé de galinha virou alimento básico e subiu 50%. Gás de cozinha a mais de R$ 100. Inflação depois de décadas passando dos dois dígitos. Não dá para fazer esse cálculo eleitoral, de tira ou não tira.
E por que o impeachment não sai?
Ele (Bolsonaro) construiu maioria sólida na Câmara a custa de favores, de cargos, coisa que dizia que não iria fazer por ser da nova política. E com emendas. Tem essa questão do orçamento secreto, com R$ 16 bilhões na mão de um deputado distribuir. Isso já impede que você tenha na Câmara os votos suficientes para cassá-lo. Só mais recentemente a população retomou as ruas, houve arrefecimento da pandemia. Do ponto de vista da viabilidade, não é simples. Mas há outras maneiras de afastar o Bolsonaro. Há processos no TSE, seja para cassar a chapa de 2018 ou tornar inelegível por uso da máquina e antecipação de campanha.
O Lula tem feito conversas com lideranças nacionais que geram muita controvérsia dentro do partido, como o José Sarney. Diante do favoritismo nas pesquisas, é necessário manter vínculo político com essas figuras?
Conversar é papel, não só de candidato, mas de alguém que já foi presidente. É ouvir todo mundo. Ele sempre esclareceu e insiste que o presidente do Brasil não pode ser que nem o Bolsonaro, que é presidente de uma facção, de milicianos, de quadrilha. Ele vai governar Brasil inteiro. Ele tem foco, que são aqueles que mais precisam da presença do poder público e do Estado. Conjunto dos trabalhadores e pessoal que está totalmente desamparado. Esses têm de ser a prioridade do governo. Mas ele não vai deixar de governar para o resto. Precisamos eleger bancada grande do PT e dos partidos que vão apoiar projeto de mudança porque o País está quebrado. Precisa recuperar e transformar o País. Se faz isso com maioria parlamentar e, quando não tem isso, você tem de fazer com que o Parlamento siga o que é maioria social. É por isso que é preciso mobilização social, uma campanha que resulte em organização e não só em voto. Vai colher nas urnas o que plantou nas ruas.
O tema de regulação de mídia já esteve presente em algumas entrevistas do ex-presidente Lula. Voltar a esse debate não é tiro no pé de um candidato favorito?
Nunca falei em regular a mídia nem em regulação econômica. É necessário ter redemocratização de todos os meios de comunicação. Desde a época em que esse debate começou há plataformas novas, como internet, plataformas mundiais. Tenho projeto para pagar pela utilização de conteúdo, um projeto para plataformas remunerem empresas e jornalistas pela apropriação de conteúdo produzido. Tudo isso requer, como em outros países, modificação do que existe hoje. A Constituição disciplina duas coisas que não são cumpridas hoje. É assegurada a mais ampla liberdade de imprensa e de informação. No artigo seguinte, diz que ficam proibidos os monopólios e oligopólios na comunicação. Mas até hoje não tem definição do que é monopólio nem oligopólio na comunicação. Proíbe que políticos detentores de mandatos eletivos sejam proprietários de rádio, TV. Só que oligarquia do Nordeste se reproduz com o controle desses meios. Ninguém mexeu nisso até hoje. A ideia é ter legislação parecida com a dos Estados Unidos, Inglaterra e França. Aqui já temos algo, de certa maneira. O que é orientação de horário para programa infantil? A liberdade de expressão não é absoluta. Não pode fazer propaganda de ódio. A melhor maneira de assegurar a liberdade de expressão é ampliar a oportunidade de as pessoas se comunicarem. Não só serem receptores, mas também propagadores, difusores de informação. A internet permite isso. Embora tenha muita comunicação, mas tem muita informação. O debate é nessa direção. Não é controle e impedimento. É um universo de tantas coisas que não adianta carimbar. Temos de ter abertura para o debate dessa realidade, que é prejudicial, inclusive aos jornalistas e à mídia. O Lula falou isso e não voltou ao assunto porque não é debate que se faz em cinco minutos com risco de manipulação e risco do carimbo da censura. É muito complexo para falar em tão pouco tempo.
O Haddad tem se mostrado candidato competitivo nas pesquisas ao Estado, mas o Psol saiu com números expressivos na eleição na Capital e já apresentou o nome de Guilherme Boulos. É possível a construção de aliança no primeiro turno?
O PT está bem, com candidatura muito credenciada. Tem o que mostrar, o Haddad foi prefeito da Capital, melhor ministro da Educação do País, foi muito bem votado para a Presidência, foi para o segundo turno. Além disso, o (governador João) Doria (PSDB) e os que antecederam têm muita rejeição no Estado. Doria criou candidatura que não era da tradição do PSDB (no caso, o vice-governador Rodrigo Garcia, ex-DEM) e que precisa de muito estímulo da máquina, porque o candidato natural do PSDB, o (ex-governador Geraldo) Alckmin, foi alijado e não se sabe que caminho vai tomar. O Bolsonaro também vai ter candidato. Essa fragmentação favorece. Sobre o Boulos, eu digo sempre que os partidos têm direito de se construir. É natural que pleiteiem ter candidatura ao governo do Estado. O Boulos foi bem votado na Capital porque teve nosso apoio. Fez boa campanha, tem relação muito grande com movimentos sociais, tem discurso e programa. Mas é muito difícil, diante das candidaturas, ter uma resultante. Temos de buscar ter programa comum do campo popular com PT, Psol, lideranças do PCdoB. Há projetos comuns, mas com candidaturas diferentes. E possibilidade de segundo turno com pacto antecipado com apoio e participação no governo. Isso está favorável. O Psol resolveu em seu congresso que não terá candidato a presidente, vai tentar unificar candidatura, espera retribuição nossa. Acho que em um Estado como São Paulo, onde o PT nunca ficou fora da disputa, é pedir demais que o PT abdique de sua candidatura para apoiar o Boulos. Não é correto a gente pressionar o Boulos para retirar a candidatura. O melhor é fazer caminhada comum, sem pacto de não hostilidade porque a convivência entre nós é ótima, mas com construção de programa comum.
Como o sr. tem visto os governos petistas de Diadema e Mauá?
Acho que nossas prefeituras estão se recuperando bem. Tanto Mauá quanto Diadema. Tive oportunidade de conversar com ambos, com o Marcelo (Oliveira, prefeito de Mauá) e com o (José de) Filippi (Júnior, prefeito de Diadema). Acho que vão ser bons gestores e cabos eleitorais pelo governo que fazem. Estamos lutando para ampliar o número de deputados federais e estaduais, uma das diretrizes principais nossas.
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