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O pavio curto que tanto incomoda

As estimativas apontam para populações gigantescas nas maiores cidades do planeta...

Rodolfo de Souza
22/10/2015 | 07:00
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As estimativas apontam para populações gigantescas nas maiores cidades do planeta no ano de 2050, é o que vi recentemente na TV. A essa constatação chegou, finalmente, o pessoal que está sempre envolvido com estatísticas e adora comprovar com tabelas e números situações que dizem respeito a gente, clima, trânsito e um sem-fim de dados relacionados a este mundo do qual fazemos parte eu e você, caríssimo leitor.

Fiquei, inclusive, surpreso em saber que dentre cinco pessoas, três habitarão os grandes centros urbanos. A bem da verdade que estarei um tanto velhinho nessa época, o que não chega a chatear, uma vez que tenciono continuar atuando neste teatro até o consumar dos meus dias, momento em que verei, cheio de consternação e deleite, os jovens ouvindo embevecidos as histórias dos adultos sobre a caótica e saudosa vida de outrora.

Apesar de que, tem sérias dificuldades em imaginar dias piores quem vive o cotidiano de hoje, caos que remete a uma perspectiva pouco otimista que, aliás, me leva a ter saudades de antigamente ou mesmo de um tempo que não vivi. Por isso, chego a duvidar que esse povo consiga de fato ir tão longe. Imagino mesmo que as pessoas acabarão por devorar umas às outras, bem antes disso.

A conclusão, um tanto funesta, tem certamente sua origem no comportamento do ser humano que habita este início de século, não a metade dele. Basta que se dê uma olhadinha à sua volta e nos noticiários e nas conversas de pé de ouvido para, enfim, descobrir que a solidariedade, a compreensão e o bom-senso são prerrogativas que cabem somente a uns poucos. O resto é balela.

O trânsito caótico das grandes cidades é, sem dúvida, um exemplo de como funciona a lógica desta barbárie. O que até me leva a recordar um desenho antigo em que o Pateta tinha um tipo dócil de personalidade e, ao entrar no seu carro e pegar no volante, transformava-se num demente. Assim é, pois, a maior parte desse povo que dirige, incluindo eu mesmo. A despeito do meu esforço em fazer direitinho a lição de casa e admitir certas navalhadas, sobretudo aquelas das quais sou forçado a fazer uso quando a situação assim exige. Como aconteceu um dia destes em que utilizei a ferramenta da imprudência para cumprir um horário previamente estabelecido para compromisso inadiável, salvaguardando, assim, a minha reputação.

Mais imprudente, todavia, não contei com a possibilidade da minha atitude despertar a ira alheia.

Estava, pois, na direita de uma ruazinha de mão dupla, subida que atravessa uma avenida movimentada. Neste local, em alguns momentos do dia, a fila se estende por causa do semáforo que demora a abrir e fecha muito rápido. E eu olhando para a esquerda livre, tal qual um gato olha para o pássaro bem à sua frente, não resisti e empreendi fuga por ali mesmo, assim que o farol esverdeou, ganhando rapidamente o cruzamento.

Antes disso, contudo, numa rua que também dá para o tal cruzamento, outro carro aguardava para entrar. E, sem a menor intenção de ultrajar seu ocupante, eu o impedi de seguir à minha frente. Foi quando o sujeito que vinha ao volante perdeu a compostura, se é que tenha nascido com alguma.

Tendo, assim, meu retrovisor como testemunha inconteste, fiquei estarrecido com o comportamento daquele que, inconformado com a minha ousadia, passou a desfiar impropérios que eu aqui não tenho coragem de repetir. Por várias vezes colocou em dúvida a idoneidade moral de minha santa mãezinha, que Deus a tenha. Também botou em xeque, em alto e bom tom, o respeito que a minha senhora tem com a minha pessoa. Vociferou, gritou tanto que eu pensei que fosse ter um colapso, tal a quantidade de espuma que lhe escorria pelo canto da boca.

Percebe, agora, onde pretendo chegar com o meu pessimismo, caro amigo?

* Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André. É professor e autor do blog cafeecronicas.wordpress.com

E-mail para esta coluna: souza.rodolfo@hotmail.com. 




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