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Domingo, 28 de Abril de 2024

Cresce número de jovens internos

Aumento, somente considerando o primeiro semestre, foi de 7% na comparação com 2016 na Fundação Casa

Yara Ferraz
do Diário do Grande ABC
22/07/2017 | 22:41
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O número de jovens infratores internos nas unidades da Fundação Casa do Grande ABC é atualmente de 391, cerca de 7,12% maior do que no ano passado. Em entrevista ao Diário, o novo diretor da instituição e Secretário da Justiça e Defesa da Cidadania do Estado, Márcio Elias Rosa, afirmou que aposta na integração com os municípios para impedir que adolescentes retornem à criminalidade. O índice de reincidência da instituição é de 19%, o que segue a média do Estado, mas pode ser maior se considerados os que completam a maioridade e ingressam no sistema prisional. Conforme estimativas não oficiais, este número pode chegar a 30%.

“A minha prioridade é estabelecer aproximação com os municípios e colocar a Fundação Casa à disponibilidade. Isso para fazer uma política que para quando o jovem saia da internação, tenha melhor emprego, qualificação profissional e acesso a serviços como o Cras (Centro de Referência de Assistência Social). E também colocar à disposição a expertise e conhecimento técnico da Fundação, que pode orientar as prefeituras e intensificar o diálogo”, afirmou Rosa, que também deve buscar a integração com demais agentes como o Tribunal de Justiça, a Defensoria Pública e a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Segundo ele, isso deve gerar reflexo direto na redução do número de internos.

Se comparado a 2006, ano em que a primeira unidade da região foi implantada em Mauá, o número de jovens dos sete municípios que deram entrada (foram registrados, mas não permaneceram por muito tempo na instituição) aumentou 77,64%. O pico ocorreu em 2014, com 1.183 entradas, número que foi reduzido a 739 no primeiro semestre deste ano (mais detalhes ao lado). Atualmente são sete unidades no Grande ABC, sendo três em São Bernardo, duas em Santo André, uma em Diadema e uma em Mauá.

“O número cresce, infelizmente, de maneira proporcional aos índices de violência, e atualmente temos a redução. Não me parece um aumento excessivo (o número de internos hoje na região), também consequência do crescimento da população jovem”, afirma Rosa, substituto de Berenice Giannella, que ficou 12 anos à frente da instituição – ela assumiu quando ainda era Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor).

Antes de a Febem virar Fundação Casa, os atendimento aos jovens infratores do Grande ABC eram realizados na Capital até 1998, quando houve o primeiro programa de descentralização. Em 2006, já como Fundação Casa, houve construção de diversas novas unidades.

A medida teve reflexos, principalmente, no número de rebeliões. Em todo o Estado, foram 80 em 2003 e apenas dois registros neste ano. Conforme dados da Fundação Casa na região, os últimos e únicos registros de rebeliões – caracterizadas pelo envolvimento de grande maioria dos internos, agressões a funcionários e danos patrimoniais – foram em 2014, com duas ocorrências nas unidades de São Bernardo. No ano passado, houve dois princípios de tumulto, um em São Bernardo e outro em Santo André, e uma ocorrência de desobediência.

Abertura de vagas não é prioridade da nova gestão

Com a meta principal de fortalecer os vínculos com os municípios, o presidente da Fundação Casa, Márcio Elias Rosa, afirmou que não deve abrir novas vagas na instituição. Segundo ele, isso não é prioridade. Atualmente, no Grande ABC, cada unidade de internação tem capacidade para atender a 64 adolescentes.

Somente a Casa Mauá tem um jovem a mais. A única unidade de semiliberdade das sete cidades, localizada em São Bernardo, pode atender 20 jovens, mas tem 24. “Não há em nenhuma unidade problema de superlotação. O que às vezes acontece é existir dois ou três adolescentes além (da capacidade), mas não há comprometimento do conforto da medida socioeducativa. Quando ocorre é esporádico e pode ser resolvido em semanas.”

Nos próximos dias, Rosa deve iniciar a visitação a todas as unidades do Estado. Ele também adiantou que deve incluir nova portaria sobre um programa de assistência religiosa nas unidades, para que todas religiões desenvolvam projetos e tenham contato com o jovem, se for da vontade dele.

