Política Titulo Entrevista exclusiva
‘Se vitória sair dessa polarização, cenário é tragédia’
Fábio Martins
Raphael Rocha
Do Diário do Grande ABC
03/10/2018 | 07:00
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Claudinei Plaza/DGABC


Postulante à Presidência da República pelo PDT, o ex-governador Ciro Gomes considerou cenário de drama para o Brasil a partir de 2019 em caso de confirmada a confrontação entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) no segundo turno. “(Vejo que) Se (a vitória) sair dessa polarização, tragédia”, alegou o pedetista, em entrevista exclusiva na sede do Diário. Ele acrescentou que o fenômeno de Bolsonaro se dá em torno de protesto, apesar da “falsidade” do rival. “Ele já votou no Lula, contra o Plano Real.” Sobre Haddad, falou que é figura “não treinada para administrar País.”

Ciro aparece em terceiro lugar, segundo o Ibope, com 11%, atrás de Bolsonaro e Haddad. O pedetista avaliou que, conforme tracking interno, 43% dos eleitores ainda não têm voto consolidado, e lembrou que no processo eleitoral de 2014 houve reviravolta na reta final de campanha. “Na medida que surge a informação de que nem um nem outro está propriamente ganhando as pessoas estão olhando muito para mim.”

O ex-governador reiterou proposta de revisar o pacto federativo, e criar 2 milhões empregos no primeiro ano de mandato.

Confira entrevista completa:

O Ibope apresentou cenário de crescimento de Jair Bolsonaro. Como reverter essa situação nesta reta final?
A essa altura temos estrutura profissional, temos tracking, estamos acompanhando o movimento. Digo que hoje 43% dos eleitores brasileiros não aterrissaram ainda. Isso é a soma dos indecisos explicitamente e daqueles admitindo votar em alguém induzido, admitem mudar o voto, porque querem ver os debates, consultar a família, conversar com os amigos. São as razões para definir voto. Há esse vetor útil, utilitário por assim dizer, que não gosto muito, mas é fração do eleitorado que não está feliz com as contradições terríveis do Bolsonaro, as declarações infelizes mas muito elucidativas do general (Hamilton Mourão, PRTB). Mas é antipetista. Está no Bolsonaro porque considera a pessoa mais viável. E há fração dos eleitores do PT que imaginava que o Haddad ia resolver a parada. Na medida que surge a informação de que nem um nem outro está propriamente ganhando as pessoas estão olhando muito para mim. As simulações de segundo turno me fazem ganhar dos dois com certa folga. Por isso estou trabalhando. Ibope no dia 2 de outubro de 2014 dava segundo turno entre Dilma (Rousseff, PT) com 40% e Marina Silva (hoje Rede, à época PSB), 32%. Aécio (Neves, PSDB) tinha 19%. Sabemos como foi tudo diferente. É fácil? Absolutamente não. Mas estou na área, me deslocando, indo para a cabeça da área e pedindo a bola. Se me deram, será de voleio.

Surpreendeu o fato de Fernando Haddad não ter conseguido ir para o segundo turno e agora haver essa reviravolta, com chance de ir ao segundo turno?
Não houve reviravolta. O PT hoje está tendo dificuldade para renovar no Acre. No Nordeste, tem governadores bem avaliados: Piauí, Ceará e Bahia. Acabou. Rio Grande do Norte tem possibilidade, mas não é provável. É efeito real do lulismo na vida do povo, exclusivamente. Não tem PT nisso. Pelo contrário. Somem com PT, cores (na campanha). Tem São Paulo, Rio, Minas com dificuldade grave. Rio Grande do Sul não tem chance.

O ex-presidente Lula formalizou convite para ser vice na chapa do PT?
Considero que o Brasil precisa nessa crise, a mais grave da história, de liderança verdadeira. Não aguenta mais presidente fraco, por procuração, presidente que tem que ir a Curitiba 15 vezes numa campanha de dois meses. Não é que o Lula não seja memória respeitável. Mas estamos falando do futuro do Brasil, do líder da Nação com 208,5 milhões habitantes. Imagina se eu aceito? O Lula me cercou por todo o caminho, Dilma, (senador Roberto) Requião, (senadora) Gleisi (Hoffmann, presidente nacional do PT), para ser o vice dele e participar dessa patuscada, fraude, na verdade. Fiquei agradecido, mas disse que não participava dessa fraude. Eu já estava homologado como candidato, foi ali no limite do dia 5. Talvez no dia 2 e 3 veio onda de pressão.

Como o sr. enxerga o fenômeno sobre a candidatura do Bolsonaro?
Ele é a negação. Tenho muita confiança de que a eleição vai surpreender os institutos de pesquisas. O voto é catártico, de negação, protesto. Ele representa fake news absoluta. O Bolsonaro é falsidade, como cédula de R$ 3. Conheço bem, fui colega por quatro anos. Esse Bolsonaro que está representando a denúncia moral, solução breve e severa para violência impune, ódio contra a corrupção do PT é falso. O Bolsonaro votou no Lula (no segundo turno), e em mim no primeiro. Contra o Plano Real. O (economista) Paulo Guedes não dura 15 dias. Porque ele (Bolsonaro) pensa o oposto, sem reflexão. O que é isso? Espécie de protesto, por tudo o que aconteceu no País. Pela contradição inexplicável do PT, que não faz sequer uma autocrítica. As Nações que não conhecem a sua história estão condenada a repeti-la como tragédia. Essa frase é conhecida, não é minha.

