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O primeiro dia no Rock in Rio foi fantástico. Muito agitado, levando os roqueiros à loucura, com mega-apresentações de Queen, Iron Maiden e Whitesnak.
Assim iniciavam todas as notícias em rádios, TVs e jornais a respeito do Rock in Rio de 1985.
Em um verão mega quente, clássico do Rio de Janeiro, e com as famosas tormentas tropicais, estrutura mediana, muita lama e excelente música, se apresentavam as famosas rockestrelas do mundo.
Muitos destes rockstars somente conheciam o Brasil por fotos nos livros e jornais (ah, sim, teve uma época em que não havia internet, Instagram e Facebook. E acreditem, vivíamos muito bem sem esta tecnologia. Usávamos vídeos e livros para conhecer o mundo e seus habitantes).
Em uma versão que pretendia simular Wookdstok dos tempos modernos, em pleno fim da ditadura militar, somada à eleição direta do democrático Tancredo Neves, que morreria em seguida e seria sucedido por José Sarney (não tão democrático assim).
Política de lado, abria-se para o mundo neste ano de 85, em imagens ao vivo e a cores, o Brasil dizendo: “Podem vir, não somos índios canibais; gostamos de receber a todos e amamos o sexo livre, temos drogas e queremos ver os nossos ídolos”. Claro que, pouco tempo depois, muitos se viram contaminados pelo HIV importado, coisa de vírus que circula nos voos internacionais e grandes eventos, isso vocês sabem bem como funciona. Não que o Rock in Rio tenha esta responsabilidade, porém, neste ano recebemos as maiores comitivas contaminadas, e os brasileiros, ainda sem informações, só conheciam Camisa de Vênus como sendo nome de uma banda de rock nacional. Aqui ainda estávamos na máxima da embriagada Torloni: “Hoje é dia de Rock, bebê”.
A partir daí nasce o famoso e mais bem sucedido evento de música do mundo. Nasce de um sonho, nasce de uma esperança e, acima de tudo, nasce de uma revolução silenciosa para um novo Brasil e para o turismo internacional.
O problema é que sempre que se tem público gigantesco, os olhos e bolsos empresariais surgem, os patrocinadores e seus interesses transformativos levam o Rock in Rio ladeira abaixo.
Fred Mercury cantou Love My Life seguido por milhões de brasileiros com seus isqueiros Bic. E por que havia tantos isqueiros? Porque fumar era algo revolucionário, inovador e atrevido. A indústria do cigarro arrebanhava milhões diariamente para suas empresas, mas isso também é assunto para outra coluna. Jamais poderia ele imaginar que Carlinhos Brown subiria no mesmo palco anos depois e receberia vaias e garrafadas.
Agora, seguramente, se AC/DC soubesse que no mesmo palco subiria, por exigência de patrocinadores do Rock in Rio, figuras como Pablo Vittar, Daniela Mercury e o playback de Britney Spears, talvez tivesse recusado o convite para mostrarem suas línguas ao povo brasileiro.
Já tivemos, sim, um Rock in Rio. Hoje, o turismo tem de aceitar que temos, por imposição das grandes indústrias patrocinadoras, um axé, um samba, um pop, um sertanejo e um pouquinho de rock no Rock in Rio.
Rodermil Pizzo tem 36 anos de atividades no turismo. É jornalista, empresário, professor universitário e mestre em hospitalidade. Esta coluna é atualizada todas as terças-feiras. E-mail: rodermil@dgabc.com.br.
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