Atualmente, o custo médio de manutenção de cada interno é cerca de R$ 9,200 mensais, valor arcado pelo governo do Estado. “Passamos de 88 unidades para 145, e hoje temos 12.000 equipes multidisciplinares, então, este gasto determinado não é por cabeça, é quanto custa a nossa máquina para se chegar até aqui. A tendência é que haja redução de custos se houver investimento na questão de políticas com a municipalidade.”

Ele demonstra preocupação com os impactos que a crise econômica nacional pode gerar nestes adolescentes. “Isso vai interferir diretamente nas chances de oportunidades do egresso. A estabilidade econômica causa prejuízo direto para as condições, mas acredito que o fator econômico não é determinante para a criminalidade e à violência. Não faço nenhuma associação em relação a isso, mas a crise gera desemprego, o que impacta nestas famílias”, avaliou.

Mais da metade dos jovens cometeu furto qualificado

Na região, a maioria dos jovens internos hoje (58%), cumpre medida socioeducativa por furto qualificado. Em seguida, vem o tráfico de drogas (27%) e furto simples (7%). Crimes contra a vida, como homicídio e latrocínio – roubo seguido de morte –, são cerca de 1% cada (detalhes abaixo).

Interno de 18 anos, que cumpre medida na unidade II de Santo André, faz parte da minoria. Há um ano e cinco meses ele está na internação após matar outra pessoa em uma briga, situação sobre a qual não gosta de comentar.

O cotidiano dos jovens nas unidades é preenchido com cursos profissionalizantes, oficinas de arte e de cultura e, principalmente, aulas referentes à série em que estudam. Ele, que já terminou o Ensino Médio, prestou o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e outro vestibular para cursar gestão empresarial. “Foi por um que eu não passei. Aqui, dedico-me bastante aos estudos e, especialmente, à matemática, minha área preferida”, disse ele, que havia largado a escola anteriormente.

Já para outro jovem, de 20 anos, interno por latrocínio, o Ensino Fundamental ainda faz parte do cotidiano. Em sua terceira passagem pela Fundação Casa, sendo as duas anteriores por tráfico, a história de vida dele é surpreendente. Começou a furtar aos 9 anos e mora com mais 10 pessoas em uma casa na periferia andreense. Ele cursa o 9º ano. “Ficava muito na rua, fazendo malabares e com algumas companhias. Em casa, tinha muita divergência.”

Após passar por cursos de pizzaiolo, ele afirma querer seguir no ramo alimentício e diz ter aprendido a lição. “Aqui dentro não tem inocente, mas você tem de permitir se ajudar e não criar mais ódio.”

Especialistas destacam avanços e necessidade de mais mudanças

Para especialistas, a política de descentralização da Fundação Casa foi necessária. Porém, apesar de ver com bons olhos a medida de integração com os municípios, eles ponderam que ainda há o que ser feito.

Para a promotora de Justiça da Infância e Juventude de São Bernardo, Vera Lúcia Acayaba de Toledo, as unidades das região foram cruciais para maior integração com o jovem infrator. “Permitiu a proximidade dos adolescentes com a família e também um número menor de adolescentes internos na unidade. O promotor de Justiça da comarca tem um trabalho de êxito, com visitas de fiscalização e diálogo entre as secretarias estadual e municipais. Não existe trabalho isolado, como era feito antes.”

Na cidade, a integração é feita por uma comissão desde 2012, o que vem dando resultados, já que o número de entradas (registros de adolescentes infratores) vem diminuindo. “Precisou ser feito um trabalho de articulação e mobilização do MP (Ministério Público) com essa rede, propiciando diálogo entre Fundação Casa e órgãos de atendimentos, como conselho tutelar, defensoria pública e poder judiciário, além de parceira com a Universidade Metodista. A Fundação Criança acompanha esses jovens. O adolescente é do município, então, os órgãos têm obrigação de fazer trabalho em conjunto”, defende.

“Há uma impressão que a Fundação Casa se fechou muito para a sociedade. Ela precisa estar mais aberta para projetos de entidades”, destacou a professora de Políticas Públicas da UFABC (Universidade Federal do ABC) Alessandra Teixeira.

Para o coordenador da comissão da criança e do adolescente do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), Ariel de Castro Alves, “precisam ter mais unidades de semiliberdades e femininas. Mais disponibilização de cursos profissionalizantes e programas de apoio aos egressos e familiares.”  




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