Independentemente do resultado, como o sr. considera que o próximo presidente irá encontrar o País?
Se (a vitória) sair dessa polarização (Bolsonaro e Haddad), tragédia. Você anota e espero que os jornalistas estejam soltos (com liberdade). Numa campanha dessa como eles reagem nesse mundo virtual, eles batem nas pessoas nas praças. Imagina no poder. É fenômeno do próprio fascismo, verdadeira, que está acontecendo. Vamos revogar a Emenda 95 em primeira hora. Não há precedente internacional nem na literatura comparada nem na experiência empírica de nenhuma nação que estabeleça controle com status constitucional do investimento em Saúde. Viola norma básica. Esse País tem demografia jovem e nascem 3 milhões por ano. Imagina sem expandir o número de espaços? Inflação da Saúde é dólar. Todos os insumos, meios de diagnóstico, tudo é importado do estrangeiro.

O governo Temer alega a medida para fazer equilíbrio fiscal...
É mentira. Suponha pizza, do Orçamento (pega uma folha para explicar a tese), com receita de 51,6% do Orçamento de juro e despesa financeira. São 29% de Previdência. Zero controle. Sobram 20% para Educação, Saúde, infraestrutura. Como conserta? Atacar no campo da despesa, não é trivial, e aumentar a receita. Tem claro que sem mexer na receita não tem saída. Imposto sobre lucros e dividendos empresariais só o Brasil e a Estônia não cobram. Isso arrecada R$ 70 bilhões. Tributo sobre grandes heranças, acima de R$ 2 milhões, progressivo. Isso arrecada mais R$ 30 bilhões. E pente-fino nas renúncias fiscais, que é espécie de despesa, mas a grande é R$ 354 bilhões ao ano. Acha R$ 70 bilhões fácil em pente-fino. Pronto, acabou o deficit. O problema é o colapso político.

Com relação a questão do emprego. O Grande ABC é região altamente industrial, mas nos últimos 30 anos houve evasão muito alta. Como o sr, caso ele, pretende atuar para fomentar a criação de vagas de trabalho? Quanto estima criar de emprego?
Só para ter ideia de como nós navegamos sem projeto e como o PT, sendo experiência boa para o País lá num primeiro momento, nunca cuidou de mudança estratégica de visão. O Brasil em 1980, isso comentado do Grande ABC, tinha um terço do PIB industrial, e 42% do PIB era aqui em São Paulo. Hoje caiu para 10%. Só nos últimos três anos do desmonte do governo Dilma (Rousseff, PT) até o fim do poço do Temer fecharam-se 13 mil indústrias no País, 4.000 em São Paulo. Isso está acontecendo porque os preços centrais da economia, e o modelo econômico adotado a partir do Fernando Henrique (Cardoso, PSDB), replicado pelo PT, é absolutamente estimulante da destruição da produção, intermeando isso com ciclos de consumo felicitante. Como se resolve isso? Entendendo o problema. O Brasil precisa de projeto nacional de desenvolvimento, e a guia deve ser superar a miséria e desigualdade. E grande processo é a indústria. Ela paga os melhores impostos, agrega valor no comércio exterior e paga os melhores salários. Vamos investir em quatro complexos industriais: petróleo e gás, complexo da Saúde, agronegócio e de Defesa. E quanto ao emprego tem resposta de urgência para o primeiro ano. São 2 milhões de emprego, basicamente com linha na construção civil, não importa nada, investimento modular, e pode começar imediatamente ao retomar obras paradas. São 7.200 licitadas, licenciadas, e que podem ser ativadas via crédito.

Um dos reflexos da queda da economia do poder industrial da região se dá nos cofres das prefeituras. O sr. tem falado em revisão do pacto federativo. Como o sr. pretende fazer isso?
As prefeituras estão recebendo das transferências federais o valor real equivalente ao que recebia em 2012. Enquanto isso, os municípios estão quebrados, 60% deles já extrapolaram o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal. E com relação aos Estados 17 dos 27 também já estão quebrados. São Paulo vai quebrar no ano que vem. Mas isso não é culpa dos Estados e municípios, é um problema central do Brasil. Precisamos redesenhar a reforma fiscal em troca de redesenho do pacto federativo. Os tributos e renúncias fiscais, os três serão partilhados com Estados e municípios. Quero fazer mais. Dá para solucionar.

Como o sr. espera, caso eleito, fazer governabilidade? É possível dialogar com o MDB?
É possível atenuar a lógica de impasse que está demonstrada, e provavelmente vai se potencializar na próxima legislatura, se nós desarmarmos a confrontação odienta que produziu isso. Presidencialismo traz em si lógica de impasse. Desde (Eurico Gaspar) Dutra (presidente do País entre 1946 e 1951) todos os presidentes foram com minorias, mas todos tiveram para fazer e desfazer nos seis primeiros meses. Excitação da eleição não pode esfriar. Além de convocar a população diretamente para votar, plebiscito e referendo. Acho que só precisaríamos disso para a reforma da Previdência. O MDB tem que ser destruído, pelas ferramentas democráticas. É minha solene promessa. A linha não está difícil. O MDB virou, salvo exceções, uma quadrilha que se alimenta desse tamanhão para chantagear todos os governos roubando. Se fechar a torneira que força que resta? Esse é o grande erro do Lula, do PT e o Haddad está repetindo. O cara entra na eleição, depois de tudo que aconteceu, e vai para o Ceará se abraçar com Eunício Oliveira (presidente do Senado). E vai em Alagoas ele se agarra com o Renan Calheiros. Teria que fazer o oposto. Não aprendeu nada? 




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