Política Titulo 60 anos em 60 entrevistas
‘Hoje, o polo é base para 90% das indústrias’
Tauana Marin
Do Diário do Grande ABC
13/04/2018 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


Instalado há 46 anos na divisa de Santo André e Mauá,no Parque Capuava, o polo petroquímico movimenta a economia do Grande ABC e gera 10 mil empregos. O complexo tem equipe voltada à modernização e melhorias para elevar a produção, manter a segurança e melhorar o entorno. Entre os principais executivos na unidade fabril está Flávio Chantre, gerente de relações institucionais da Braskem, dona de parte das empresas que compõe o polo. O jornalista, que teve contato efetivo com as sete cidades em 2002, espera que dentro de 20 ou 30 anos o complexo esteja em novo patamar, com mais produção e fomentando novos negócios.

Flávio Chantre e o Diário
Formado em Jornalismo, o paulistano Flávio Chantre, 54 anos, teve o primeiro contato com o Diário ainda na faculdade. No entanto, foi quando começou sua carreira que os laços foram estreitados. “Trabalhei em algumas redações e depois passei a atuar em agências. Cheguei ao Grande ABC quando estreei no setor corporativo, na área de comunicação da Volkswagen, em 2002. Depois fui para outros setores, mas há seis anos voltei para a região, na Braskem.” Segundo ele, a relação com o Diário é muito próxima. “Sempre estamos em parceria. O jornal é canal aos microempreendedores, comércio local e para nós.”

O polo petroquímico instalado na região, há 46 anos, foi o primeiro no País, e ocupa área em Santo André e em Mauá. Como surgiu essa grande indústria?
A refinaria da Petrobras no Grande ABC, a Recap, foi inaugurada em 1954. Dezoito anos depois, surge o polo petroquímico, em 1972. Até então o Brasil importava os insumos petroquímicos para desenvolver o setor. Isso tudo, naturalmente, tirava a competitividade da indústria nacional. E na intenção do governo brasileiro de estimular esse setor econômico se formou um modelo, que na época se chamava tripartite, que consistia em instalar empresas brasileiras que tinham um terço de participação do Estado (governo federal), um terço de empresas multinacionais (que detinham a tecnologia) e um terço de empresas locais, empreendedores nacionais para adquirir essa tecnologia, que até então não existia por aqui. Assim surgiu a PQU (Petroquímica União), e foi um modelo que funcionou. O conceito de polo é: fornecedor de matéria-prima, no caso a Recap; uma primeira geração petroquímica (a PQU) e depois outros clientes conectados, que recebem produtos e os distribuem, via dutos (externos ou subterrâneos), pela segurança do produto transportado e pelo custo logístico.

Então, quantas empresas formam hoje o complexo petroquímico?
Hoje o polo tem cerca de 15 empresas, algumas de gás, que também recebem matéria-prima da Recap. Ao longo do tempo, como qualquer setor, foi se consolidando. Eram diversas empresas independentes, até que uma empresa passou a adquirir a outra para se tornar maior e mais forte, foi quando surgiu a Quattor. Enquanto isso, a Braskem estava se consolidando em outros polos no Brasil. Em 2010, tinham essas duas grandes empresas, e a Quattor passava por dificuldades financeiras, quando foi comprada pela Braskem, que assumiu quatro empresas do polo. A Braskem está aqui desde 2011, e detém a primeira geração, compra a matéria-prima e transforma em petroquímicos básicos. Depois a segunda geração fabrica resinas plásticas, que vão para a terceira geração, que são os transformadores (diversos). Na região tem diversas empresas de produção de plásticos, para embalagens alimentícias, automotivas, não necessariamente nesse polo. Esses insumos chegam às empresas e, depois, no consumidor. Quase tudo que se tem em casa passa por aqui de alguma maneira. A mesa, o telefone, a roupa, o televisor, tinta, tudo isso utiliza plástico. Hoje o polo emprega 10 mil funcionários entre diretos e indiretos, sendo 3.000 diretos e o restante indiretos, que abrange portaria, limpeza, alimentação, segurança e algumas manutenções. Desse total, a Braskem detém 4.000 colaboradores, 1.000 diretos.

