Economia Titulo Contrato suspenso
Lay-off gera tensão e medo de demissão

Trabalhadores com contrato suspenso sofrem com renda inferior e ameaça de desemprego

Fábio Munhoz
Leone Farias
Do Diário do Grande ABC
12/04/2015 | 07:18
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Previsto na legislação federal, o lay-off é a suspensão do contrato de trabalho por intervalo entre dois e cinco meses. Durante esse período, parte do salário é paga com recursos da União, por meio do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), e outra é depositada pelo empregador. A medida foi incorporada à CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) em 2001 e, desde então, passou a ser utilizada por empresas para adequar a produção em momentos de crise econômica.

Apesar de o funcionário ser afastado de suas atividades profissionais e continuar tendo algum rendimento, engana-se quem pensa que esse período é semelhante ao das férias remuneradas. O principal temor de quem está com contrato suspenso é o de que a situação econômica do País não melhore até o fim do período lay-off e, assim, seja dispensado durante ou depois do afastamento. Outro problema é a redução da renda familiar, pois a legislação determina que o máximo que cada trabalhador pode receber do FAT é o mesmo teto do seguro-desemprego, de R$ 1.385,91. A complementação dos vencimentos fica a cargo de cada empresa – que pode inteirar o restante do salário ou pagar apenas uma parte.

Na fábrica da GM em São Caetano, um dos colaboradores afastados desde novembro revela que as 819 pessoas com os contratos suspensos estão recebendo cerca de 25% a menos do que o valor do salário. O grupo deveria retornar na sexta-feira, mas ficará em casa por mais três meses, pois a montadora decidiu prorrogar a suspensão até o dia 9 de julho.

Pai de duas filhas, o trabalhador, que não quis se identificar, teve de adequar o orçamento doméstico para conseguir honrar os compromissos financeiros. “Mas é difícil, pois, quando ficamos em casa, acabamos gastando mais com comida, água e conta de luz. Ainda bem que minha mulher trabalha e ajuda a pagar as contas, entre elas a do aluguel.”

Portador de doença ocupacional, ele não pode desenvolver outras atividades remuneradas durante o afastamento, pois corre o risco de ser penalizado. “Então, fico em casa, ajudo minha mulher e cuido da minha filha menor.” Às quartas e quintas-feiras, passa o dia todo em curso de assistente de produção no Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), uma das exigências previstas em lei como contrapartida ao pagamento dos recursos do FAT.

Na quinta-feira, quando recebeu a notícia de que a montadora decidiu prorrogar o lay-off, o sentimento foi de frustração. “Fiquei chateado, mas é melhor assim do que ficar desempregado. E, acompanhando o noticiário político e econômico do País, é difícil ficar otimista. Ficamos desestruturados e com medo de ser demitidos.”

“É uma panela de pressão, uma situação bastante delicada, nos sentimos abandonados, o que sabemos (sobre a empresa) é por intermédio dos colegas”, afirma um dos 715 metalúrgicos com contrato suspenso da fábrica da Mercedes-Benz em São Bernardo que, igualmente, pediu para não ser identificado. O prazo final do lay-off desse pessoal é dia 30. Ele, que também tem doença profissional, está em casa desde julho do ano passado, já que a suspensão inicial, de cinco meses, foi prorrogada em novembro.

Para esse funcionário da Mercedes, a restrição médica, que proporciona estabilidade, conforme o acordo coletivo, lhe dá esperança de ainda voltar ao trabalho. “Mas a empresa pode passar por cima disso e demitir assim mesmo”, diz, apreensivo. Para suportar a angústia desses dez meses de incerteza, ele procura se distrair lendo jornais e revistas e convivendo com a família nas horas vagas ao curso de auxiliar de produção que é obrigado a fazer para ter direito a seu rendimento.

SEM SALÁRIO - A situação financeira de outro operário da Mercedes que também terá a identidade preservada se complicou quando foi afastado em 2009. Ele realizou uma viagem que já havia programado com antecedência e não cumpriu presença mínima em curso obrigatório de capacitação. “Quando fui à agência da Caixa Econômica Federal para receber, por meio do Cartão Cidadão, disseram que não havia nada disponível”, lembra.

O momento só não foi mais desesperador porque o metalúrgico realizou trabalhos por fora, o que possibilitou a entrada de renda para a família, já que sua mulher trabalha em casa e ele tem dois filhos. “Mesmo assim, eu estava me arriscando, pois, se eu sofresse algum acidente, não teria direito a receber auxílio-doença, além de correr o risco de a montadora me demitir por justa causa.”

Quando esteve afastado, a única comunicação oficial com a fábrica era por meio de cartas. “Quando chegava alguma correspondência, todos em casa ficávamos em pânico, pois não sabíamos se era uma convocação para o retorno, aviso sobre prorrogação do lay-off ou comunicado sobre demissão.” Para piorar ainda mais a angústia, os boatos que circulavam na ‘rádio-peão’ eram frequentes.

Outra reclamação é referente à Previdência. Durante a suspensão do contrato de trabalho, não é feita a contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). “Ou seja, vou ter de esperar mais tempo para me aposentar”, lamenta.


Região tem 1.534 empregados afastados

O Grande ABC tem hoje 1.534 trabalhadores em lay-off. Desse total, 819 são da unidade da General Motors em São Caetano e, 715, da planta de São Bernardo da Mercedes-Benz. De acordo com as últimas informações oficiais divulgadas pelas montadoras, o excedente de funcionários é de 1.070 na GM e 1.200 na Mercedes.

Os contratos dos 715 empregados da Mercedes foram suspensos em julho – eram 750, mas 35 retornaram em fevereiro. O grupo deveria voltar à fábrica em novembro, mas a companhia decidiu prorrogar o afastamento até abril. O volume de afastados corresponde a 6,8% do total de 10,5 mil funcionários.

Na GM, os 819 trabalhadores estão em casa desde novembro e teriam de voltar à firma na sexta. Entretanto, a montadora decidiu renovar o lay-off até 9 de julho, alegando necessidade de “ajustar a produção à atual demanda do mercado”. O montante equivale a 7,4% dos 11 mil profissionais da unidade.

Na Ford de São Bernardo, 424 colaboradores estão em banco de horas por tempo indeterminado desde o fim de fevereiro. O número de funcionários equivale a quase 10% do efetivo total da empresa – de cerca de 4.500 pessoas.

CADEIA - A quantidade de trabalhadores em lay-off deve aumentar ainda mais neste mês, já que a Pirelli anunciou que cerca de 450 empregados da fábrica de pneus em Santo André devem ser afetados pela medida e afastados até o fim do mês.

O setor automobilístico é um dos mais atingidos pelo momento de crise no País. A Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) divulgou na semana passada projeção de que a produção do segmento deverá ser 10% menor neste ano em relação a 2014, atingindo mesmo nível de 2007.

No primeiro trimestre, o número de unidades fabricadas no Brasil teve queda de 16% ante o mesmo período do ano passado, pior resultado em oito anos. 




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