O homem nao foi o primeiro primata a se erguer sobre as duas pernas: a proeza pertence a um mono primitivo, que existiu há cerca de 15 milhoes de anos, segundo a tese de uma cientista francesa. Segundo a teoria, algumas espécies de primatas abandonaram esta via de evoluçao, enquanto que outros, ancestrais do homem, aperfeiçoaram a aptidao até se converterem em bípedes.

Integrante do Centro Nacional de Pesquisas Científicas da França (CNRS), Yvette Deloison agrega a sua competência de paleontóloga profundos conhecimentos de anatomia e medicina legal. Em sua pesquisa, analisa detalhes ínfimos, como o ângulo formado entre ossos na articulaçao de fósseis.

Até o descobrimento, em 1974, na Etiópia, do australopiteco Lucy, de três milhoes de anos, os fósseis disponíveis para a pesquisa da passagem evolutiva entre quadrúpedes e bípedes eram extremamente escassos. Deloison foi uma das paleontólogas que estudaram o que muitos se apressaram a chamar de "avó" da humanidade. "Lucy apresentava muitas características de bípede, essencialmente nos quadris, mas também era dotada de pés com um grande dedo separado, que lembra os que os grandes símios possuem para se pendurar nas árvores", informou a paleontóloga à AFP.

"A evoluçao nunca marcha para trás: o pé humano, extremamente especializado no equilíbrio bípede, nao pode ter sido originado de um pé adaptado à vida nas árvores, igualmente especializado para sua funçao específica. De maneira que Lucy nao apenas nao deve ser ancestral do homem como também, nas investigaçoes sobre as origens do ato de andar sobre as duas pernas tem que partir de um grupo de primatas quadrúpedes, muito mais antigos, que teriam se erguido", afirmou. "Nao sabemos como aconteceu essa mudança, mas ela deu origem a três linhagens. A primeira se especializou com o tempo a andar sobre as duas pernas até desenvolver as habilidades do homem; a segunda levou aos australopitecos, ao mesmo tempo bípedes e arborícolas e a terceira linhagem deu origem aos grandes símios (orangotantos, gorilas e chimpanzés)", segundo Deloison.

As últimas descobertas respaldam esta hipótese. O "Australopithecus anamensis", descoberto em 1995 no Quênia, era bípede há quatro milhoes de anos. Posteriormente, em dezembro passado, ao estudar na gruta de Sterkfontein (Africa do Sul), o australopiteco chamado "Little Foot", a cientista francesa comprovou que a parte dianteira de seu pé era estritamente arborícola, enquanto que a parte traseira e a espinha dorsal correspondem mais a um bípede. "Esse fóssil é, grosso modo, da mesma idade que Lucy, talvez até mais antigo, com cerca de 3,3 milhoes de anos. Com um australopiteco perfeitamente bípede há quatro milhoes de anos, e dois mais recentes, menos bípedes, a adaptaçao à caminhada sobre os pés nao pôde ser posterior à adaptaçao à vida nas árvores. Curiosamente, foi o contrário. Compreende-se com este estudo que a anatomia dos pés é a peça-chave de toda a hipótese sobre a teoria da transformaçao dos ancestrais humanos de quadrúpedes em bípedes", afirmou a pesquisadora.

A paleontóloga afirma que "os pequenos monos quadrúpedes devem ter se separado de nossos ancestrais e dos símios antropóides há cerca de 25 milhoes de anos. Depois, há 15 milhoes de anos, na era dos bípedes primitivos, nós começamos a nos separar dos grandes símios". "Para minha surpresa, quando apresentei meu esquema a especialistas em genética, concluíram que todo ele "batia" com seus cálculos. Se dissemos que o chimpanzé é 98% igual ao homem, é porque foi o último a se separar de nós. Eu colocaria o grupo dos australopitecos, (alguns dos quais possivelmente aparentados com o homem e outros seguramente nao) entre nós e o chimpanzé", concluiu Deloison.