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Julgamento inédito de ex-militar argentino começa em Madrid
Do Diário OnLine
Com Agências
14/01/2005 | 17:51
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O ex-oficial da Marinha Adolfo Scilingo, 58 anos, começou a ser julgado nesta sexta-feira, na Audiência Nacional Espanhola, pelos crimes de genocídio, terrorismo e torturas durante a ditadura militar (1976-1983). Esta é a primeira vez que um tribunal estrangeiro julga crimes contra a humanidade cometidos em outro país com o acusado presente no tribunal.

O réu, que está em greve de fome desde o dia nove de dezembro e já perdeu 13kg, apareceu ao tribunal enrolado com um cobertor escuro demonstrando aparente abatimento. O ex-militar teve de ser internado na quarta-feira e, poucos minutos antes do inicio do julgamento, passou mal novamente. O presidente do tribunal, Fernando García Nicolás, prosseguiu a sessão depois que os médicos presentes garantiram que o réu estava em condições de depor.

Mais de 175 testemunhas prestarão depoimento durante o julgamento, que pode se prolongar por mais de dois meses.

Acusações - Scilingo, que atuou entre 1976 e 1977 na ESMA (Escola de Mecânica da Armada), um dos piores centros de tortura de clandestinos do regime militar, com a patente de tenente de corveta, é objeto de uma acusação de 30 assassinatos, 93 lesões corporais, 255 ações terroristas e 286 torturas. O ex-oficial, se condenado, pode pegar até 6.626 anos de prisão.

Em março de 1995, quase 20 anos depois do golpe militar, Scilingo confessou publicamente ter participado dos 'vôos da morte', durante os quais foram atirados vivos ao mar entre 1,5 mil e dois mil presos políticos. "Abríamos a porta do avião e atirávamos os prisioneiros nus ao mar, um de cada vez", explicou Scilingo ao jornalista argentino Horacio Verbistky.

Passaram pela ESMA cinco mil dos 30 mil desaparecidos durante a ditadura militar. Apenas uma centena sobreviveram às sessões de tortura, sendo que alguns destes sobreviventes prestarão depoimento em Madri. Em outubro de 1997, o próprio Scilingo, que tinha viajado à Espanha a convite de um programa de televisão, chegou a confessar sua participação na repressão.

No entanto, em 4 de novembro de 1999, o ex-capitão arrependido desmentiu suas declarações ante o magistrado Baltasar Garzón, que em 1998 havia proibido Scilingo de deixar o território espanhol. Em julho de 2001, Garzón decretou sua prisão incondicional para evitar que fugisse.

Foram interpostos vários recursos, sob o argumento de que a justiça espanhola não tinha competência para julgar crimes cometidos fora da Espanha. Garzón sempre citou o artigo 23.4 da LOPJ (Lei Orgânica do Poder Judicial), que reconhece a competência espanhola para investigar 'atos cometidos por espanhóis ou por estrangeiros fora do território nacional (...) como crimes de genocídio ou terrorismo'.

O Supremo Tribunal espanhol autorizou em novembro de 2004 a Audiência Nacional, principal instância penal espanhola, a julgar Scilingo, após considerar que espanhóis foram vítimas dos crimes dos quais é acusado, e que ele não é objeto de qualquer ação judicial na Argentina.

Scilingo não foi o único repressor argentino a ser julgado no exterior, mas é o primeiro que assistirá pessoalmente a seu processo. O ex-capitão de fragata Alfredo Astiz, o 'anjo vermelho da morte', que também pertenceu à ESMA, foi condenado à revelia, em 1990, por um tribunal de Paris à prisão perpétua pelo seqüestro e desaparecimento das religiosas francesas Alice Domon e Léonie Duquet.




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