Internacional Titulo
EUA e França disputarão o Iraque pós-guerra, diz economista
Camila Marques
Do Diário OnLine
03/04/2003 | 18:19
Compartilhar notícia


Uma disputa comercial vai marcar o Iraque no período pós-guerra, caso a vitória seja norte-americana. Para Evaldo Alves, professor de Economia Internacional da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (EAESP/FGV), nesse cenário sai um oponente militar dos Estados Unidos, Saddam Hussein, e entra um comercial, a França.

Em entrevista ao Diário OnLine, Alves sustenta que americanos e franceses seriam apoiados, respectivamente, pela Inglaterra (principal nação aliada dos EUA no combate) e pela Alemanha (segunda maior opositora ao conflito). A disputa por contratos e acordos comerciais aconteceria em todos os países do Oriente Médio mas, por razões óbvias, teria características específicas no Iraque. 

"Se os EUA vencerem a guerra, no que se estão apostando, o mercado no Iraque vai ser dominado por eles, pela Inglaterra, Espanha e Portugal. E a França, que tem grandes acordos comerciais com o Iraque, vai sim perder espaço", explica Evaldo Alves, destacando que o antiamericanismo que vai crescer no Oriente deve, em contrapartida, aumentar a aceitação francesa na região.

Para o economista, o que realmente está em disputa nesta guerra é o petróleo. "Apesar de os EUA dizerem o tempo todo que o ‘ouro negro’ é dos iraquianos e será fundamental para que eles reconstruam seu país, é indiscutível que os americanos vão controlar sua comercialização", diz Alves. "O objetivo dos norte-americanos é controlar o insumo fundamental que movimenta as relações do Oriente com a Europa, Japão e China". Assim, em sua opinião, os americanos terão supremacia nas relações bilaterais no pós-guerra.

"Eles (EUA e Inglaterra) serão os vitoriosos da guerra e vão controlar o país com mão-de-ferro por um tempo. Ponto final", enfatiza Alves, que alerta: os EUA terão vantagem antes, durante e depois de se estabelecer um governo de fato formado por iraquianos. Não importa quanto tempo leve. "Os EUA terão a propriedade do Iraque, o controle do mercado. A posição americana vai ser muito mais cômoda que a dos outros países que também compram o óleo do Iraque. Vão ter preços mais baixos, por exemplo", completa o professor. Soma-se a isso a vantagem de que o Iraque possui a segunda maior reserva de petróleo do mundo - a primeira é da Arábia Saudita – e que o país hoje comandado por Saddam ainda tem muitas jazidas a serem descobertas, segundo especialistas.

Assim, é normal que empresários franceses temam por sua presença no Iraque no fim do conflito, na avaliação do economista. Até agora, a França era o maior parceiro comercial europeu do país, sendo responsável por 14% das importações até 2001. E em caso de vitória americana, a perspectiva não é das melhores. Na semana passada, por exemplo, o congressista americano Jim Saxton recomendou um bloqueio às empresas francesas na futura reconstrução do Iraque.

Relação bilateral - Apesar da competição comercial no Oriente Médio, as relações bilaterais entre Estados Unidos e França, segundo Evaldo Alves, não devem esfriar. "Podem sofrer um pequeno abalo, inicialmente nas exportação e importações nos dois lados. Mas a tendência é que a perda não seja muito grande por razões óbvias: com a globalização, o comércio fica muito integrado. Há itens importados e exportados fundamentais para fazer trabalhar linhas de produção", explica ele. O mesmo acontecerá com a Alemanha, com a qual as trocas devem cair, no máximo, 10%, segundo estimativa do economista.

A relação comercial entre EUA e Inglaterra com outros países que se colocaram contra a guerra também não devem mudar muito, aposta Alves. "A situação pode se complicar mais para a China, porque ela é totalmente dependente do petróleo importado. A Rússia — acusada pelos EUA de fornecer armas ao Iraque — não terá problemas porque é autosuficiente nesse aspecto. O principal impasse deve permanecer no campo político e tecnológico".

Brasil - Para o Brasil, que também se posicionou contra a ofensiva, o impacto não deve ser diplomático, e sim econômico. Mas não necessariamente negativo. "Acho errado muitos analistas falarem que o mercado brasileiro funciona movido a boatos, seguindo notícias pontuais internas ou externas. O fato é que o Risco Brasil está caindo e que nossas exportações estão crescendo, inclusive para o Oriente Médio. No ano passado exportamos cerca de US$ 1 bilhão para o Oriente, e não só de matéria-prima, mas também alguns produtos industrializados. Neste ano se estima que vá subir para US$ 2,4 bilhões e, em quatro anos, facilmente dobraremos esse valor, para até US$ 5 bi", opina.

Do lado empresarial, o lado negativo da guerra remete à queda no fluxo de investimentos externos, princípio no qual a política econômica brasileira é baseada. "Antes se imaginava receber em 2003 US$ 16 bilhões (de investimentos externos), depois o governo baixou essa estimativa para US$ 15 bilhões e, com a guerra, se esperam no máximo US$ 13 bilhões. A conseqüência é uma menor taxa de crescimento e a restrição da possibilidade de investimentos pelo governo".

Mesmo assim, avalia o economista, "o lado bom", o da manutenção ou crescimento do volume de exportações, sobrepõe-se à queda de investimentos. "Não vamos chegar a ganhar com a guerra, mas o impacto não será ruim assim", garante o economista.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;