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García Márquez: Elián naufragou em terra firme americana
Do Diário do Grande ABC
19/03/2000 | 15:57
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O "verdadeiro naufrágio" do menino cubano Elián González "nao foi em alto-mar mas quando pisou na terra firme dos Estados Unidos", escreveu o Nobel de Literatura, Gabriel García Márquez, em um artigo publicado neste domingo pelo jornal mexicano Reforma.

Em um longo texto, o escritor colombiano comentou que "a raiva dos cubanos diante desta expropriaçao insólita (a retençao de Elián nos EUA) tem poucos antecedentes ainda em sua própria revoluçao".

"A mobilizaçao popular e a torrente de idéias que se gerou no país (Cuba) para exigir o regresso do menino usurpado sao espontâneas e espetaculares. Com uma novidade: a participaçao em massa da juventude e da infância".

O escritor conta a história das emoçoes do pai do menino, Juan Miguel González, que o deseja de volta a Cuba e as pressoes e obstáculos que coloca a família do menino em Miami para esse fim. Nesse contexto ressalta as idéias do poeta católico Cintio Viter: "Que idiotas (os americanos que retêm o menino)! Nos uniram (os cubanos) para sempre".

García Márquez lembrou que o tema do pátrio poder tem incidido nas tensoes entre Estados Unidos e a Revoluçao Cubana desde suas origens. "Em 1960, sob a administraçao de Eisenhower, a CIA inventou letra por letra e pôs a circular em Cuba uma falsa lei, segundo a qual os meninos cubanos seriam arrebatados pelo governo revolucionário e enviados para doutrinamento precoce na Uniao Soviética", assinalou.

Nesse contexto, e apesar dos desmentidos, "o governo de Eisenhower chegou a um acordo secreto com a igreja católica americana para que os pais cubanos pudessem enviar seus filhos aos Estados Unidos, sem pais, nem passaporte e nem bagagem".

García Márquez disse que "o êxodo desgarrador, no qual investiram os Estados Unidos 28 milhoes de dólares, se converteu numa comunidade de falsos órfaos integrados à força na cultura americana".

"Seria perverso associar o caso Elián ao fantasma de uma nova operaçao Peter Pan? Nao pude evitá-lo ao ouvir a alegaçao pública de um notável advogado dos serviços de imigraçao de Miami, José Pertierra, que chegou de Cuba aos 12 anos naquela torrente de filhos sem pais".

Petierra reconheceu que "nem a família que está nos Estados Unidos diz que este pai (de Elián) é um mau pai (...) O que dizem é que nao gostam da política de Fidel Castro". Mas no fundo acrescentou: "a muitos cubanos preocupa o fato de que o governo de Clinton nao se atreva a devolver o menino, apesar de suas leis e suas próprias convicçoes, pelo temor de que o candidato democrata, Al Gore, perca os votos da Flórida".

García Márquez afirmou que "a perda jurídica e histórica pode ser para os Estados Unidos muito mais custosa do que a eleitoral, pois andam neste domingo pelo mundo mais de 10.000 meninos americanos, tirados de seu país por um dos pais, sem a autorizaçao do outro".

O mais grave para eles, concluiu o Nobel de Literatura, "é que se os cônjuges que ficaram nos Estados Unidos quiserem recuperá-los, o precedente de Elián poderá ser usado para impedi-lo".




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