Qual a importância do Diário para um complexo como esse?
A relação com o principal jornal da região, naturalmente, é muito próxima. O Diário sempre tem boas fontes de informação, é um canal com a sociedade, uma oportunidade que temos em esclarecer fatos, divulgar trabalhos de todas as esferas. É uma importante parceria.

Qual a diferença, na visão empresarial, do jornal regional?
Quem mora no Grande ABC, além das notícias macro, que abrangem o mundo, quer saber, principalmente, das notícias de onde mora. As informações locais são a grande matéria-prima. Por isso, privilegiamos o Diário com nossas informações, já que queremos atingir o público que nos interessa, no caso, o do entorno do polo.

O polo está instalado em dois municípios da região. Quais as dificuldades e vantagens nessa ‘parceria’ de mão dupla?
Obtivemos informações com as próprias prefeituras e sabemos que o polo corresponde a 60% da arrecadação de imposto em Mauá e entre 25% a 30%, em média, em Santo André, além da geração de empregos. Hoje, o polo conversa muito com os municípios, que são bastante abertos e acessíveis ao diálogo, sobre a permanência do complexo na área, porque não é a situação ideal. Por meio de fotos, pode-se ver que quando a primeira unidade do polo foi construída, por volta de 1969, a área era muito grande. No entanto, naquela época ninguém se preocupou em preservar a área do entorno. Todo polo industrial, seja petroquímico ou qualquer outro, precisa de uma área preservada ao lado, porque, além de não atrair moradia próxima, ainda se pensa em expansões futuras, e aqui isso não aconteceu assim. O polo cresceu de forma rápida, e a população também, talvez até mesmo atraída pela empresa, pelas ofertas de trabalho. Hoje, não é possível ampliar a área da planta. Por isso, já iniciamos esse diálogo com as prefeituras, junto ao Consórcio Intermunicipal e à Agência de Desenvolvimento Econômico, a fim de reverem suas leis de zoneamento e de uso do solo, com o objetivo de evitar a saída do polo da região. Além de Santo André e Mauá, conversamos com a prefeitura de São Paulo, já que o parque industrial abrange parte do bairro São Rafael. Há mais ou menos seis meses contratamos consultoria que nos mostrou que as leis de zoneamento nessas três cidades permitem adensamento (mais gente morando em uma mesma área) e verticalização (prédios de 20 ou 30 andares, inclusive), o que não é bom para esse complexo.

Quem mora na região já viu alguma vez o fogo emitido pelo polo no céu. Muitos se assustam. Qual o motivo dessas chamas?
É o stack flare, que nada mais é do que uma chaminé alta que tem chama piloto no caso de instabilidade operacional com mais intensidade. Esse recurso é obrigatório ter e, por incrível que pareça, garante a segurança industrial e de todo o entorno.

Quais os projetos sociais e voltados à sustentabilidade encabeçados pela Braskem?
Há alguns anos já fazíamos estudos pelo fato de consumirmos muita água. O consumo no polo daria para abastecer uma cidade de 160 mil habitantes, para se ter ideia. E todo processo produtivo requer água na indústria química, o chamado quente e frio, e as temperaturas variam entre 800ºC até -160ºC. Vale ressaltar que a água não é usada para fazer o produto, mas sim no processo de produção. Por isso, devido à questão hídrica, desde 2010 existe o Aquapolo, sociedade de empresa privada junto à Sabesp que capta água de esgoto e a trata de modo que fique utilizável para a indústria. Essa água sai da estação de tratamento da Sabesp, a ETE de São Caetano, e chega até nós pelos dutos, abastecendo quase todas as empresas do polo. Esse é o maior projeto de reúso da América do Sul. Além da água temos indicadores do consumo de energia e geração de resíduos. Com isso, traçamos metas para redução. A sustentabilidade é um tripé: social, ambiental e econômico. Quando se consegue atingir isso, alcançamos melhores resultados.

