Economia Titulo
O longo caminho da burocracia para se abrir uma empresa
Danilo Angrimani
Do Diário do Grande ABC
29/05/2004 | 17:40
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Abrir uma empresa que vai gerar empregos para a região é um longo e quase intransponível calvário de filas, siglas, recolhimentos e formulários. Quem pretende ser um empreendedor deve saber que sem a companhia de um profissional habilitado estará muito próximo de cometer um suicídio contábil.

Outro problema é o acesso à internet. A maioria da documentação exigida pelas prefeituras e órgãos federais só pode ser obtida pela internet. Quem não tem computador em casa (caso de 86% da população) se sente um analfabeto da pós-modernidade. Acompanhe o périplo do repórter do Diário, que tentou – e não conseguiu – abrir uma empresa em Santo André, São Bernardo e São Caetano, sem contador e sem acessar a internet.

O atendimento varia de prefeitura para prefeitura, mas, em geral, é mais ou menos padronizado. O interessado recebe formulários para preencher e se filiar ao Cadastro Mobiliário do município. Na Prefeitura de Santo André não precisa ficar na fila. A moça que distribui os números da senha perguntou o que eu desejava e me entregou um formulário em duas vias.

O formulário traz quatro instruções no alto. A primeira já me colocou fora do baralho: “Preencha à máquina, sem rasuras ou emendas”. Faz uns dez anos que aposentei essa peça de museu. As outras três instruções são quase incompreensíveis para o leigo. A exigência número 2: “Use o verso para dados complementares”. Quais? A exigência número 3: “Consulte o Código Tributário Municipal”. Onde? A instrução número 4 era, de longe, a mais esquisita: “Se alteração, preencha apenas: nº CMC, razão social e o(s) campo (s) alterados”.

Voltei à Prefeitura de Santo André. De novo, não consegui passar da garota da senha. A mocinha de terno azul e blusa branca, irredutível: “O senhor só pode entrar com a documentação na prefeitura quando estiver com tudo pronto.”

Argumentei que não sabia quais os procedimentos e a atendente recomendou um contador. Disse que não tinha dinheiro para pagar por esse serviço e pedi orientação sobre onde teria de ir antes de entregar os documentos na prefeitura. “Na Receita Federal para pegar o CNPJ; e no cartório de pessoa jurídica, para o contrato social.”

Horários – Saí correndo da Prefeitura de Santo André em direção à Receita, em busca do CNPJ. Fui barrado na porta. Eram 16h45 e a Receita estava fechada. Decidi, então, correr ao “cartório de pessoa jurídica”, que fica na rua Xavier de Toledo. Cheguei às 17h05. Outra porta fechada. O expediente termina às 17h.

Embora exista só uma Receita no Brasil, os prédios da Receita da região seguem horários personalizados: em Santo André, funciona das 9h às 16h; em São Bernardo, das 8h30 ao meio dia; e das 9h às 13h, em São Caetano, “com limitação de senha”.

No dia seguinte, cheguei à Receita às 14h33. Meia hora de fila depois, a atendente me recebe na “triagem”. Pergunto se ela sabe o que é “CNPJ”. “Eu sei que é um documento que se obtém aqui na Receita.” Perguntei como se consegue esse documento. “Pela internet ou com um contador.” Disse que não tenho acesso à internet, nem posso pagar contador. “Aí eu não sei, o fato é que aqui no prédio da Receita de Santo André a gente não fornece esse CNPJ”, respondeu a atendente.

Fui ao “cartório de pessoa jurídica”, que é um cartório de emissão de títulos e documentos. A recepcionista disse que eles fazem apenas o registro do contrato social. Pergunto como se fez o esse contrato social e se há algum modelo. “A gente só registra. São muitos contratos, cada um tem um modelo específico...” De volta à estaca zero.




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