O advogado Roberto Podval lança candidatura de oposição à atual gestão da OAB-SP, comandada por Luiz Flávio Borges D'Urso, que será o pleiteante do PTB à prefeitura da Capital no ano que vem. Famoso por trabalhar em casos de grande repercussão nacional - como a defesa do casal Nardoni, acusado de jogar pela janela a menina Isabella, em 2008, e de funcionário da Casa Civil na CPI dos Bingos, em 2005 -, Podval afirma sem papas na língua: "A Ordem tem sido utilizada como trampolim político". O discurso também já está preparado. "Não tenho nada contra o D'Urso, é uma das pessoas mais agradáveis para se conversar, sou simpático a ele, mas advogado de balcão nunca foi (...) Falta advogado dentro da Ordem. Tem burocratas e políticos, mas advogados não vejo." Aos 45 anos, 23 deles dedicados à profissão, formado pela FMU e mestre pela Universidade de Coimbra, em Portugal, Podval está de olho na "falta de expectativa" dos advogados paulistas em relação à entidade. "Nós achamos que há espaço, um vácuo de nomes novos." A eleição para a presidência da OAB-SP será realizada em novembro do ano que vem. O advogado lança candidatura no Grande ABC - nas próximas semanas se reunirá com os comandantes das OABs locais - e depois percorrerá o Interior. A seguir, os principais trechos da entrevista.
DIÁRIO - O que o faz buscar neste momento a presidência da OAB-SP?
ROBERTO PODVAL - Minha trajetória, minha história, o sucesso que obtive na profissão eu devo à advocacia. Está na hora de retribuir. A situação está muito difícil. Por exemplo, é inadmissível para entrar num Fórum, que é meu local de trabalho, apresentar a carteira e passar por um detector de metal e abrir minha pasta. Nunca a advocacia esteve tão em baixa. A Ordem tem sido utilizada como trampolim político. O D'Urso passa por três eleições e depois se candidata a prefeito de São Paulo. É um absurdo. Durante esses anos ele não tomou atitude, não enfrentou situações porque seria candidato à prefeitura. É óbvio que há limitações políticas para quem vai ser candidato.
DIÁRIO - Por exemplo?
PODVAL - Escritórios de advocacia foram invadidos (pela Polícia Federal) e não vi reação da OAB à altura. Por quê? No primeiro escritório invadido era de se esperar que a OAB, na pessoa de seu presidente, fosse ali para nem que fosse para fazer um ato político e dizer: ‘não, isso não será feito aqui'.
DIÁRIO - O atual presidente está no terceiro mandato consecutivo. Está na hora de mudar o estatuto?
PODVAL - O meu comprometimento é de que reeleição não acontecerá. Houve isso no passado e se repete agora. Ficar nove anos no poder? Houve grande debate recente de que o presidente da República não pode ter três mandatos seguidos e o presidente da OAB-SP passa a ser conduzido ao cargo pela terceira vez. Para quê? Tinha algo a se fazer que não foi feito em seis anos? Não havia um candidato à altura? A situação não tinha um nome? Eu fico três anos. A ideia é contribuir um pouco. Tem de sair dessa mesmice, sempre mais do mesmo e ninguém vê um passo à frente. As grandes questões do advogado ficam esquecidas.
DIÁRIO - Mas o advogado não tem parcela de culpa, pois é ele que elege seu comandante?
PODVAL - O voto não é obrigatório. E aí fica difícil. Há falta de expectativa porque não tem novidades. Nós achamos que há espaço, um vácuo de nomes novos, há pessoas interessadas. A ideia é montar um grupo novo, chamar para a Ordem aqueles que nunca estiveram lá. Está na hora de a Ordem ser representada efetivamente por advogados, não mais por políticos. Eu não tenho interesse nenhum político. Não tenho nada contra o D'Urso, é uma das pessoas mais agradáveis para se conversar, sou simpático a ele, mas advogado de balcão nunca foi. Isso é questão de história. Eu fui sempre advogado. Apanhei quando defendi os Nardoni e onde estava a Ordem? Estava na CPI, o ACM (senador Antônio Carlos Magalhães, que morreu em 2007) cassa a palavra, a gente brigando no Congresso e cadê a Ordem? O que ela fez? Quais são as grandes bandeiras em relação à advocacia? Isso não vejo. O Interior inteiro está largado. Não há apoio nenhum.
