Cultura & Lazer Titulo
Nem tão bem lembrado
Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
03/05/2009 | 07:50
Compartilhar notícia


O ator Paulo Gracindo (1911-1995) surpreendeu o público quando, aos 60 anos, interpretou o carismático bicheiro Tucão na novela Bandeira 2 (1971). De onde tinha vindo tão completo ator? A consagração popular veio quando "deixou os entretantos e partiu para os finalmentes" com o prefeito corrupto e engraçado Odorico Paraguaçu, na novela O Bem-Amado (1972), a primeira em cores da televisão.

O raio caiu duas vezes no mesmo lugar, na Globo, e continuou caindo até uma quase cegueira e um câncer levarem aquele que se tornou parâmetro de atuação popular com qualidade na teledramaturgia brasileira. Paulo Gracindo vinha do teatro, do rádio e do cinema. Um artista completo, sucesso em diversas mídias, e esquecido pelo veículo que ele mais ajudou a construir.

Gracindo Jr., seu filho e também ator - atualmente na Record, na novela Poder Paralelo -, rende homenagem ao pai no documentário Paulo Gracindo - O Bem-Amado, em cartaz na Capital. Novelas com Paulo Gracindo não são reprisadas na TV aberta por questões mercadológicas. Filmes só altas horas da madrugada. Em 2005, Amor Bandido (1978), e no mês passado, Tudo Bem (1979), foram os dois últimos. É pouco para quem era respeitado pelos colegas,por autores e diretores e que definiu o jeito de fazer televisão, então influenciada pelo rádio.

Paulo (ou Pelópidas Guimarães Brandão Gracindo) foi galã de radionovelas - era o dr. Alberto Limonta em O Direito de Nascer -, quando o rádio era a Globo dos anos 1930 a 1950. A debandada de artistas da Rádio Nacional do Rio em 1964, graças ao golpe militar, o forçou a buscar outro veículo.

O documentário é narrado por Gracindo Jr., que fala como se fosse seu pai, um texto de lembranças, incluindo suas irmãs. Mergulha no homem porta adentro de casa, como diz Gracindo Jr. ao Diário, e no homem que tinha outra imagem pública. "Eram nitidamente duas pessoas. Rígido em casa, como meu avô; mas porta afora era um liberal, festivo. Dava mais atenção a seus personagens, vivia com na mão". No fim do filme, o filho reproduz a frase do pai: "Eu vivi no palco e representei na vida". "Ele elegeu como seu epitáfio. Tinha muito medo da morte, era agarrado com a vida, lia muito sobre esses temas, muita poesia." Mas é um verso, dito por Paulo Gracindo sobre ele mesmo no documentário, que representa melhor a obra de seu filho: "Esse estranho que mora no espelho (e é tão mais velho do que eu) olha-me com um jeito de quem procura adivinhar quem sou", de Mário Quintana.

Gracindo levou três anos para concluir pesquisa, material de arquivo e finalização do filme. Poucas imagens do teatro, sem áudio do rádio, ausências de novelas na TV e cenas de cinema denotam mais a falta de memória da cultura nacional do que as irregularidades do diretor.

Mas é uma oportunidade de (re)ver Paulo Gracindo. E por quê? Fernanda Montenegro, uma das entrevistadas, dá a pista. Gracindo fazia personagens quando a TV "tinha personagens para mostrar". Lima Duarte dá outra pista: "Acho que Gracindo anda por aí, com um sorriso maroto, falando dessa televisãozinha que estão fazendo". Gracindo Jr. concorda: "Acharam fórmulas, ninguém arrisca mais, atores fazem textos ridículos em produções mais ridículas. Hoje, dois casos de amor e uma goiabada fazem uma novela".

Outra oportunidade será quando for exibido na TV aberta, se a a Globo lembrar de um de seus ícones.

Principais obras

Novelas na TV (todas na Globo)
Mulheres de Areia (1993) - Padre
Deus nos Acuda (1992) - embaixador no Céu
Vamp (1991) - Arlindo Cachorrão
Rainha da Sucata (1990) - Betinho Figueroa
Mandala (1987) - Vovô Petronilho ‘Pepê' Silveira
Hipertensão (1986) - Candinho
Roque Santeiro (1985) - Padre Hipólito
Pai Herói (1979) - Dr. Caio, advogado
O Casarão (1976) - João Maciel
Gabriela (1975) - Coronel Ramiro Bastos
Os Ossos do Barão (1973) - Antenor
O Bem-Amado (1973) - Odorico Paraguaçu
Bandeira 2 (1974) Tucão
O Cafona (1971) - Fred
A Próxima Atração (1970) - Borges
A Gata de Vison (1968)
A Rainha Louca (1967) - Conde Demetrius
A Morta Sem Espelho (1963)

Filmes
Romance da Empregada (1988)
Exu-Piá, Coração de Macunaíma (1987)
Trancado por Dentro (1986) - Boris
Amor Bandido (1979) - Galvão
Tudo Bem (1978) - Juarez Ramos Barata
Blablablá (1975) - curta-metragem
Salário Mínimo (1970) - Roberto
O Bravo Guerreiro (1969) - Péricles
Antes, o Verão (1968) - Sogro
Copacabana Me Engana (1968) - Alfeu
Tarzan e o Grande Rio (1967) - Professor
Terra em Transe (1967) - Julio Fuentes
Na Mira do Assassino (1967) - Promotor
Cara a Cara (1967) - Hugo Castro
A Falecida (1965) - Guimarães
De Pernas Pro Ar (1956)
Balança Mas Não Cai (1953)
Estrela da Manhã (1950)
O Dia é Nosso (1941) - Campos
24 Horas de Sonho (1941)
Anastácio (1939)
Onde Estás Felicidade? (1939)
Está Tudo Aí (1939)
Tererê Não Resolve (1938)
João Ninguém (1936)

Na TV (programas na Globo)
Agosto (1993) minissérie - Emílio
Araponga (1990) - Petrônio Paranhos
O Bem-Amado (série 1980 a 1984) - Odorico Paraguaçu
A Morte e a Morte de Quincas Berro D'Água (1978) (especial) - Quincas Berro D'Água
Sinal de Alerta (1978) Tião Borges
Balança Mas Não Cai (humorístico 1968 a 1971, na Globo, na Tupi em 1972, e volta à Globo em 1982) - Primo Rico

Rádio Nacional
Balança Mas Não Cai (1950 a 1967) - Primo Rico, também autor
O Direito de Nascer (1951) radionovela - Alberto Limonta




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;