O Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e a Associaçao Beneficente e Cultural dos Metalúrgicos de Sao Bernardo do Campo e Diadema sao sócias em uma holding, desde 1997, pela qual administram seis empresas. A holding (empresa cujo capital é formado por açoes de outras empresas, que sao, assim, por ela controladas) chama-se Labor Participaçoes e tem capital social de R$ 100 mil, dividido entre a associaçao (85%) e o sindicato (15%).

As empresas da Labor (que detém 99,9% das cotas de todas as controladas) dedicam-se às áreas de: corretagem de seguros (Lacorse Corretora de Seguros S/C Ltda.), assessoria em recursos humanos (Suporhte Consultoria e Administraçao de RH S/C Ltda.), assessoria a cooperativas (Assessora S/C Ltda.), serviços gerais (Central Geral de Serviços S/C Ltda.), consultoria e venda de equipamentos de informática (Infoside Informática Ltda.) e estúdio de arte (Interarte Estúdio de Criaçao S/C Ltda.).

A direçao da Labor está a cargo de Francisco Dias Barbosa, ex-tesoureiro do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e membro de sua atual diretoria, além de presidente da Associaçao Beneficente e Cultural dos Metalúrgicos de Sao Bernardo do Campo e Diadema. O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Luiz Marinho, que representa a entidade na holding, é também diretor da associaçao.

Todas as empresas prestam serviços à associaçao e ao sindicato, além de outras entidades sindicais. O Diário teve acesso a notas de prestaçao de serviços, referentes a dezembro de 1999, da Infoside (empresa controlada pela Labor, da qual o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC é sócio) para o próprio Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, no valor de R$ 30 mil.

A Infoside emitiu notas também contra a Central Unica dos Trabalhadores Estadual, ligada à CUT nacional, presidida, à época, por Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho, candidato petista à Prefeitura de Sao Bernardo. Há ainda notas contra o deputado federal petista Jair Antonio Meneguelli, candidato à Prefeitura de Sao Caetano. O Sindicato dos Químicos também comprou serviços da Infoside.

As empresas controladas pela Labor empregam ainda ex-funcionários do próprio Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (confira quadro). Das seis empresas controladas pela holding, quatro registraram prejuízos no exercício de 1999. O total dos prejuízos do grupo de empresas do sindicato e da associaçao foi de R$ 243,3 mil no ano passado.

Inconstitucional - Juristas e constitucionalistas consultados pela Diário consideraram que essa atividade do Sindicato dos Metalúrgicos fere a Constituiçao e a Consolidaçao das Leis do Trabalho (CLT), que rege o funcionamento dos sindicatos.

"Um sindicato tem a funçao constitucional exclusiva de defender os direitos dos trabalhadores e nao o de administrar empresas, mesmo que sejam prestadoras de serviço do próprio sindicato", avaliou o jurista Yves Gandra Martins, citando o artigo 8º, inciso III, da Constituiçao Federal: "Ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questoes judiciais ou administrativas".

Na sua opiniao, os sindicatos já possuem receita prevista em lei (a contribuiçao sindical) e nao podem levantar recursos operando como empresas constituídas no regime de sociedade civil. "Associaçoes de caráter educacional ou cultural têm imunidade tributária, assim como os sindicatos. Mas as associaçoes podem buscar recursos de diversas maneiras, já que sua subsistência nao está garantida em lei, como no caso dos sindicatos", disse Gandra.

O constitucionalista Paulo Adib Casseb também entende que os sindicatos nao podem exercer atividade econômica. "Ainda que exista qualquer legislaçao infraconstitucional permitindo tal atividade, nao se pode desrespeitar a Constituiçao. O dinheiro arrecadado junto aos trabalhadores deve ser usado em atos ou na defesa da própria categoria, e nao no investimento em empresas", analisa Casseb, embasando-se no artigo 513 da Consolidaçao das Leis do Trabalho (CLT): "Sao prerrogativas dos sindicatos: a) representar, perante as autoridades administrativas e judiciárias, os interesses gerais da respectiva categoria ou profissao liberal ou os interesses individuais relativos à atividade ou profissao exercida (...)". Casseb baseia-se ainda no artigo 564 da própria CLT para condenar essa atividade do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC: "As entidades sindicais, sendo-lhes peculiar e essencial a atribuiçao representativa e coordenadora das correspondentes categorias ou profissoes, é vedado, direta ou indiretamente, o exercício de atividade econômica (CLT, Título V, Capítulo I, Seçao IX, Artigo 564). Por isso, segundo Casseb, cabe representaçao no Ministério Público contra o Sindicato dos Metalúrgicos .

Para Luiz Marinho, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, "deve-se criar a condiçao para mudar a realidade dos sindicatos, pois a legislaçao é uma estrutura ultrapassada, atrasada". "Nós temos que forçar a mudança. Eu nao sei o porquê da estranheza, na medida em que o sindicato tem liberdade para fazer investimentos do seu dinheiro".