DIÁRIO - Qual seria a solução?
PODVAL - É ter efetivamente advogados na Ordem. Queremos prerrogativas que funcionem antes, não depois. Depois que alguém for cerceado, humilhado, serve para quê? Fazer desagravo? A ideia é antecipar esse processo, conversar com os tribunais, corregedorias, juízes e perguntar o que está faltando. A situação é caótica. As pessoas hoje são presas na maioria das vezes (nós advogados) não temos acesso às razões que levaram à prisão. Precisou o Supremo Tribunal Federal sumular que o advogado tem direito a olhar os autos. A OAB fez ou faz alguma coisa? Não. Nos últimos noves anos, quantas vezes os advogados tiveram o sigilo quebrado em conversas e oitivas com seu cliente, com gravações autorizadas pelo Judiciário? Eles vão dizer que autorizaram ouvir o cliente, mas a conversa está lá, com o advogado. E o quê a Ordem fez? Nunca se preocupou com isso. Falta advogado dentro da Ordem. Tem burocratas e políticos, mas advogados não vejo. Vamos tentar dar opção aos advogados escolherem por quem advoga.
DIÁRIO - Há algo de positivo na atual gestão? D'Urso diz que organizou as finanças, tirando deficit de R$ 6 milhões para superávit de quase R$ 30 milhões, e que promoveu avanços tecnológicos e de formação em informática para os advogados.
PODVAL - Em termos de gestão empresarial foi muito boa. Tem méritos, mas faltou a advocacia, a proteção, tutela para a advocacia.
DIÁRIO - A exposição do sr. na mídia atrapalha ou ajuda na candidatura?
PODVAL - Espero que ajude. Acaba sendo fruto da resposta de um trabalho. Imagino que a classe olhe isso como um advogado que, assim como brigou e briga em prol dos clientes, brigará em prol das prerrogativas de cada um dos advogados paulistas.
DIÁRIO - É possível a OAB opinar em outras frentes, como aumento do número de vereadores, um escândalo ou outro político?
PODVAL - A advocacia encabeçou grandes movimentos, mas hoje não mais. Acho que a gente devia opinar mais dentro da nossa própria casa. A valorização da magistratura é um caso. Precisa ser forte, digna. A magistratura está enfraquecida, com salários baixos. Temos a Defensoria Pública abandonada, em pé de guerra com a Ordem. Os defensores merecem ter o prestígio da OAB, que pode pressionar o governo para aumentar o número desses profissionais. Hoje temos um convênio importante com os advogados do Interior, que suprem a falta de defensores públicos. Isso deve ocorrer, porque grande parte dos advogados vive desse convênio, ainda que sejam pagos mal. A defensoria tem de trabalhar junto com a Ordem para indicar como esse convênio deve ser feito. Hoje há conflito desnecessário. Dá para fortalecer as duas frentes.
DIÁRIO - O sr. é a favor do exame da Ordem, que chega a reprovar 90% dos bacharéis?
PODVAL - Numa situação ideal, seria desnecessário. Deveríamos ter faculdades preparadas para quando os alunos saíssem estarem aptos a exercer a profissão. Mas temos problemas. As faculdades não estão aptas, os alunos entram na faculdade sabendo menos do que precisariam e a Ordem precisa fazer o exame. Se por um lado tem o exame, por outro teria de buscar a resolução do problema. O exame não soluciona. Só restringe os profissionais de exercer a profissão. É preciso cobrar das faculdades. A Ordem tem o poder político de pressionar junto ao Ministério da Educação e dizer: ‘ali existe um problema'. A OAB tem o retrato da realidade das faculdades. É também um problema político, financeiro e eleitoral. O resultado da prova tem de ser cobrado de alguém. Faça uma campanha pública dos resultados, mostre quem é quem nas faculdades. A faculdade para sobreviver terá de ser boa.
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