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SUS chega aos 30 anos com desafio de ampliar recursos

Inflação corrói receitas e prefeituras empenham menos verba nos serviços à medida que demanda sobe

Aline Melo
28/10/2018 | 07:00
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Marcos Santos/USP Imagens


 O SUS (Sistema Único de Saúde) completa 30 anos de existência neste mês. Considerado o ‘maior plano de Saúde do mundo’ e um dos mais amplos serviços de atendimento universal e gratuito, a estratégia é classificada como exitosa por especialistas da área, mas convive com o desafio do aumento crescente dos gastos em cenário de receitas cada vez menores. A crise financeira e a alta do desemprego também impactam na situação, com mais pessoas utilizando os serviços públicos.

Segundo dados dos governos federal e estadual, de 2013 a 2017, as receitas líquidas do Grande ABC caíram, corroídas pela inflação do período. Em termos reais, os valores passaram de R$ 10,6 bilhões para R$ 9,6 bilhões, baixa de 9,3%. Os empenhos para Saúde também apresentaram recuo, de R$ 2,6 bilhões (em termos reais, considerando a inflação) para R$ 2,5 bilhões – perda de 3,1%. Apesar da queda de receitas e empenhos, o percentual da receita líquida destinada para a área aumentou de 24,8% em 2013 para 26,5% em 2017.

O diretor da Abres (Associação Brasileira de Economia da Saúde), Francisco Funcia, aponta que o estabelecimento do teto de gastos federais por 20 anos, aprovado em dezembro de 2016 por meio da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 95, tem agravado a situação dos municípios. “Temos um problema de queda na arrecadação, menos recursos para financiamentos públicos e mais pessoas para serem atendidas”, aponta. O especialista defende a revogação da medida, que já tem impactado na queda de repasses federais para cidades e municípios, sob risco de a Saúde pública entrar em cenário de “grave crise social”. “Não há margem para ampliação da participação municipal no financiamento do SUS”, relata. Em 2017, as cidades do Grande ABC foram responsáveis por 70% dos gastos na Saúde.

A diretora de comunicação da SBMFC (Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade), Denize Ornelas, reforça a fala de Funcia e afirma que a situação já é de estrangulamento por falta de recursos. A professora responsável pela disciplina de Saúde Coletiva da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), Vânia Barbosa do Nascimento, também defende a revogação ou a flexibilização da PEC. “Nós comemoramos esses 30 anos de existência com muita preocupação. O SUS é patrimônio do povo brasileiro, mas, sem dinheiro, com as pessoas vivendo cada vez mais, a perspectiva não é boa”, pontua.

Vânia lembra que a própria atuação do SUS é responsável pela longevidade ampliada da população, por meio do controle de endemias e ampla cobertura. “Somos referência internacional nestes atendimentos, que prolongam a vida das pessoas e vão demandar cada vez mais investimentos”, concluiu.

A Secretaria de Estado da Saúde informou que sua participação financeira no SUS no Grande ABC se dá pelo custeio de equipamentos de Saúde que garantem o atendimento regional nos hospitais Serraria, de Diadema, e Mário Covas, em Santo André, além dos AMEs (Ambulatórios Médicos de Especialidades) de Mauá e Santo André. Juntos, totalizam custo anual de R$ 351 milhões.

Pacientes destacam histórias de sucesso
Apesar de conviver com realidade de poucos recursos e demanda alta, o que se reflete em filas para consultas e hospitais lotados, o SUS (Sistema Único de Saúde) do Grande ABC também coleciona histórias de sucesso entre os moradores.

O administrador aposentado Sergio Soares, 65 anos, estava na igreja, em 2014, quando sofreu um infarto. O morador de Santo André foi socorrido para uma UPA (Unidade de Pronto Atendimento) e, de lá, para o CHM (Centro Hospitalar Municipal), na Vila Assunção. “Aguardei internado por dez dias e, de lá, fui transferido para o Hospital Estadual Mário Covas”, relatou.

Soares foi submetido a um cateterismo, recebeu alta e, em uma semana, foi chamado para realizar a cirurgia cardíaca. “Tempo depois recebi carta do SUS descrevendo todo o material utilizado em mim em todos os atendimentos e os valores. Achei esse controle sobre o recurso público muito importante”, considerou o andreense.

Os elogios também se estendem às equipes que fizeram os atendimentos. “Em algumas unidades, havia problemas estruturais, mas a dedicação dos profissionais foi muito boa”, concluiu.

A vendedora Fernanda Costa dos Santos, 30, morava em São Bernardo quando deu à luz ao filho mais velho, no Hospital Estadual Serraria, em Diadema. Todo o pré-natal foi feito na UBS (Unidade Básica de Saúde) Pauliceia, em São Bernardo, e a agora munícipe de Diadema aprovou o atendimento recebido, especialmente durante o nascimento do bebê. “O parto foi super-rápido. Não tinha contrações e uma enfermeira ficou ao meu lado, me fazendo massagens. Fui muito bem tratada”, relatou.

Acumulando experiências tanto como usuária quanto como profissional do SUS, a fisioterapeuta Bibiana Caldeira Monteiro, 42, avalia que o atendimento no SUS permite um acompanhamento melhor do que no sistema privado de Saúde. “No convênio, a gente faz a cirurgia e pronto. No SUS, existe todo um acompanhamento da evolução do quadro, especialmente na detecção de possíveis intercorrências”, opinou. “É um atendimento mais integral, com interlocução entre os diferentes profissionais envolvidos”, concluiu.




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