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Noite dos Tambores reúne 15 mil no Recife
Do Diário do Grande ABC
07/03/2000 | 17:26
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Nem mesmo as intervençoes da prefeitura de Recife sobre o ritual da Noite dos Tambores Silenciosos conseguiram tirar o brilho da cerimônia, que, por mais um ano, prendeu as atençoes de milhares de pessoas. Hoje, um público maior do que as 10 mil pessoas calculadas em 1999 se comprimiu no Pátio do Terço, bairro de Sao José, e nao adiantaram as arquibancadas e o palco instalados pela prefeitura ao longo da área.

Policiais militares estimaram em 15 mil pessoas o público presente. O ritual negro reuniu nove maracatus de naçao e quatro afoxés, na cerimônia de celebraçao dos ancestrais negros e dos orixás do candomblé, este ano comandada pelo tatá (hierarquia mais alta entre os pais de santo da religiao) Severino Martiniano da Silva, o mais conhecido como "Raminho de Oxóssi". Foi dele a voz que comandou as loas aos antepassados negros, aos orixás, pela força e fé para enfrentar a luta pela vida e pela paz entre os homens.

Antes disso, a rainha do maracatu Estrela Brilhante, Mariú, de Igarassu, a 100 quilômetros da capital, recebeu as reverências da noite. Aos 104 anos, numa cadeira de rodas, ela é a mais antiga rainha de maracatu e conduziu as loas do grupo, formado por muitos dos descendentes dela.

A cada ano, a cerimônia desperta mais curiosidade pelo misticismo e beleza, mas, de acordo com os preceitos religiosos da comunidade negra, nao pode deixar o local, que envolve história e tradiçao. As intervençoes da Secretaria Municipal de Cultura na tentativa de acomodar o público crescente e dar visibilidade ao ritual nao foram bem aceitas entre os participantes.

O palco armado impediu os maracatus de dançarem com os pés em contato com o chao, as entradas laterais para o palco obrigaram a longas caminhadas pelas vielas no entorno do pátio, desconcentrado os participantes, e as arquibancadas deram à cerimônia um traço de espetáculo que o ritual nao tem. Essas eram as principais queixas do público e dos integrantes de maracatus e afoxés, necessariamente adeptos do candomblé. "Viemos e fizemos o nosso melhor - pela fé, pela noite, pela preservaçao dos nossos valores, nossa história", afirmou o babalorixá Expedito Paula Neves, "Dito de Oxossi", criador do afoxé Ylê d'Egbá.

A controvérsia, entretanto, era anterior ao carnaval: a comunidade negra demonstrava perplexidade sobre a versao da origem do ritual propagada pela Secretaria de Cultura, segundo a qual as procissoes de maracatu que culminam na cerimônia do Pátio do Terço viriam de há 35 anos. Pesquisador da cultura negra, Dito de Oxossi disse se apoiar em pesquisas e na história contada pelos antepassados dele, segundo as quais a Noite dos Tambores incorpora a simbologia de uma prática vinda do século 18.

As procissoes negras de culto aos orixás saíam da Igreja do Rosário dos Pretos, com alegorias à cultura branca para escapar à repressao, e circulavam pelas ruas do bairro de Sao José, considerado berço cultural. "Na época do tráfico de escravos, vieram para Pernambuco, especialmente para essa regiao da cidade, muitos ministros ebás - (sacerdotes de uma etnia originada na regiao do Benin), e as práticas religiosas vêm, portanto de muito antes do que se quer fazer crer", disse ele.

No último dia de carnaval, 80 bonecos gigantes desfilaram em Olinda, com duas horas de atraso em razao da chuva ocorrida no fim da manha.

A noite, o multiartista Antonio Carlos Nóbrega entrava na Avenida Rio Branco, trazendo a poesia, a veia épica dos maracatus, o ludismo dos mamulengos que fez das apresentaçoes dele entre as mais concorridas atraçoes do carnaval acústico de Recife.




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