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'Atualização é o segredo da empregabilidade', diz especialista
Antonio Rogério Cazzali
Do Diário do Grande ABC
15/03/2003 | 18:22
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Em entrevista concedida ao Diário, o diretor de Gestão de Recursos Humanos do Banco Itaú, Fernando Tadeu Perez, que durante muitos anos esteve ligado à região por suas atividades na Volkswagen e Autolatina, aborda a necessidade de requalificação da mão-de-obra na busca de um emprego, no concorrido mercado de trabalho, bem como, dá o seu ponto de vista favorável sobre os cursos de MBA (Master in Business Administration). Apesar disso, o executivo reconhece que no Brasil as melhores chances de trabalho realmente ficam à disposição das classes mais abastadas. Perez conta ainda as estratégias que o Banco Itaú utiliza na contratação de seus profissionais e até toca em um ponto delicado quando diz que o país “vive a indústria da LER (Lesão por Esforço Repetitivo)”, que acumula uma série de processos trabalhistas sem ferramentas precisas para avaliar a doença.

Diário – O que o senhor acha da linha de pensamento que acredita que quanto maior a tecnologia, menor a necessidade de conhecimento do trabalhador, uma vez que a máquina tem em sua estrutura uma série de mecanismos para facilitar sua operação?
Fernando Tadeu Perez – Eu não compartilho dessa idéia. Eu acho que a globalização trouxe uma série de alterações ao ambiente de trabalho. O conhecimento, que antigamente era tido como eterno, hoje é trocado a cada cinco anos. As tecnologias são derrubadas rapidamente. Eu verifico que boa parte das pessoas está conectada com esse movimento de transformação. Existe uma parcela, constituída, talvez, de pessoas com mais idade, que é um pouco mais resistente. Eu vejo que esses trabalhadores já estão se conscientizando que não têm muita alternativa. Ou se requalificam e pegam esse bonde ou perderão seus empregos.

Diário – O senhor não acha que faltou estímulo das empresas para que esses trabalhadores se requalificassem ao longo de suas trajetórias profissionais, pois há muitos que estão há 15, 20, 25 anos na mesma empresa?
Perez – A globalização veio de uma só vez e muito rápido, e provocou essa necessidade de adaptação em caráter de urgência. Isso é incontestável e foi com a globalização que surgiu essa necessidade grande de renovação tecnológica. O mercado se abriu. Sem tecnologia não se obtém qualidade, não há produtividade e o produto final fica prejudicado. Agora, não é correto dizer que as grandes companhias não têm investido nas pessoas. Eu que vivi muito tempo no Grande ABC conheço muitas companhias que têm essa preocupação. Acho que isso seja uma questão de intensidade. Talvez, elas pudessem ter qualificado seus funcionários mais rapidamente.

Diário – E por falar em qualificação profissional, os cursos de MBA (Master in Business Administration) são um modismo ou eles vieram para ficar?
Perez – Eles vieram para ficar. As pessoas acordaram. Se você observar, há duas décadas, o sujeito se formava na faculdade e era orgulho para a família. Agora, sabe-se que o diploma universitário não serve praticamente para nada. Havia até uma brincadeira nas montadoras que dizia que o diploma de engenharia servia apenas para o primeiro dia de trabalho. Então, o que se vê hoje são pessoas que fazem duas faculdades, uma após a outra. Atualmente, isso é muito mais comum do que se imagina, sobretudo, entre a classe média. Eu não acho. A humanidade ainda não resolveu algumas questões. Uma delas é a da assistência médica. Veja como é paradoxal. Enquanto o sujeito está na ativa, tem salário, alguns têm PLR, bônus, 13º salário, horas-extras, abono de férias, e a companhia subvenciona uma parte da assistência médica. Como ele é jovem não dá manutenção, gasta pouco. Quando ele se aposenta, acontece o inverso. Este trabalhador não tem mais salário, não tem 13º, não tem férias, não tem bônus, e a empresa não dá nenhum subsídio de assistência médica. É a hora em que o cidadão dá mais manutenção, é quando ele mais precisa. Eu acho que essa equação a humanidade ainda não resolveu bem, isso não é só no Brasil, mas no mundo. Outra questão desse tipo, e que remete à sua pergunta, diz respeito à empregabilidade. O que acontece? Automação é absolutamente indispensável. Se você não faz automação não evolui, não tem qualidade, nem produtividade.

Diário – Isso demonstra que somente a classe de poder aquisitivo maior é que terá melhores chances nessa corrida?
Perez – Não tenha dúvida, é isso mesmo! Por isso é que eu acho que a forma de contornar esse problema da classe sem dinheiro e que precisa se especializar sejam os cursos profissionalizantes. Hoje, todo mundo tem a idéia fixa de que todos precisam ir a uma universidade. E convenhamos, em vez de termos essa obsessão pela faculdade, os cursos profissionalizantes seriam mais adequados, neste caso. Isso prepararia melhor o nosso jovem, e ele não concorreria para o mesmo tipo de emprego, o que acaba hoje gerando um certo funil. O que temos hoje é mão-de-obra extremamente especializada, mas temos tido carência de mão-de-obra não tão qualificada. Há a mão-de-obra puramente operacional e, dentro da classe média, com a proliferação de cursos, um mundo de doutores. Faltam ocupações intermediárias.

Diário – Mas esse excesso de especialização, de automação, em todos os níveis, não tiraria a criatividade inata do trabalhador brasileiro?
Perez – Todos os extremos devem ser evitados, tudo o que é extremo em qualquer campo de atuação, em qualquer cenário sempre é prejudicial, mas eu ainda favoreço a automação. Eu acho que a automação provoca mais resultados do que prejuízo. Eu me pergunto como seria o mundo se tivéssemos contido a automação. Talvez nós devessemos ter mais gente empregada, por um lado, mas em que condições? Sem automação será que não teríamos muitas empresas quebradas e um nível maior de desempregado. Eu se tivesse de optar por uma das duas opções, eu fico com a automação.

Diário – Que estratégias Banco Itaú utiliza para fazer suas incorporações?
Perez – São vários aspectos. o Itaú é uma organização gigantesca e que é maior que a Volkswagen do Brasil. Para se ter uma idéia de comparação, enquanto a Volkswagen do Brasil tem cerca de 20 mil empregados, no Itaú são cerca de 40 mil. Além do que, o Itaú tem incorporado uma porção de bancos. Temos aqui várias “mini-autolatinas” simultâneas, porque incorporar bancos é um processo trabalhoso. Temos de levar em conta culturas diferentes, sistemas de gestão diferentes, estratégias diferentes. E você tem de pensar na incorporação, mas respeitando, dentro do possível, a cultura do outro banco. E isso tem dado muito certo. Para se ter uma idéia, o Itaú tem hoje vários diretores que pertenciam a bancos incorporados. Realmente, o Itaú desenvolveu muito essa tecnologia da incorporação. Evidentemente, que a cultura Itaú prevalece, mas é uma cultura aberta a absorver coisas novas.

Diário – Houve incorporações em que o processo foi mais difícil?
Perez – Aqui a integração é total. Eu posso falar de cátedra e você me conhece porque eu vivi Autolatina, e lá tinha aquele problema de integração entre os alemães e os norte-americanos. Aqui essa integração se dá quase de maneira natural, e acho que dois aspectos são diferentes aqui em relação à Autolatina. Primeiro que no Itaú existe uma incorporação. É diferente, no nosso caso um compra o outro. No caso da Autolatina eram duas sócias-gigantes e que travavam uma briga conceitual. Lá ninguém queria ceder em nada.




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