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MPE é absolutamente independente, garante Marrey
Do Diário do Grande ABC
11/03/2000 | 15:53
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Em meio à expectativa que cerca a nomeaçao do novo procurador-geral de Justiça de Sao Paulo - atribuiçao exclusiva do governador Mário Covas (PSDB) -, o procurador Luiz Antônio Marrey garante que o Ministério Público Estadual é hoje "uma instituiçao absolutamente independente". Nos últimos quatro anos, Marrey ocupou o cargo de procurador-geral. Nomeado duas vezes consecutivas por Covas, em 1996 e 1998, Marrey afirma ter agido com isençao na apuraçao de denúncias no governo paulista. Seus adversários internos, no entanto, sustentam que Marrey foi "generoso" com o Palácio dos Bandeirantes.

"Estou feliz, com a consciência tranqüila da missao cumprida", afirmou Marrey, ontem, agora cumprindo uma rotina mais amena, dando pareceres em processos criminais perante o Tribunal de Justiça.

Foram quatro anos no comando de uma instituiçao que detém poderes extraordinários conferidos pela Constituiçao. Sob seu comando, o Ministério Público abriu guerra contra administradores corruptos e exerceu implacavelmente o papel de fiscal da lei e defensor dos direitos coletivos.

O saldo da era Marrey é alentado. Durante seus dois mandatos, 500 prefeitos e ex-prefeitos foram processados por fraudes, desvio de recursos públicos, contrataçoes irregulares e violaçao à Lei de Licitaçoes. A máfia dos fiscais da Prefeitura da Capital foi desmascarada. O prefeito Celso Pitta e seu ex-padrinho, Paulo Maluf, nao escaparam: ambos sao réus em açoes de improbidade. Os ex-governadores Orestes Quércia e Luiz Antonio Fleury Filho foram processados.

Entre 1996 e o início deste ano, Marrey produziu 600 pareceres requerendo intervençao federal no Estado. Defendeu o seqüestro de rendas do Tesouro paulista por quebra da ordem cronológica no pagamento de precatórios (dívidas judiciais). Tais medidas causaram desconforto ao governador. P: O senhor é amigo de Covas?

Luiz Antonio Marrey: Nao. Minha relaçao com o governador sempre foi profissional, protocolar. Tratamos de assuntos de Estado nos nossos contatos, nada que fosse impróprio. Covas nunca me ligou para falar sobre investigaçoes. Nao tenho queixa de pressoes.

P: O senhor nao se sentiu endividado com o governador, quando ele o nomeou em 1996 mesmo tendo ficado em segundo lugar nas eleiçoes do Ministério Público?

Marrey: De jeito nenhum. É do sistema constitucional o governador receber a lista tríplice e fazer a escolha que julgar mais adequada para o interesse público. A atuaçao do Ministério Público nesses quatro anos mostra que este é o modelo da instituiçao que melhor serve à comunidade.

P: Por que o senhor nunca propôs açao contra o governador?

Marrey: Porque nao houve motivo que justificasse tal medida. Só se pode abrir processo contra alguém quando há motivo. Nao houve açao de caráter pessoal, mas o mesmo nao se pode dizer com relaçao ao governo.

P: A ex-secretária de Assistência e Desenvolvimento Social, Marta Godinho, foi condenada com base na Lei da Improbidade por ter firmado convênio com uma faculdade para contrataçao sem concurso público de 1.049 pessoas. O convênio foi baseado em decreto de Covas. Isso nao daria margem para uma açao?

Marrey: O decreto dava autorizaçao genérica para assinatura de convênios. Havia centenas de convênios, todos regulares. O decreto nao autorizava manobra para burlar a lei de concurso público.

P: O senhor abriu inquérito civil para investigar porque o governador nao nomeou interventores em 90 municípios inadimplentes. Qual é o desfecho do caso?

Marrey: Nao houve condiçoes de concluir a apuraçao. Recebi as informaçoes do governo nos últimos dias de meu mandato. Sempre deixei claro que a nomeaçao de interventores é obrigatória. O governo tem que cumprir decisoes judiciais.

P: A República dos Promotores acabou?

Marrey: Nao existe mais. Nao pode existir uma relaçao simbiótica do Ministério Público com outros Poderes.

P: Cinco promotores de Justiça estao no governo Covas, ocupando postos estratégicos. Nao significa atrelamento com o Palácio dos Bandeirantes?

Marrey: Essa presença se dá em termos pessoais, nao institucionais. Sao só cinco promotores, eram 30 em outras épocas. Na minha gestao, o Ministério Público nao deixou de executar sua missao em casos concretos, agiu com total independência e autonomia.

P: Qual a diferença entre a sua gestao e a de seus antecessores (Antônio Araldo Dal Pozzo e José Emmanuel Burle Filho)?

Marrey: Nao tenho interesse em jogar pedras no passado. Procurei imprimir uma característica marcadamente aberta à sociedade, atenta aos problemas da populaçao de Sao Paulo. Nao houve episódio importante, tragédias ou dramas que o Ministério Público nao estivesse presente. As açoes que eles abriram foram insuficientes em número e deixaram de incluir outras situaçoes. No caso Baneser (contrataçao sem concurso de 18 mil servidores, entre 1988 e 1994) a acusaçao foi incompleta, tanto que o Conselho Superior do Ministério Público mandou propor uma açao mais abrangente contra Quércia e Fleury.

P: Na sua gestao, o Ministério Público desmontou redes de corrupçao, mas rigorosamente ninguém devolveu um único centavo aos cofres públicos e conta-se nos dedos quantos estao na cadeia. Todo esse trabalho é ilusao?

Marrey: De forma alguma. Há resultados importantes. Alguns prefeitos foram presos e muitas açoes que propusemos resultaram em condenaçao em primeiro grau. A parte que cabe ao Ministério Público tem sido feita. O problema é que está cada vez mais difícil mandar administrador corrupto para a prisao. A legislaçao penal prevê penas alternativas, o que compromete o poder de intimidaçao. Vivemos situaçoes de virtual impunidade. O que significa para um corrupto prestar serviços à comunidade? Leva-se de oito meses a um ano para o Tribunal de Justiça receber uma denúncia do Ministério Público por causa do acúmulo de processos na segunda instância. Há 85 mil processos aguardando distribuiçao. Recomendo um mutirao.




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