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Burocracia e falta de crédito impedem evoluçao da microempresa
Do Diário do Grande ABC
30/10/1999 | 13:08
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Nos últimos quatro anos, o governo federal anunciou pelo menos três pacotes de refinanciamento de dívidas bancárias, dois de refinanciamento de dívidas fiscais e criou três fundos de aval para facilitar a vida, aumentar o crédito disponível e regularizar a situaçao de 4,5 milhoes de micro e pequenas empresas, além de tentar trazer outras tantas para a formalidade. Mas até a semana passada, numa área próxima ao Lago Norte, a poucos quilômetros do Palácio do Planalto, onde aquelas medidas foram tomadas, o marceneiro Jean Carlos da Silva Santos, um dos muitos microempresários que trabalham ali, revelava que pouca coisa havia mudado na vida destas pessoas.

'Aqui todo mundo está ilegal``, afirma. É um exemplo de que a burocracia e a falta de crédito continuam sendo os grandes entraves para a evoluçao da microempresa, apesar de tantas medidas do governo, diz José Constantino de Bastos Jr., coordenador do Departamento Jurídico do Sindicato dos Contabilistas do Estado de Sao Paulo (Sescon). 'O que vemos é uma chiadeira enorme e o fechamento de microempresas por causa dos juros escorchantes e a elevada carga tributária``, diz Constantino.

Apesar de o governo ter destinado R$ 8 bilhoes para crédito à microempresa, o que se tem hoje está restrito aos programas operados exclusivamente pelos bancos oficiais (Caixa, Banco do Brasil, Banco do Nordeste) e o mais fácil é encontrar microempresários que se queixam por nao terem acesso ao crédito oficial, por excesso de burocracia ou por nao oferecerem as garantias exigidas pelos bancos. Os dois fundos de aval lançados nos últimos três anos para ajudar os microempresários a obter empréstimos nunca funcionaram muito bem. 'Uma das razoes pelas quais o fundo de aval nao decolou é a exigência de certidoes negativas no Cadin (o Cadastro de Inadimplentes do governo federal). Poucos sao os empresários que têm essa certidao``, explica um alto executivo de um dos maiores bancos privados do país.

No início de outubro, o presidente Fernando Henrique Cardoso lançou novas medidas de apoio à microempresa. Reduçao de IOF, um terceiro fundo de aval, o Fumproger, ampliaçao de prazos, perdao de dívidas e outras facilidades estao dentro do novo pacote. Dinheiro novo, nao há: os R$ 8 bilhoes anunciados já existiam e apenas foram somados e lançados de novo.

O governo sempre sonhou em dividir a tarefa de financiar microempresários com os bancos privados mas nunca conseguiu. A nova cartada foi uma circular do Banco Central, de número 2.934 (5/10/99) que altera as regras para cálculo da ponderaçao de risco dos bancos. De acordo com a circular, será considerado nulo o risco de crédito do banco que fizer um empréstimo a microempresas, desde que a operaçao seja garantida por um fundo de aval.

'Entendemos que haverá grande interesse dos bancos porque o sistema sempre pensava que os spreads (taxas de risco) eram pequenos nas operaçoes com microempresas e ainda oneravam os limites``, diz o chefe do Departamento de Normas do Banco Central, Carlos Eduardo Lofrano. Estes limites a que Lofrano se refere sao os estabelecidos por um tratado internacional chamado Acordo da Basiléia, que fixou parâmetros para que os bancos emprestassem dinheiro de acordo com sua capacidade de captaçao e seu capital próprio.

Cético, um diretor de banco que preferiu nao se identificar disse que continua achando muito arriscado emprestar e que essa medida nao vai funcionar. 'Nao adianta impor medidas administrativas, distorcer a realidade. Estamos falando de riscos mais elevados, altos custos administrativos. Nao vejo estímulo em emprestar mais para as microempresas". 'Vamos ser realistas: financiamento à microempresa é um desafio em todos os países do mundo``, reconhece o presidente da Caixa Econômica Federal, Emílio Carazzai. A Caixa está se preparando para entrar com R$ 2 bilhoes dos R$ 8 bilhoes em recursos públicos para financiar microempresas e fazer 260 mil operaçoes em um ano. O dinheiro já está disponível nas agências da Caixa mas será necessário que o microempresário apresente um Plano de Negócios e tenha passado por um treinamento gerencial. Se ele nao cumprir este requisito, poderá contar com agentes empresariais que prestam esse serviço no próprio banco, explica Antonio Limoni, superintendente nacional de Produtos Bancários da Instituiçao.

A absurda taxa de juros praticada no Brasil pode ser explicada pelas dificuldades macroeconômicas dentro e fora do país, que resultam na carga tributária elevada. Por esses dois motivos é que os bancos privados ficam fora do crédito à microempresa. Mas a burocracia, para o coordenador do Sescon, nao tem explicaçao: 'A Lei 8.864 (de 28 de março de 94), que foi revogada agora com a aprovaçao do Estatuto da Microempresa, já determinava que o Poder Executivo deveria procurar desburocratizar a atividade das microempresas. O estatuto só repetiu o que já deveria estar sendo feito há muito tempo``.




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