E do ponto de vista social?
Atendemos basicamente a comunidade do entorno. Temos série de projetos. Dentre eles tem o de educação ambiental, onde dez escolas públicas de Santo André e Mauá utilizam material feito pela Braskem dentro da sala de aula. Nesse material falamos de coleta seletiva. O projeto acaba com o Ecofashion, um desfile nas escolas com roupas feitas de materiais reciclados. Outro projeto muito bacana é em parceria com o Sesi, que realizamos na estrutura do clube de funcionários do polo e atende 350 crianças por ano na formação esportiva.

E quanto ao chamado plástico verde...
É uma criação, inovação, da Braskem. Toda base da indústria petroquímica é produzida de nafta (subproduto do petróleo) ou gás, ambos produtos fósseis. E há dez anos criamos rota alternativa produzindo um tipo de plástico, polietileno, com base em cana-de-açúcar e etanol, ao invés do petróleo ou gás. Conseguimos uma fonte renovável, que deixa de emitir CO2, e passa a captar no processo de produção. Vendemos no mundo inteiro esse plástico verde, mas tem custo superior, por isso ainda não se desenvolveu no mercado. Hoje produzimos esse item na fábrica do polo no Rio Grande do Sul, e empresas que têm imagem mais ligada à sustentabilidade optam por ele.

Com a falta de espaço para expansão física, como investir no aumento da produção?
Todo ano investimos em modernização, é um dos maiores investimentos na indústria química/petroquímica pelo uso intensivo de capital, inclusive. O objetivo é que a produção chegue à capacidade produtiva dela e isso vale para demais indústrias. Para operar na capacidade máxima é necessário estar com todos os equipamentos em ordem, e uma fábrica que tem 46 anos precisa passar por evoluções, melhorias de processos, compra de equipamentos, produção menos impactante. Além disso, toda empresa química/petroquímica precisa fazer uma parada geral de manutenção de seis em seis anos. A última do polo aqui da região foi em 2014. Nesse evento tudo é desmontado, reavaliado, limpo e lubrificado, e a empresa aproveita para implementar melhorias. Nessas paradas há investimento e tecnologia.

Como foram os resultados no ano passado?
Só divulgamos o faturamento global, mas, ano a ano, tem crescido bem. A Braskem apresentou robustez em seus resultados de 2017, registrando lucro líquido recorde de R$ 4 bilhões, atribuível a todos os acionistas. Em dólar, a receita líquida da Braskem foi de US$ 15,4 bilhões, alta de 12% em relação a 2016.

Como o polo se comportou na recente crise econômica do Brasil?
Não afetou a Braskem como um todo, porque hoje é uma empresa globalizada. Há seis unidades nos Estados Unidos, um complexo no México e dois na Alemanha. Ao longo do tempo, foi adquirindo empresas aqui e no Exterior, portanto, estrategicamente, a Braskem não depende apenas de uma fábrica, acaba equilibrando os desempenhos e localmente se sofre menos. Outro fator é que a demanda por resina plástica, o que produzimos, caiu no mercado interno, mas, por outro lado, crescemos no volume exportado.

Qual a projeção do polo?
Há três anos recriamos o Cofip ABC (Comitê de Fomento Industrial do Polo do Grande ABC). Essa entidade, que já existiu no passado, nos ajuda a pensar em como podemos gerar mais valor para permanecermos aqui por mais anos, décadas. Pensando nisso, contratamos consultoria externa para fazer planejamento a longo prazo. Nós estamos instalados no maior mercado consumidor, que é São Paulo. Para se ter ideia, 50% da indústria química está no Estado. Então, se você está no maior mercado consumidor basta ser competitivo. Ter as condições ideais para nos mantermos aqui também é fundamental. Somos gerador de riqueza para a região. Daqui dez, 20 anos queremos estar melhores do que hoje, mais produtivos, por meio de significativos projetos de modernização, atraindo mais clientes e fornecedores para perto, já que o custo logístico é muito importante. Hoje, o polo é base para 90% das indústrias, imagina não existir mais esse complexo. 




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