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Com Dilma, Mantega adota discurso repaginado
30/12/2010 | 07:55
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"Guido Mantega é um soldado do PT. Se a presidente eleita Dilma Rousseff pedir para ele viabilizar um superávit primário de mais de 3,1% do PIB em 2011, ele certamente vai cumprir essa missão." O comentário do cientista político Carlos Melo, professor do Insper, sintetiza a avaliação dos especialistas ouvidos pela Agência Estado sobre a mudança de discurso - para um viés mais fiscalista - que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, passou a adotar assim que foi convidado por Dilma para permanecer no comando dessa pasta.

Segundo o diretor do Eurasia Group para a América Latina em Nova York, Christopher Garman, o ministro da Fazenda é pragmático e deverá assumir, no novo governo, o papel de gestor austero das contas públicas. Isso porque, continua Garman, esta é a orientação da presidente eleita Dilma Rousseff: "Mantega tem um perfil de executor de medidas, não é um formulador."

Na avaliação dos agentes econômicos, Mantega se tornou nos últimos dois anos numa autoridade pública menos preocupada com o equilíbrio das contas federais e mais empenhada em levar o País a um crescimento muito forte, sobretudo num ano eleitoral e sob o comando do popularíssimo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com o próprio ministro, o crescimento deve chegar perto de 8%, "para fechar 2010 com chave de ouro".

Na entrevista coletiva realizada recentemente em Brasília, na qual foi feito um balanço dos quatro anos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Mantega disse que o governo vai diminuir as despesas de custeio da máquina administrativa. Segundo ele, tal postura será necessária para que o Banco Central possa reduzir os juros e ampliar os investimentos no País. O ministro ressaltou que a meta do superávit primário para 2011 é de 3,1% do Produto interno bruto e será cumprida à risca.

Para o economista Felipe Salto, da Tendências, o ministro Guido Mantega merece o "benefício da dúvida" quanto à elevação do superávit primário em 2011. "É preciso, contudo, que o governo apresente uma proposta formal à sociedade sobre como vai conter os gastos", disse. De acordo com um diretor de um grande banco internacional que atua em Nova York "há sinais fortes de que o novo governo deve anunciar no começo de janeiro, logo após a posse, um programa fiscal bem rígido" com o objetivo de conquistar a confiança dos agentes econômicos em relação ao compromisso de Dilma Rousseff de administrar bem o caixa federal até 2014.

Para o economista da Tendências, o superávit das receitas sobre as despesas deve avançar em 2011, mas não deve atingir o objetivo de 3,1% do produto interno bruto, pois deve chegar a 2,6% do PIB. "Se a meta de 3,1% do PIB de superávit for atingida no ano que vem será um bom sinal de que o governo estará engajado para melhorar a eficiência das contas públicas, o que é fundamental para permitir que o BC corte os juros no médio prazo", disse. "O mandato de um ministro está atrelado a resultados, inclusive na área fiscal. Se Mantega não cumpri-los, sua permanência no novo governo será curta", avalia o professor Carlos Melo.

DESCONFIANÇA - Apesar da mudança do discurso do ministro Mantega sinalizar o compromisso com a austeridade fiscal, alguns analistas econômicos veem essa repaginação com certa desconfiança. O ex-ministro da Fazenda e sócio da Tendência Consultoria Integrada, Mailson da Nóbrega, prefere dar um crédito de confiança à Dilma e a Mantega no quesito política fiscal: "Prefiro dar a eles um crédito de confiança. Pelo menos o benefício da dúvida." No entanto, avalia que as dúvidas ainda são muitas porque "continua na Fazenda o ministro responsável por uma grande deterioração da política fiscal" nos últimos oito anos.

O que tem deixado os analistas um tanto céticos com a mudança de discurso de Mantega é o fato de que o próprio ministro e a presidente eleita (que comandou a Casa Civil do governo Lula) - que agora fazem um discurso com viés austero - são os mesmos que afiançaram a política expansionista do governo do presidente Lula.

Na avaliação do professor da PUC-SP, Antônio Corrêa de Lacerda, do ponto de vista político é normal que um governo em final de mandato não queira tomar medidas impopulares e é mais aceitável que um governo em início de mandato tome medidas amargas. "Então vejo este discurso como uma diretriz, certamente dada pela própria Dilma, que não quer correr o risco, principalmente na área fiscal, o que implicaria em alguma forma de ajuste", diz.

Além disso, continua Lacerda, as decisões na área econômica têm de serem olhadas muito em função do contexto. Lula, de acordo com ele, teve como um dos seus principais desafios vencer a crise. Mas Dilma vive outro momento. "Nós estamos vivendo uma guerra cambial, internacional, o Brasil terá um crescimento razoável neste ano, mas cujo desafio é garantir uma sustentabilidade. Então, ela precisa de mais realismo. Tem que pensar mais com a cabeça de economista, com mais racionalidade", defende.

O economista-chefe da Prosper Corretora, Eduardo Velho, acredita que pelo menos boa intenção a equipe econômica de Dilma tem. "Me parece que estão debruçados sobre as planilhas procurando uma forma de reduzir as despesas desde que foi formada a equipe de transição do governo Dilma", diz ele. A questão, de acordo com Mailson da Nóbrega, é saber se o que a presidente eleita tem defendido "vem mesmo do coração" ou é apenas a repetição do que escreveram para ela.

 

 




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