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Villas Bôas: FHC deveria desculpar-se com os índios
Do Diário do Grande ABC
23/04/2000 | 17:50
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O sertanista Orlando Villas Bôas, que há 56 anos se dedica à causa indígena, afirmou neste domingo que a única forma de o governo se desculpar com os povos indígenas, após a agressao sofrida por eles durante manifestaçao em Santa Cruz Cabrália, na Bahia, é o presidente Fernando Henrique Cardoso pedir perdao publicamente pelo o ocorrido. Na sua opiniao, a violência utilizada contra os indígenas demonstrou que, ao contrário do divulgado pelo governo, nao há respeito pela democracia. "Que democracia mais violenta é essa?", perguntou.

"O presidente Fernando Henrique deveria ir a público e dizer: 'índios, perdoem-me. Essa polícia é descontrolada', sugeriu o sertanista, sobre um suposto texto a ser dito pelo presidente.

"Fiquei impressionado e chocado com o que vi e li. Tenho dificuldades em acreditar que um homem culto como o presidente, que sabe que a sociedade indígena respeita outros valores diferentes aos dos brancos, tenha autorizado a agressao que ocorreu", completou ele.

Ao contrário do planejado pela organizaçao das comemoraçoes dos 500 Anos do Descobrimento do Brasil, em que os índios estariam entre os homenageados nos festejos, o confronto marcou com violência a presença de vários grupos indígenas reunidos no litoral baiano.

No final da manha de sábado, policiais militares baianos atacaram os índios que ameaçavam fazer uma marcha de 22 quilômetros de Santa Cruz Cabrália até Porto Seguro. Na açao policial foram disparados tiros e bombas de gás lacrimogêneo, além do uso de cassetetes.

Para o sertanista, a açao da polícia demonstrou a contradiçao entre o que prega o governo sobre o respeito à democracia e o que ocorre de fato. "O chamado sistema democrático atual, em que o governo é do povo, foi instituído pelos brancos, a sociedade indígena nao tem de respeitar isso", afirmou ele. "Os índios têm normas próprias que eles respeitam porque sao sua história e cultura. Eles nao têm obrigaçao alguma de saberem sobre as regras da sociedade branca, o que pode e o que nao pode ser feito".

Sem esconder a indignaçao, Villas Bôas ressaltou que a situaçao poderia ser pior se estivesse em vigor o novo Estatuto do Indio, documento que muda o tratamento do Estado em relaçao aos povos indígenas, diminuindo, por exemplo a atual tutela da Uniao sobre os indígenas. "O índio é outra gente e a lei definiu por isso, quando estabeleceu a tutela. O fim dessa proteçao pode agravar ainda mais a situaçao desses povos diante de episódios como o ocorrido no sábado. Quem vai protegê-los?", indagou.

Ao saber que um grupo de índios do Alto Xingú (regiao explorada por ele e os irmaos, na década de 50 e 60) fariam uma homenagem ao presidente Fernando Henrique, mesmo depois do conflito em Porto Seguro, o sertanista aproveitou para criticar a açao das organizaçoes nao governamentais (ONG) sobre as áreas indígenas. Na sua opiniao, os índios nem sabiam que poderiam "homenagear" uma autoridade porque podem ter sido convidados por uma determinada ONG, demonstrando a influência das organizaçoes.

"Temo muito por essas forças estranhas que atuam por trás das organizaçoes nao governamentais. As vezes, convidam os índios para apresentaçoes, outras explorando suas terras e, sempre interferindo na sua cultura e hábitos", disse o sertanista, em tom de lamento. "Gostaria muito que o presidente Fernando Henrique evitasse essa interferência permanente".




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