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‘Emprego depende de nova CLT’
Antonio Rogério Cazzali
Do Diário do Grande ABC
30/03/2002 | 20:24
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A criação de empregos no Brasil está associada à necessidade da redução das taxas de juros, à reforma tributária e também à flexibilização da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). A afirmação é do secretário estadual de Emprego e Relações do Trabalho, Fernando Leça, que trocou recentemente a superintendência do Sebrae-SP (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), de São Paulo, pela Secretaria de Estado, cargo antes ocupado por Walter Barelli – que se candidatará a deputado federal nas eleições deste ano. Em entrevista ao Diário, Leça disse que os altos encargos trabalhistas fazem com que cerca de dois terços das empresas brasileiras vivam na informalidade, uma questão que ele tentará resolver, além de brigar para que São Paulo tenha mais verbas do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).

DIÁRIO – Quais são seus planos à frente da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo?

FERNANDO LEÇA – Eu tenho, obviamente, por ser da região, interesse especial no Grande ABC, porém, devo pensar no Estado como um todo. Espero que os prefeitos e outras lideranças da região entendam isso. Por outro lado, meu objetivo será criar mais empregos e isso é um problema, sobretudo no Grande ABC. Todos sabem que os índices de desemprego na região são maiores do que no resto do Estado. Eu percebo também que, embora a economia sinalize que a produção industrial crescerá, existe uma série de problemas estruturais e que reduziram a renda do cidadão brasileiro, principalmente daquele que vive de salário. Com baixa renda se consome pouco, se produz menos e o desemprego cresce. Isto é um círculo vicioso. A mudança de perfil do Grande ABC também contribuiu para o desemprego. Há 12 anos nós tínhamos a indústria como o setor mais importante da região, e que era responsável por 45% dos postos de trabalho. Hoje, ela responde por apenas 28%, e o de serviços por 47% dos empregos. Como tentativa de aquecer o emprego no Estado, vou lutar para aumentar as verbas do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), proporcionalmente inferiores às destinadas aos demais Estados.

DIÁRIO – Quer dizer que hoje o setor de serviços é um bom gerador de empregos?

LEÇA – É, mas geralmente paga menos. E quando se recebe menos se consome pouco, a indústria produz menos e temos o desemprego. As pesquisas mostram que ao longo dos últimos dez anos houve no Grande ABC uma redução salarial média da ordem de 10%. Outro fator que contribui para o desemprego são as altas taxas de juros. Eu acho que a Selic poderia cair mais, porém, o Copom tem se mantido conservador quanto à questão. Se ela caísse significativamente, a economia começaria a andar. Isso já pode ocorrer sem que haja riscos da retomada da inflação.

DIÁRIO – O sr. terá uma preocupação especial com o trabalhador informal?

LEÇA – Claro que sim. A informalidade existe e há dificuldades para que as empresas migrem para a formalidade. Estas dificuldades decorrem da carga tributária pesada que existe no Brasil. Os encargos trabalhistas, que também são muito pesados, não deveriam ser cobrados da mesma forma para empresas grandes e pequenas. São realidades diferentes. Hoje temos um universo de 4,5 milhões de empresas formais no país. As informais são o triplo, em torno de 15 milhões. Das formais, apenas 0,58% têm acima de mil empregados; 58% delas têm até quatro funcionários apenas. Diante destes números, como podemos aplicar os mesmos encargos para todas as empresas, com realidades tão diferentes? Uma de minhas metas será lutar por encargos escalonados.

DIÁRIO – O sr. é a favor da flexibilização da CLT?

LEÇA – Acho que estamos diante de leis trabalhistas que precisam ser atualizadas. A CLT tem muitos pontos ultrapassados. Tudo evoluiu muito, mas ela continua a mesma, com seus dogmas legais. Há nela certas normas tão rígidas que se um dia defenderam o trabalhador hoje o prejudicam. São impedimentos para que se crie empregos; para que as empresas se tornem formais. E sua modernização deve ocorrer, pois temos hoje cerca de dois terços dos trabalhadores vivendo na informalidade, sem carteira assinada. Somente estes dados já demonstram que a CLT precisa ser revista. Se ela foi criada para beneficiar todo trabalhador, podemos dizer que ela hoje se aplica a uma parcela pequena de trabalhadores. Entendo inclusive que a flexibilização da CLT é até uma oportunidade para que empresas e sindicatos exercitem a negociação e modernizem a relação patrão-empregado.

DIÁRIO – Sua experiência no Sebrae será importante neste novo cargo?

LEÇA – Estive três anos no Sebrae e aprendi a conhecer de perto o que representam as micro e pequenas empresas. Aproveitando a filosofia do Sebrae, tenho como meta fechar parcerias com os prefeitos dos 645 municípios do Estado para gerar mais empregos. Além disso, será importante desenvolver legislações facilitadoras para a abertura de novos negócios. Novas empresas representam mais empregos. Segundo pesquisas, hoje, de cada oito brasileiros da população economicamente ativa, um é empreendedor. Nos Estados Unidos esta relação é de um para dez, na Inglaterra de um para 30 e no Japão de um para 100. O Brasil é, por vocação, o maior empreendedor do mundo.

DIÁRIO – O Grande ABC está perdendo suas indústrias para outras regiões do país?

LEÇA – Isto é evidente. Vejamos em São Bernardo, onde havia a Brastemp hoje é o Wal-Mart. No local da Villares funciona o Carrefour, e assim por diante. Há uma desconcentração industrial. Vivemos realmente o êxodo delas. As indústrias procuram outras cidades no interior paulista, em outros Estados, e são atraídas por vários fatores, facilidades, terrenos baratos, incentivos ficais etc. Essa desconcentração é uma tendência também em outras metrópoles. Há ainda a modernização dos parques industriais. Normalmente, as empresas que ficam nos grandes centros, como é o caso da Volkswagen em São Bernardo, elas se automatizam e geram mais desempregos. Gostaria de deixar claro que o problema do desemprego é amplo.

DIÁRIO – Como o sr. vê as eleições presidenciais?

LEÇA – Eu vejo que o Brasil está pronto para crescer, independentemente do presidente que vier. O papel do novo presidente será dar continuidade ao processo de crescimento que já se anuncia. Com uma economia mais forte, os empregos começarão a surgir. O presidente que está aí pode ter cometido alguns erros, mas acertou no atacado.




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