Internacionalmente, Said é tão conhecido como Noam Chomsky como intelectual muito ativo no engajamento nas grandes questões políticas mundiais. Foi o primeiro, no livro Orientalismo: O Oriente Como Invenção do Ocidente (Companhia das Letras, R$ 43), de 1979, que analisou historicamente, o modo como se implantou, na literatura e na cultura ocidentais, uma visão distorcida do Oriente. Ou seja, como se trata o Islã como se fosse uma entidade única, e sempre visto como civilização primitiva, subalterna aos valores universais do Ocidente.
Agora, começa a tornar-se também conhecido no Brasil, graças ao lançamento de dois livros reunindo artigos de ampla e diversificada temática: Cultura e Política (Boitempo, 176 págs., R$ 29) e Reflexões Sobre o Exílio e Outros Ensaios (Companhia das Letras, 352 págs., R$ 26). O primeiro reúne uma seleção dos artigos de Said, ex-assessor de Arafat na OLP (a quem abandonou no início dos anos 90, por considerá-lo “corrupto e sem autoridade”), para o jornal egípcio El-Ahram. São mais de trinta artigos, a maioria deles tratando do embate Israel-Palestina, publicados ao longo dos últimos três anos.
É excepcionalmente rico em informações em geral escamoteadas do público ocidental. Um exemplo: “Aproximadamente 750 mil palestinos foram expulsos em 1948 [de Israel]: eles são agora mais de 4 milhões. Os 120 mil (agora 1 milhão) que ficaram posteriormente se tornaram israelenses, uma minoria que constitui 18% da população do Estado, mas sem plena cidadania, exceto no nome. [...] Toda a população judaica tem direitos que os não judeus não têm. Sem uma constituição formal, Israel é governado por Leis Básicas, das quais uma em especial, a Lei do Retorno, permite a qualquer judeu, em qualquer parte do mundo, emigrar para Israel e se tornar cidadão do país, enquanto os palestinos nascidos lá não têm esse mesmo direito. 93% da terra do Estado é caracterizada como terra judaica, o que significa que nenhum não-judeu pode alugá-la, vendê-la ou comprá-la. Antes de 1948 a comunidade judaica na Palestina era dona de pouco mais de 6% da terra”.
Não se percebe rancor ou ódio de Said com relação aos judeus ou Israel, mas sim a vontade de mostrar-lhes o outro lado da questão. “O dilema moral enfrentado por qualquer um que tente compreender o conflito palestino-israelense é profundo. Os judeus israelenses não são colonos brancos do tipo que colonizou a Argélia ou a África do Sul, apesar de terem se utilizado de métodos similares. Eles são corretamente vistos como vítimas de uma longa história de perseguições ocidentais, em grande parte cristãs e anti-semitas, que culminaram nos quase incompreensíveis horrores do Holocausto nazista. Para os palestinos, contudo, seu papel é o de vítimas das vítimas”.
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